Completou-se na última sexta-feira, 27, uma década do incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria. E parentes e amigos das vítimas continuam à espera de punição para aqueles que, por ação ou omissão, têm responsabilidade pela morte de 242 pessoas. Os fatos de 27 de janeiro de 2013 resultaram em condenações por homicídio com dolo eventual, ao fim de um longo julgamento em dezembro de 2021. Mas o júri foi anulado após o Tribunal de Justiça do Estado aceitar argumentos da defesa.
Quatro anos depois, também ninguém está preso pelo desastre de Brumadinho, em Minas Gerais. No dia 25 de janeiro de 2019, uma barragem da mineradora Vale rompeu-se e causou a morte de 270 pessoas. Outra vez, o processo de responsabilização dos culpados se arrasta. Pois culpados há: quando medidas de segurança para evitar o pior podem ser tomadas e não são, não existe “fatalidade”.
Em Santa Maria, a queima da espuma usada como revestimento acústico na boate liberou substâncias como cianeto – o mesmo gás letal empregado pelos nazistas para o extermínio de prisioneiros nos campos de concentração. Uma coincidência significativa, pois no dia 27 de janeiro é celebrado o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. A data definida pela ONU faz referência à liberação, pelas tropas soviéticas, do campo de Auschwitz em 1945. Milhões de pessoas morreram nas “fábricas de cadáveres” (expressão usada pela filósofa alemã Hannah Arendt) do III Reich, a grande maioria judeus.
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Difícil entender como milhares de pessoas incentivaram e participaram de tamanho esforço destruidor. Ou, na melhor das hipóteses, omitiram-se. Quando militares norte-americanos entraram no campo de Buchenwald, perto de Weimar (Alemanha), conta-se que soldados levaram moradores para ver com os próprios olhos o que acontecia na vizinhança. O escritor Thomas Mann resgatou tal episódio no romance Doutor Fausto.
Pois os pacatos cidadãos foram cúmplices. Ignoraram as evidências durante anos, mesmo que – nas palavras de Mann – “o vento vindo de lá lhes assoprasse nas narinas” o cheiro dos fornos crematórios. É necessário lembrar, pois a disposição mortífera para desencadear genocídios renasce de tempos em tempos (Ruanda e os Bálcãs que o digam). E sempre haverá quem esteja disposto a ignorar evidências ou enxergar “fatalidades”.
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