Sou contra o ranço. Aquela atitude negativista, que sempre enxerga (e somente isso) o lado ruim das coisas. Mas quando se lê, ouve ou vê noticiários, fica flagrante que os horizontes não são os mesmos para todos. Há méritos inegáveis nos setores público e privado que nos remetem ao futuro. Criam-se novos ambientes para empreender, suporte para desenvolver modelos inovadores de negócios, para desafiar a criatividade e a ousadia.

São elogiáveis sob todos os aspectos os espaços abertos para dar abrigo e incentivo a quem ousa pisar no futuro. Os resultados são inimagináveis. Com certeza nos transformarão: como cidadãos, como organizações, como coletividade. Mas a mesma sociedade que surfa nas ondas do mundo digital, que fala uma linguagem que muitos de nós nem sequer entendemos, está deixando para trás – não por culpa de quem inova, mas de quem deveria prover assistência mínima a todos os cidadãos – uma parcela significativa da população que não tem sequer estrada para se locomover ou rua que não emporcalhe os pés dos moradores para sair de casa.

É verdade que tivemos dias sucessivos de chuva que impediram o trabalho das máquinas. Mas não foi diferente no verão, no auge da estiagem. Buracos, pedras soltas, estradas esgotadas, sobretudo as sob administração de órgãos do Estado, que vez e outra são raspadas pela lâmina de uma velha patrola, mas que há década ou mais não recebem uma reparação com material adequado, uma abertura de vala lateral para escoar a água. Enfim, procedimentos primários que deveriam ser retribuídos ao cidadão que é vocacionado a produzir e que resiste à revelia de todas as dificuldades.

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Por estas estradas sucateadas, enlameadas e sorrateiras, que oferecem armadilhas – e prejuízos – para toda diversidade de bolsos e contas bancárias, trafegam carretas, tratores e maquinários cada vez mais sofisticados, ônibus, ambulâncias e cidadãos que só querem exercer o direito de ir e vir. Para ir à cidade, fazer um negócio, resolver um problema (talvez de saúde) ou simplesmente para dar um passeio.
Infelizmente, a negligência sonega ao cidadão esse direito fundamental. Muitas propriedades no interior hoje têm acesso à internet, fibra ótica, são monitoradas por câmeras e alarme. Mas não dispõem de estrada para sair ou chegar até elas.

Como se ousa falar de incentivo à permanência e investimento no campo, em turismo rural, em reversão da cada vez mais iminente falta de sucessão familiar e, consequentemente, abandono das propriedades rurais, se não se oferece sequer condições mínimas de acessibilidade? Vamos convir que Santa Cruz do Sul está quilômetros luz à frente da média dos municípios. Ligações asfálticas a Monte Alverne, Boa Vista, Rio Pardinho, Pinheiral, Cerro Alegre e alguns trechos delimitados no interior nos elevam a uma condição até privilegiada. O Daer deveria ver o que já se fez aqui e se envergonhar do que oferece aos cidadãos, por exemplo, no interior de Candelária, Rio Pardo e adjacências.

Sob a lama de estradas centenárias, negligenciadas por sucessivos governos ao longo de décadas, ficaram soterrados sonhos, projetos de expansão ou, até mesmo, de manutenção de propriedades.
Mas há alento. Enquanto rascunhava este texto, surgia a informação de um ousado financiamento no valor de R$ 200 milhões da Prefeitura de Santa Cruz junto à Caixa Econômica Federal para execução de obras de mobilidade, infraestrutura e pavimentação. O pacote inclui, ainda sem especificar bairros e localidades a serem beneficiadas, a ligação pavimentada de 30 quilômetros de ruas na cidade e outros 30 quilômetros de estradas no interior.

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Entendo que não haverá recursos suficientes para asfaltar acessos a tantas localidades do meio rural. Mas torço que se privilegie as sedes das comunidades, onde se concentra o maior número de moradores. Será um enorme ganho de qualidade de vida para essas pessoas que resistem em permanecer no campo.
Pena que esse horizonte de esperança não alcança a maioria dos demais municípios da região. Na contramão da lógica do desenvolvimento, há estradas que interligam localidades e sedes municipais que estão em condições mais precárias hoje do que há três ou quatro décadas. É possível compreender?

Para muitos – a maioria, certamente – o mundo mudou, evoluiu para melhor. Mas outra parcela significativa, não menos importante, ficou atrelada ao passado, presa ao atraso e à negligência.
Sugiro que autoridades estaduais que respondem pelo transporte e trafegabilidade, prefeitos, secretários e inclusive vereadores saiam dos gabinetes em dia de chuva e tentem trafegar pelo interior. E experimentarão as agruras de um mundo que ficou para trás e que, urgentemente, precisa ser resgatado.

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Carina Weber

Carina Hörbe Weber, de 37 anos, é natural de Cachoeira do Sul. É formada em Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e mestre em Desenvolvimento Regional pela mesma instituição. Iniciou carreira profissional em Cachoeira do Sul com experiência em assessoria de comunicação em um clube da cidade e na produção e apresentação de programas em emissora de rádio local, durante a graduação. Após formada, se dedicou à Academia por dois anos em curso de Mestrado como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Teve a oportunidade de exercitar a docência em estágio proporcionado pelo curso. Após a conclusão do Mestrado retornou ao mercado de trabalho. Por dez anos atuou como assessora de comunicação em uma organização sindical. No ofício desempenhou várias funções, dentre elas: produção de textos, apresentação e produção de programa de rádio, produção de textos e alimentação de conteúdo de site institucional, protocolos e comunicação interna. Há dois anos trabalha como repórter multimídia na Gazeta Grupo de Comunicações, tendo a oportunidade de produzir e apresentar programa em vídeo diário.

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