“Passados dez anos, chegou a hora da justiça”, disse o promotor Gustavo Burgos de Oliveira logo no início de sua fala, em sessão no Fórum de Santa Cruz do Sul. O Salão do Júri Gérson Luiz Petry estava lotado para acompanhar o julgamento de Delce Nepomuceno Berté, de 47 anos, que foi condenada a 22 anos de prisão por ser a mandante do assassinato do seu marido Elder Marison Berté, em 2014, na localidade de Linha Palmeira, interior de Gramado Xavier.
A juíza Márcia Inês Doebber Wrasse, que presidiu o julgamento iniciado às 13h15, determinou a execução imediata da pena. Por isso, tão logo a sessão foi encerrada, às 19h45, Delce foi conduzida por policiais ao Presídio Estadual Feminino de Rio Pardo. O promotor Gustavo teve como assistente de acusação o advogado Ademar Antunes da Costa, em seu último júri na carreira.
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A defesa da ré foi feita pelos advogados José Roni Quilião de Assumpção e Gilberto Bernardes Klein. O caso, analisado por um corpo de jurados formado por sete homens, aconteceu há mais de uma década, em 10 de abril de 2014, às 21h30. Elder Marison Berté, na época com 41 anos, foi assassinado a tiros de espingarda nas proximidades de uma residência. Ele chegou a ser encaminhado para atendimento médico, mas não resistiu à gravidade dos ferimentos e acabou falecendo.
Conforme a denúncia do Ministério Público, o homicídio teria sido executado por um homem a mando da ex-companheira de Elder, Delce Nepomuceno Berté. Ainda de acordo com a Promotoria, o crime foi cometido porque ela queria se apropriar das terras pertencentes a Elder. Além disso, teria a intenção de receber o benefício previdenciário dele. Em seu depoimento, a mulher alegou que ficou 20 anos com o marido, entre separações e retornos, e que teve depressão após a morte dele.
Delce negou qualquer envolvimento no assassinato. Disse ainda que Elder tinha problemas com o alcoolismo e chegou a ser internado em clínicas de reabilitação. Sobre o dia dos fatos, afirmou que seu marido tomou chimarrão com ela por volta das 16 horas e depois saiu para averiguar a suspeita de que o tabaco colhido pela família teria sido furtado.
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Em seguida, segundo Delce, Elder não teria retornado. Mais tarde, ela recebeu a informação de que o marido havia falecido. Mencionou ainda algumas possíveis desavenças que Elder teria com algumas pessoas da localidade, apontando esses fatos como possibilidades para o assassinato.
Disse ainda que não tinha nenhum relacionamento extraconjugal e que não havia, da parte dela, o menor interesse em eventuais terras que pertenciam ao marido.
Depoimentos dos filhos da vítima e da ré chamaram a atenção
Dois dos momentos mais marcantes do júri foram os depoimentos da filha e do filho de Elder e Delce. O promotor Gustavo Burgos mostrou no telão as declarações de ambos na época da fase de instrução do processo. O adolescente afirmou que quando chegou em casa no dia do crime, diferentemente do normal, sua mãe lhe pediu para que dormisse na casa da namorada – algo que, segundo o jovem, a mulher não incentivava.
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Já a menina, ainda criança, contou que na noite do assassinato sua mãe pediu para ela dormir mais cedo do que o normal. E quando acordou, ainda na noite, a mulher não estava em casa. “Eu a procurei e não a encontrei. Chamei, mas ela não estava. E aí eu comecei a chorar”, disse a menor de idade. Presente no plenário, a filha de Elder, hoje adolescente, emocionou-se ao ouvir seu depoimento no telão.
Burgos revelou que Delce move um processo contra a filha na Justiça Federal, para ter parte da pensão pela morte do pai que a adolescente recebe. Também contou sobre um relacionamento de 2015 da acusada com um homem em São Leopoldo, em que ela teria feito um contrato de união estável com ele. Para sair da casa após uma briga com a filha desse companheiro, queria cobrar R$ 8 mil.
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“Ela colheu o que ela plantou”, dispara Costa
Gustavo Burgos apresentou o relatório de ligações entre Delce e a vítima e citou, em sua fala, detalhes sobre a conduta social da ré, revelando o depoimento de testemunhas como uma conselheira tutelar que era colega da mulher. Ela disse que Delce era “ignorante, sem escrúpulos e possessiva”. O representante do MP ainda mostrou os depoimentos de homens com quem a acusada teria tido relações extraconjugais.
“Ela possuía uma vida desregrada em relação a namorados e amantes”, disparou o promotor. “Ficou bem comprovado a autoria desse crime tendo a ré como a mandante, por uma série de provas, mas sobretudo pela própria vítima, que falou momentos antes de morrer”, enfatizou Burgos, relembrando os depoimentos de testemunhas que afirmaram que Elder, em seus últimos suspiros, disse que a mulher havia lhe pedido para ir na casa dela e “armado uma cilada”.
“A ré inventa até hoje muitas e muitas histórias para se isentar do caso. Inventa inimigos que o Elder não tinha e que foram desmentidos no processo. Mente, mente e mente”, salientou o promotor. Muito emocionado em seu último júri, Ademar Antunes da Costa aproveitou sua parte do tempo em plenário para agradecer às pessoas que participaram de sua carreira e estavam ali acompanhando a sessão.
Ao falar do caso, como é de costume, não fez rodeios. Disse ter certeza de que a mulher foi a mandante, e que o disparo efetuado pela espingarda do autor, com munição de balins, fez a vítima sofrer de uma forma ainda mais grave, em 12 pontos do corpo com um único disparo. “A Delce tinha seis pessoas que visitavam a casa dela, mantendo relações sexuais. E o coitado do Elder, se recuperando do alcoolismo, foi atraído para uma ‘tocaia’ que armaram pra ele”, disse.
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“Foi matar por causa de um pedaço de terra e da pensão de um salário mínimo, algo inadmissível. Não existe crime perfeito, e é como diz o filósofo Cícero: tu colhe o que tu planta, e ela colheu o que ela plantou.” Os argumentos da defesa, de que a ré era inocente, não convenceram os jurados, que condenaram Delce com rigor.
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