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Dois mais dois

Dois mais dois são cinco. Sim, sei que uma ciência exata afirma que são quatro, mas ciência é só um discurso, uma narrativa nem melhor ou pior do que outras. Do meu ponto de vista, que considera a verdade como questão de perspectiva, dois e dois somam cinco. Certo?

Errado, é óbvio, mas dizer o óbvio é uma necessidade em dias tão estranhos. Por mais que esteja na moda falar em ciência como “narrativa”, tente construir um prédio fora das normas técnicas – ou seja, científicas – e espere para ver quanto tempo ele fica de pé. O ponto de vista segundo o qual tudo depende do nosso ponto de vista não tem nenhuma importância aqui. Você só convencerá alguém de que dois mais dois são cinco se tiver o poder nas mãos, e usá-lo para impor sua vontade, como o Grande Irmão do clássico romance 1984, de George Orwell. O Big Brother orwelliano, que tudo vê e tudo pode, foi inspirado na figura de líderes totalitários como Josef Stalin, ditador da União Soviética durante três décadas, e Adolf Hitler. Eles passaram, o comunismo soviético passou – então por que 1984, lançado em 1949, permanece atual a ponto de liderar listas de mais vendidos em 2021? O que ele diz sobre esta época?

É a questão da “pós-verdade”, sinônimo elegante de “mentira”. O livro de Orwell apresenta um mundo grotesco, onde as palavras expressam exatamente seu contrário. O lema do IngSoc, partido do todo-poderoso Grande Irmão, é: “Guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força”. O Ministério da Paz preocupa-se exclusivamente com questões de guerra, o Ministério da Verdade comanda uma máquina gigantesca de notícias falsas em favor do governo e o Ministério do Amor é responsável por perseguir e se livrar dos inimigos políticos.

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A mentira passa a ser considerada verdade ao se tornar crença coletiva: logo, 2+2 = 5. Esse é o mundo de 1984 e também o da pós-verdade, das fake news, nas quais “quem diz” importa mais do que aquilo que é dito. Negacionistas de plantão, como os do movimento antivacina e terraplanistas, adoram falar em “muitos lados”, “perspectivas diferentes”, etc. Mas vacinas ainda são melhores do que chá de cidreira, ao menos para conter doenças virais. A verdade não é uma questão de opinião.

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