Há dois anos, um passeio para o Litoral catarinense mexeu com a imaginação do casal Luiz Alberto Correia Teixeira e Valnita Silveira Teixeira, moradores do Bairro Ramiz Galvão, em Rio Pardo. Seu Nenê e dona Nita – como são conhecidos – perceberam que espalhar otimismo faz um bem danado para o corpo e a alma.
Eles copiaram o formato das placas com mensagens, comuns na área litorânea de Santa Catarina, e deram início a uma avalanche de positividade no reduto ferroviário da Cidade Histórica. A iniciativa cresceu tanto que eles já estão produzindo para outras cidades, ocupando as tardes livres com criatividade. Do berço dos ferroviários rio-pardenses, Nita e Nenê ensinam que não é preciso muito para ser feliz e deixar a vida de seus semelhantes um pouco melhor.
A história das placas com mensagens positivas, produzidas pelo casal Luiz Alberto Correia Teixeira e Valnita Silveira Teixeira, começou dois anos atrás, após uma temporada de verão em 2018, na praia de Garopaba, em Santa Catarina. Foi nas areias catarinenses que Nita e Nenê tivera uma ideia: reproduzir as mensagens no Bairro Ramiz Galvão, em Rio Pardo.
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Restos de madeira, tampinhas de garrafas, pregos, uma porção de tintas e pincéis e um restinho de verniz são suficientes para dar materialidade às ideias do casal. “Todo o bairro já tem placas colocadas. Acredito que já tenhamos feito umas 150 nesses últimos dois anos”, afirma Nenê.
O ateliê funciona no espaço que abrigou um bazar, administrado por dona Nita, há algum tempo. Em dupla, e entre um chimarrão e outro, eles produzem até quatro placas por turno. As placas em formato de seta apontam para sentidos diferentes e fazem com que se reflita sobre o que está escrito.
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Dona Nita revela que lê muito, ouve boa música e pesquisa frases e pensamentos famosos, que possam gerar fragmentos para os escritos do casal. “A ideia é sempre passar uma mensagem positiva, fazer com que a pessoa que lê reflita sobre o escrito”, diz ela.
Esposa e marido, casados há 52 anos, fazem do lazer uma oportunidade de estar sempre perto um do outro. “Às vezes dá ranço, né? Sabe que não é fácil”, brinca Nita, após soltar uma gargalhada. “É um privilégio de poucos ficar tanto tempo junto de alguém, amando e se dando tão bem”, remenda seu Nenê.
Com o ateliê cheio de placas, algumas prontas, outras em andamento, os dois se orgulham do trabalho. Planejam ampliar, inclusive a produção, após uma nova temporada no litoral. “Agora estamos concluindo algumas placas que ainda faltavam. Vamos retomar a produção depois de janeiro, pois vamos para praia um pouquinho de novo”, antecipa seu Nenê. Diz ele que o motivo da viagem é procurar inspiração para novas placas.
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O casal confecciona as placas sem cobrar. Espalha as mensagens no bairro sem receber nenhum centavo pelo feito. Quem aprecia a ideia pede e ganha uma placa, sem precisar pagar por ela. “A gente faz tudo de graça, entendemos que tem que ser assim”, reforça Luiz Alberto.
Para fazer o trabalho, seu Nenê recebe doações de madeira do mercadinho do bairro. As caixas que transportam frutas e verduras transformam-se nas setas que apontam na direção do otimismo. As tintas são compradas e recebidas em doação, assim como os pincéis. “Tampinhas de garrafas, também utilizadas, a gente junta com as crianças”, disse dona Nita.
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Quem quiser doar alguns desses produtos, tiver madeira que pode ser reutilizada, tinta ou simplesmente a vontade de aprender, pode procurar o casal de Ramiz Galvão. “É muito fácil, para nós é quase como uma terapia diária”, afirma o marido.
Não há um só canto de área pública do bairro dos antigos ferroviários de Rio Pardo que não tenha uma placa ou indicação da atividade de dona Nita e seu Nenê. As mensagens – mais de 150 – estão em canteiros, árvores, praças e passeios públicos. Já na entrada da via principal, é possível ler: “Sou de Ramiz e sou feliz, de alma e coração”.
Nenê confessa que o plano era mesmo deixar o bairro mais aconchegante, acarinhando os moradores com as mensagens de otimismo. “A gente é tão bairrista que quando sai de Ramiz para o Centro, diz que vai para Rio Pardo, como se aqui fosse uma outra cidade. Na verdade, é quase isso”, admite.
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Na tarefa de espalhar as placas pelo bairro, Nita conta com a ajuda dos netos. As crianças ajudam a escolher o local que irá receber a nova peça. “Já colocamos por todos os cantos. Agora, estamos produzindo até para outras cidades”, declarou Nenê, que também é um aficionado por história.
Há placas em Santa Cruz do Sul, Vera Cruz, Uruguai e Inglaterra – lugares que amigos do casal foram conhecer, levando a produção de Ramiz Galvão a patamares internacionais. Falta agora um convite da Prefeitura para que Nita e Nenê façam peças para decorar praças, prédios históricos, ou até mesmo os balneários de Rio Pardo. “Seria interessante colocar algumas nos nossos balneários, não seria uma má ideia”, avalia Luiz Alberto.
Quem viveu em Ramiz Galvão no início do século 20 conviveu com um núcleo de mais de mil ferroviários trabalhando em trens, que chegavam e partiam a todo instante. O aposentado Valmir da Cunha Lopes, filho de um operador de telégrafo da estação de Ramiz, guarda na memória as histórias contadas pelo pai e lembra de uma outra fase – os anos 1950 –, quando ele era criança e o movimento de locomotivas em Rio Pardo começou a minguar.
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Hoje, a estação abandonada não lembra em nada os anos de 1930, quando os ramais ferviam com o vaivém de trens. A parada em Rio Pardo era estratégica, como uma conexão de voos de longa duração. Os trens que saíam de Porto Alegre com destino a Santa Maria se reabasteciam, tripulações – fardadas com gravata e tudo – faziam suas trocas de turno e todos os suprimentos usados nos serviços de bordo eram reabastecidos em Ramiz Galvão. “Até os anos de 1950, esse era um dos pontos mais importantes de Rio Pardo e da região, pois a ferrovia transportava cargas e passageiros, era o meio de transporte mais usado”, conta Lopes.
Do tempo de criança, o aposentado lembra de situações pitorescas que envolvem o trem e a estação. Lopes conta que, na época, os doentes mentais que eram levados de outros municípios para o Hospício São Pedro, em Porto Alegre, vinham todos em um único vagão, no fim da máquina. “A gente tinha medo, pois eles gritavam o tempo todo.”
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Quando era início de mês, tinha festa para receber o trem pagador. Isso mesmo: o salário dos ferroviários vinha em uma linha específica, recebida com festa pelos trabalhadores. “A gente também podia ganhar um dinheirinho, ajudando as pessoas a carregar mala. Uma vez eu estava chateado com meu pai, que não quis me dar dinheiro para a matinê, e fui ajudar uma vovó com sua mala. Mas, depois de carregar por uma longa distância, ela me disse que não tinha gorjeta. Foi a primeira e última vez que eu fiz isso”, conta, em meio ao riso.
Talvez por isso tudo, os moradores de Ramiz Galvão sintam-se residindo em um território à parte de Rio Pardo. E talvez explique o tanto de orgulho que eles sentem em preservar o passado glorioso da ferrovia. Pouco antes das eleições municipais, em 15 de novembro, um vagão de trem foi posicionado no trevo de acesso ao bairro. “Dá até uma tristeza em ver tudo parado, em pensar que no passado isso aqui era supermovimentado. É muito importante guardarmos as memórias do nosso Ramiz Galvão”, complementou o aposentado.
O ilustre barão
A área que deu origem ao bairro chama-se Couto, por causa do arroio que banha parte da região. O nome Ramiz Galvão foi dado em homenagem ao ilustre rio-pardense Benjamin Franklin de Ramiz Galvão, que foi médico, professor e primeiro reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nascido em 16 de junho de 1846, nas proximidades do Arroio do Couto, em Rio Pardo, Ramiz Galvão foi homenageado após sua morte, em 1938, com o nome do bairro onde nasceu. Ele foi o primeiro e único barão de Ramiz.
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