Ainda em referência ao Dia Internacional da Mulher, porque março não terminou.
Nos tempos da Inquisição, mulheres suspeitas de “bruxaria” eram obrigadas a baixar os olhos diante dos interrogadores. Estes temiam, talvez, a transmissão de algum feitiço satânico dessa forma. O Malleus Maleficarum, manual dos caçadores de bruxas publicado em 1486 (já na Idade Moderna, e não na Idade Média, como se poderia pensar), alertava severamente para os perigos do olhar feminino. (E o filme espanhol Silenciadas, da Netflix, é um interessante registro acerca desse período.)
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Erguer os olhos para observar com atenção é uma qualidade essencial no jornalismo. “Esse olhar que olha para ver, que se recusa a ser enganado pela banalidade e que desconfia do óbvio, é o primeiro instrumento de trabalho do repórter”, diz Eliane Brum no livro A vida que ninguém vê. E, se estivermos realmente decididos a enxergar, não sabemos de antemão o que vai aparecer.
Eliane e tantas outras jornalistas são mulheres que se recusaram a baixar os olhos; com isso, ajudaram a ampliar nossa visão. Como a norte-americana Joan Didion (1934-2021), uma das expoentes do New Journalism e autora de Rastejando até Belém, ensaio que revelou o lado obscuro da contracultura hippie em 1967. Enquanto os porta-vozes falavam em paz e amor, Joan viu crianças de 5 anos consumindo LSD e jovens erráticos, facilmente influenciáveis por líderes manipuladores. Dois anos após a publicação – que foi alvo de críticas –, os crimes bárbaros da Família Manson mostraram que o artigo fazia algum sentido.
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Jornalistas como a bielorrussa Svetlana Aleksiévitch, Nobel de Literatura em 2015 e autora de Vozes de Tchernóbil, livro que resgata a memória do pior acidente nuclear da história: o da usina de Tchernóbil (ou Chernobyl), na Ucrânia, em 1986.
Ou a brasileira Daniela Arbex, que já nos trouxe verdades perturbadoras sobre um hospital psiquiátrico em Minas Gerais; desaparecidos no regime militar; e, mais recentemente, a respeito da tragédia evitável de Brumadinho.
Elas são as que erguem o olhar para aquilo que outros preferem evitar. Felizmente. São mulheres jornalistas.
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