As sonoras batidas na mesa chamavam a atenção de qualquer um que passasse próximo à esquina do famoso Salão Kappel e Silva, em Linha Nova, interior de Santa Cruz do Sul. Era tarde do último domingo, com forte calor, e o Schafkopf, tradicional jogo de cartas alemão, era disputado de forma animada por senhores acomodados em mesas dispostas rente às grossas paredes de pedra do lugar. As batidas, aliás, davam o tom do jogo: geralmente desferidas na hora de descartar uma carta ruim, elas indicam que o apostador recebeu, antes, uma carta boa. O nome Schafkopf – em alemão, cabeça de ovelha – é uma alusão ao impacto da cabeçada desferida pelos ovinos, quando arredios.
Dentro do salão o jogo era outro, mas a animação era semelhante. Dezenas de senhoras jogavam loto. Em alto e bom som, a locutora anunciava os números sorteados em português e alemão – embora, aparentemente, a maioria ali conhecesse os dois idiomas. As recompensas para os vencedores das rodadas eram sacos de carvão, produtos de higiene, bebidas e comidas diversas. O importante ali não era a premiação, mas sim o cultivo da tradição em família.
“Isso é uma das coisas boas do interior. Reunir as famílias em um local onde todos possam se divertir juntos. Hoje as pessoas ficam ligadas à internet nos celulares e esquecem de conviver entre elas. Que bom que podemos manter isso vivo por aqui”, ressaltou o proprietário do salão, Eugênio da Silva. De fato, não havia uma pessoa, em ambos os ambientes, que estivesse mexendo no celular. Nem ao menos uma televisão ligada havia no local, apenas o tradicional – e cada vez mais raro – bate-papo em meio ao divertimento.
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Reforma para manter um legado centenário
Eugênio e a esposa Lenir da Silva estão reformando o Salão Kappel e Silva, que completa 127 anos em 2020. Querem manter todas as referências da arquitetura da construção, datada de 1893. “Esse salão é um legado de família da minha mãe e pai. Gostamos de pensar que é uma parte deles que ficou para nós. Desejamos cultivar o máximo a estrutura original, mantendo a tradição de uma obra que remete a um período da nossa imigração, quando a nossa comunidade começava a ser colonizada”, afirma Lenir.
A alvenaria, que sofreu com o demasiado tempo de mais de um século, recebeu um tratamento peculiar. “Mesmo sendo mais caro, procurei utilizar as pedras que eram mais semelhantes às da construção original nos espaços onde foi necessário”, revela Eugênio. Dentre as modificações confirmadas, uma das portas de madeira da entrada dará lugar a uma saída de emergência, para cumprir exigência do Corpo de Bombeiros. “Mesmo tirando essa porta, a fechadura eu vou guardar. É uma relíquia, não se acha mais desse tipo”, complementa o proprietário.
Aparelhos de ar-condicionado também estão confirmados para o salão. A reinauguração já está marcada para o dia 12 de janeiro, em evento que começa às 11h30. Um almoço ao meio-dia e sorteio de prêmios irão anteceder os shows de quatro bandas (Os Amigos, Tropical, Estrela de Ouro e Magia). “Também oferecemos R$ 50,00 para ajuda de custos de vans lotadas”, convida Eugênio.
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