O primeiro grande compromisso de Eduardo Leite (PSDB) já tem data: final de janeiro, quando a Assembleia Legislativa retomará a discussão sobre o pacote de ajuste fiscal apresentado pelo governo.
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A data, aliás, é indicativo de uma derrota amargada por Leite ao final do primeiro ano de sua gestão. A expectativa no Palácio Piratini era encerrar o ano com todos os projetos do pacote votados, repetindo o êxito obtido em maio, quando a ampla maioria governista (nada menos que 40 dos 55 deputados estaduais) aprovou a proposta de emenda à Constituição (PEC) que acabou com a exigência de plebiscito para privatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Rio-grandense de Mineração (CRM) e Companhia de Gás do Rio Grande do Sul (Sulgás).
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Os planos, porém, não se confirmaram. Leite conseguiu aprovar em dezembro a alteração das alíquotas previdenciárias dos servidores, mas os seis outros projetos – incluindo o que modifica as carreiras do magistério, que é o mais polêmico e deflagrou a primeira greve enfrentada pela atual gestão – ficaram para o ano que vem. E, apesar da maioria consolidada, há dúvidas se o governador não terá de fazer mais concessões para colher novas vitórias.
As votações são fundamentais porque o governo depende dessas medidas para conseguir fechar o acordo de recuperação fiscal com a União – que garantiria uma carência de até seis anos no pagamento da dívida e a possibilidade de contratar novos financiamentos. Além disso, Leite é cobrado quanto à promessa (já descumprida) de terminar o primeiro ano com os salários do funcionalismo em dia. O fracasso na tentativa de vender ações do Banrisul foi determinante para isso.
Reequilíbrio financeiro
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As negociações com a base aliada na Assembleia e, sobretudo, com entidades que representam os servidores vão ocupar as atenções do governador na entrada de 2020. No entanto, a conclusão da votação do pacote – que pode contar com alguma derrota para o governo – não encerra a missão de Eduardo Leite.
Conforme a socióloga, cientista política e diretora do Instituto de Pesquisas de Opinião(IPO), Elis Radmann, após a batalha da Assembleia, o governador ainda terá de levar a cabo a venda das estatais para conseguir ratificar o acordo com a União – honrando a promessa de preservar o Banrisul, apesar das pressões da equipe econômica do governo Bolsonaro. Na prática, isso significa que a agenda do próximo ano será novamente consumida pela pauta do reequilíbrio financeiro. “O governador tende a gastar o ano de 2020 ‘arrumando a casa’ para conseguir equilibrar o caixa e tentar cumprir a sua principal promessa de campanha: colocar os salários em dia e ter orçamento para cuidar de áreas prioritárias como saúde, segurança, educação e estradas”, observa a analista.
Em paralelo à dificuldade para tirar o Estado do atoleiro, Leite precisa lidar com a baixa aprovação de sua gestão até o momento. Para Elis, essa percepção negativa em relação ao governo é explicada por três fatores: o entendimento de que Leite foi demagógico na campanha ao prometer algo que dificilmente conseguiria cumprir, a insatisfação com a vocação privatista do governo (pela parcela da população que não concorda com a venda de estatais, em especial do Banrisul) e o descontentamento geral com a falta de investimentos por parte dos governos estaduais. “É resultado das mazelas concretas da sociedade, que tem demandas de saúde não resolvidas, falta de medicamentos, problemas com a falta de professores, com as greves, com infraestrutura das escolas, com as estradas inconclusas ou que não saíram do papel e com a frequente demanda por mais policias nas ruas”, explica.
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Contra a maré
De acordo com o cientista político e professor de Relações Internacionais e Jornalismo da Unisinos, Bruno Lima Rocha, as medidas defendidas por Leite são impopulares, o que torna “quase impossível” um apoio das maiorias. Segundo ele, a baixa aprovação do governo é definida não apenas pelo confronto aberto com o funcionalismo, mas principalmente pela agenda antipopular, a ausência até o momento de uma política clara de estimulo à atividade econômica e o que considera uma “subordinação” aos termos impostos pelo governo federal para fechar o acordo de recuperação fiscal.
Apesar de ser um político muito jovem e visto até como potencial candidato à Presidência da República no futuro, Leite corre o risco, conforme o analista, de “incinerar o próprio capital político”. “José Ivo Sartori tinha uma agenda antipopular e em parte conseguiu algum apoio na relação com os municípios pequenos e médios. Como Eduardo Leite vai conseguir, se conseguir, realmente não sei como fará”, disse. Para o analista, a tendência é que o governo aposte em ações de marketing institucional para tentar convencer a população do acerto de suas medidas.
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O avanço real na equalização das contas também é essencial para reverter a maré de rejeição. A dúvida é se haverá tempo para isso. “2020 vai ser emblemático para o governo, tanto do ponto de vista político quanto administrativo”, conclui Elis Radmann.