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Em dezembro, todo cuidado é pouco

Esta época do ano não agrada a todo mundo. Tem gente que fica mais sensível, mais emotiva. Há quem recorde aqueles que já se foram, quem sinta falta de pessoas que estão longe, quem se deprima pelo próprio desempenho. Há também os que se incomodam com o tumulto das compras e festas, com a correria. Perder as chaves, bater o para-choque, torcer o pé, esquecer o presente da sogra… São as banalidades de um cotidiano alterado pelo consumo. Às vezes, a coisa sai do controle.

Era dezembro, logo depois da pandemia. Ligo o carro e o painel alerta que estou quase sem gasolina. Com pressa, paro no posto e falo o de sempre: “200 reais de aditivada no cartão”. Enquanto espero, confiro o celular. Mal começo a ouvir um áudio do Romar e a frentista me entrega o papelzinho para eu levar no caixa. “Que rapidez! Devem ter comprado bombas ultramodernas”, penso, encantada com as tecnologias enquanto ligo o veículo e rumo para a loja de conveniência.

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Satisfeita com a agilidade do serviço na manhã ensolarada, termino a mensagem – longa – do Romar. E só neste momento, ainda com o pé no acelerador, escuto uma gritaria. Olho pelo retrovisor e vejo a jovem que corre na minha direção aos berros, sacudindo os braços. Atrás dela, fazendo som de lata prensada, vem de arrasto a bomba de gasolina.

Percebo, na hora, que aquela grande caixa metálica rangendo no piso de concreto é obra minha. Eu havia saído com a mangueira ainda no bocal do tanque. E, ao movimentar o carro, arranquei a bomba. Que agora jaz, deitada, no meio do pátio.

Entro em quase-pânico. Ligo para o Maurício, trêmula, subitamente transformada em uma senhorinha frágil pedindo socorro ao homem da casa: “Aconteceu uma coisa horrível. Acho que o posto vai explodir e a culpa é minha”.

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A cena é bizarra. Desconfio que todos me olham. Peço desculpas várias vezes. Quero me explicar. Um rapaz que parece ser o chefe tenta me acalmar: “Não tem problema, senhora. Está tudo bem”. Maurício chega e também racionaliza: “O dispositivo deve ter mecanismo de segurança. Não há risco, fica tranquila”.

Eu, nesse ponto do fiasco, sou só vergonha. Quero desaparecer. Pago constrangida e, ao ir embora, vejo o pessoal tentando reencaixar a bomba no seu lugar de direito. Olham de um lado, mexem. Olham de outro, mexem de novo. Parece meio torta.

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Fiquei meses sem voltar ao local. Pior, fiquei meses sem abastecer sozinha. E só consigo contar essa história agora, tanto tempo depois, porque ela ficou no passado e virou piada. Mesmo assim, continua inesquecível. É por isso que, desde então, passo os dezembros pisando em ovos. Afinal, todo cuidado é pouco.

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Bruno da Silveira Bica

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Bruno da Silveira Bica

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