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Eles deixaram o Brasil para fundar Nova York

A cidade de Nova York, no litoral atlântico dos Estados Unidos, é uma das cidades mais conhecidas e que mais atrai visitantes no planeta. Espraiada ao longo do Rio Hudson, encanta os olhos do viajante com seus icônicos arranha-céus, além de merecer a alcunha de Big Apple, a Grande Maçã. E dizer que em sua população atual, de quase 10 milhões de habitantes, há de estar algum descendente de um grupo de colonizadores, os pioneiros, que certamente sentiram muita saudade do… Brasil? Mais exatamente de Recife, a atual capital de Pernambuco.

O que à primeira leitura pode soar lenda ou ficção, na prática é fato histórico. Que acaba de ser recuperado e fixado por um escritor e historiador da melhor cepa, o cearense João de Lira Cavalcante Neto, ou Lira Neto, 57 anos, para os familiarizados com alguns dos maiores best-sellers do mercado editorial brasileiro dos últimos anos.

Lira foi o patrono da 28ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, em 2015. Depois de se dedicar a biografar o ex-presidente Getúlio Vargas, numa trilogia, e de se ocupar do escritor José de Alencar, do líder religioso Padre Cícero e do também ex-presidente Castello Branco; e ainda de ter se dedicado a iniciar uma pesquisa intensa sobre o samba enquanto gênero musical, Lira Neto passou os últimos anos ocupado em investigar essa “colonização” de Nova York por um grupo de cidadãos que deixou o Nordeste do Brasil.

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Tudo se deu, como revela no livro Arrancados da terra, que acaba de ser lançado pela Companhia das Letras, em setembro de 1654. O que hoje é a fulgurante Nova York naquela época era um descampado em que viviam tribos dos índios Ienapes. Como a região era muito propícia à caça e à pesca, com destaque para a ostra, era um lugar em que navegadores europeus começaram a aportar desde 1524 para comerciar com os indígenas. Tanto esse negócio estava indo bem que motivou um assentamento e uma colônia holandesa, chamada de Nova Amsterdã.

Enquanto isso, muito mais ao sul da costa americana, uma ou tra cidade litorânea vivia dias de inquietação. Em Recife, fundada ainda em 1537, famílias de descendentes de judeus sefarditas, oriundos da Península Ibérica, a área formada por Espanha e Portugal (Sefarad é o termo hebraico que denomina essa região), eram perseguidas pela Inquisição, com a retomada dessa cidade pelos portugueses, vitoriosos no embate com os holandeses. Os judeus sefarditas haviam sido desalojados da Península Ibérica também pela Inquisição, fixaram-se na Holanda e de lá puderam migrar para a colônia holandesa no Recife. Agora, novamente sob governo português, precisavam encontrar um outro rumo.

E este surgiu em 1654, quando partiram, no atropelo, em 16 naus em direção ao Norte, ainda sem saber onde poderiam vir a se fixar. Uma das naus foi saqueada na Jamaica, e 23 judeus foram parar na ilha de Manhattan, onde, por fim, se estabeleceram, uma vez que havia ali um posto da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.

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Mesmo sem o saber, tornaram-se os primeiros colonizadores efetivos a se fixar naquela que é hoje Nova York, assim batizada dez anos depois de sua chegada – mas já pelos ingleses, que a tomaram dos holandeses e desde então agilizaram sua ocupação em maior escala. São as peripécias desse grupo de famílias de judeus, no contexto histórico da Europa, do Brasil e da América do Norte, que Lira resgata, apoiado, como é de seu feitio, em exaustiva pesquisa bibliográfica sobre documentos de época.

FICHA
ARRANCADOS DA TERRA:
perseguidos pela Inquisição na Península Ibérica, refugiaram-se na Holanda, ocuparam o Brasil e fizeram Nova York, de Lira Neto. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. 424 p. R$ 84,90.

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