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Dias de quarentena: famílias em família

Alessandra Steffens Bartz
Psicóloga
asbartz@gmail.com

Ruas quase desertas, casas com as janelas abertas, famílias resguardadas em suas bolhas particulares. Um momento atípico, capaz de experiências únicas. Cada família se reinventando, driblando dificuldades, ocupando os filhos.

A família é um sistema fantástico! Seus membros estão todos interligados, se influenciando mutuamente. Pensando metaforicamente, podemos imaginar que a família é uma empresa da qual os pais são sócios. Os pais são, portanto, os líderes e os filhos os colaboradores que devem seguir as regras da empresa-família. Se os pais não concordarem no modo de educar os filhos, poderemos deduzir que a sociedade entrará em crise e que os filhos seguirão aquele que considerarem mais brando ou aquele com o qual tenham maior lealdade. Mas não é assim tão simples explicar em poucas palavras o funcionamento desse sistema complexo, que sofre também múltiplas interferências externas.

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Estamos sofrendo uma forte pressão mundial que comprime a bolha familiar e, ao mesmo tempo, coloca a família em maior tempo de convivência. As famílias estão tendo grandes desafios. É preciso manter a casa limpa, pois a diarista também está em quarentena; passar roupa, cozinhar, poupar. Muitos estão trabalhando em casa, o que pode não ser tarefa fácil quando se tem crianças no lar. E é necessário ocupar as crianças diariamente. Além disso, há preocupação com o coronavírus, com a saúde de todos e dos outros parentes que estão em suas casas, em especial os idosos. É um somatório de elementos de estresse.

Lidar com o estresse exige muita maturidade, inteligência emocional, adaptabilidade. Os líderes da empresa-família estão precisando fazer malabarismos para dar conta de tudo e ter muita flexibilidade para manter o equilíbrio emocional. Pais, resgatem dentro de si a maior maturidade possível para seguir conduzindo com firmeza o barco da família, dando suporte aos vulneráveis, as crianças. As crianças precisam receber informações sobre o que está ocorrendo. A realidade está impactando a vida dos pequenos, que estão sem escola, sem poder brincar com os amigos. Utilizem palavras adequadas à idade de cada filho. Selecionem as notícias que as crianças estão ouvindo junto com vocês. Cuidem também do que vocês estão falando sobre o problema, pois as crianças costumam ter ótima audição. Sentem todos juntos e conversem sobre o que está ocorrendo, enfatizando os cuidados, como a higienização das mãos, mas também mostrando que terá um fim e retomaremos a vida lá fora.

Muitos exemplos de solidariedade, humildade, cooperação estão surgindo a cada dia. Informem as crianças sobre as boas iniciativas, mostrando como podemos nos unir pelo bem maior. Em casa também será preciso união para o bem da família. Dividam as tarefas domésticas, estimulem as crianças a participar do que já podem fazer, colocando em prática a ideia de equipe. Organizem horários para o trabalho, o estudo (várias crianças estão recebendo tarefas escolares para realizar em casa), a organização da casa, para o lazer. As crianças apreciam rotina, pois lhes transmite organização e segurança.

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E não limitem o lazer ao uso das tecnologias. Existem muitos recursos saudáveis disponíveis em sites e aplicativos. Porém, as crianças precisam brincar, se movimentar, criar, montar. Usem a criatividade para propor brincadeiras possíveis à realidade de cada casa. Use o pátio para criar um circuito com bola, corda, cesto. Pule amarelinha, elástico. Montem brinquedos com sucatas. Resgatem os jogos de tabuleiro, ótimas ferramentas para exercitar o cumprimento de regras, a tolerância à frustração e dar boas risadas. Desenhos em família também costumam ser muito divertidos. Outra sugestão é cozinhar com as crianças. Esta pode ser uma ótima maneira de passar o tempo juntos e ensinar hábitos de alimentação saudável. E não se assuste: para nossa sorte, o Google está cheio de boas ideias para quem não for tão imaginativo.

Além das brincadeiras, cultivem momentos de calma e relaxamento. Podemos olhar pela janela e apenas ficar observando o ambiente ao nosso redor. Valorizar a natureza é um valor importante a ser aprendido. Ou quem sabe resgatar um livro nunca lido, buscar a literatura disponível de forma gratuita na internet. Os pequenos geralmente adoram histórias. Cada um conforme sua crença, ensine as crianças a terem fé, gratidão e a orar por todas as pessoas que precisam. Vamos dar exemplos de resiliência, compaixão e vida em comunidade. Talvez seu vizinho idoso possa necessitar algo do mercado e esta seja uma boa oportunidade de não apenas falar, mas mostrar que podemos sempre ajudar o próximo.

E não deixem de observar o comportamento, as emoções, as falas de seus filhos. Algumas crianças são mais sensíveis, preocupadas, ansiosas e podem ficar abaladas com tudo que está ocorrendo ao redor. Nesses casos, dê colo, escute a criança, apoie. Mas não critique ou diga apenas que vai passar, subestimando a dor sentida. Avalie se seu filho não precisa de ajuda profissional. O estresse pode favorecer transtornos emocionais em crianças e adultos ou até piorar aqueles que já estejam com algum quadro de ansiedade, depressão, luto. Pais, fiquem atentos! Prestem atenção também ao seu próprio estado emocional, pois, se uma mãe estiver muito ansiosa, por exemplo, os filhos poderão ficar mais assustados. Um pai entristecido, com receio da perda do emprego ou da redução do salário, pode estar mais calado e isolado, deixando no lar uma nuvem de preocupação que afetará a todos. Muitas vezes as crianças apresentam sintomas que se relacionam ao modo como a família está funcionando. Portanto, se esforçar para manter um clima leve em casa ajudará a todos.

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É, a vida nos prega suas peças! Às vezes retira o tapete por debaixo de nossos pés, evidenciando que não temos o controle que queremos acreditar ter. Contudo, o importante é o modo como reagimos àquilo que a vida nos apresenta. Como eu me deixo afetar pelo que acontece. Uns ficam se debatendo, vitimizando, procurando culpados, minimizando o problema. Outros arregaçam as mangas, tiram aprendizados, partem na busca de alternativas. Vamos construir pontes de união em nossos lares! Se temos que ficar isolados em família, façamos desse momento o melhor possível. E, quem sabe, um dia, olhando para trás, lembraremos que tivemos uma fase difícil, onde aprendemos e amadurecemos muito individualmente e enquanto famílias.

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