O que, afinal, é ser um voluntário? É doar tempo, espaço, boas ideias, força? Pode-se concluir que ser voluntário é, acima de qualquer definição, pensar no bem-estar do próximo. Acreditar que a própria existência é capaz de contribuir para o desenvolvimento do outro e transformar essa crença em ações, sem visar lucro ou status, é o que faz do ser humano um voluntário.
Neste sábado, 28, celebra-se o Dia do Voluntário. Neste ano e no último, os serviços desempenhados por essas pessoas tornaram-se ainda mais importantes, visto que a pandemia de Covid-19 evidenciou e potencializou crises sanitária, econômica e social.
Disseminar alegria e mensagens positivas
Foi em 28 de agosto de 2005, Dia do Voluntário, que o grupo Doutores Só Riso realizou a primeira atividade em um hospital. Atualmente com 30 voluntários ativos, novos participantes são sempre bem-vindos, segundo o fundador e coordenador Oglacir Rodrigues, de 54 anos, que é mais conhecido como o palhaço Kico.
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Rodrigues relata que o personagem Kico nasceu em 2000, em um projeto de arte circense da Prefeitura de Vera Cruz. Acabou se identificando e começou a fazer ações em um projeto educacional do Bairro Faxinal, em Santa Cruz do Sul. Hoje, os Doutores Só Riso usam a arte do palhaço para qualificar as relações humanas dentro dos hospitais, abrigos de menores, casas de apoio, escolas, comunidades carentes e outros espaços. Até que começasse a atuar oficialmente, o grupo passou por capacitações. “Uma frase que me guia é: Para quem serve tua arte?”, diz.
Com a pandemia e a obrigação de evitar aglomerações e, consequentemente, a impossibilidade de entrar em alguns espaços, o grupo precisou dar uma pausa e reinventar o modo de servir. “Tivemos trabalhos on-line, mas vimos grande dificuldade de acessar os pacientes. Nos poucos que tivemos acesso, conseguimos ver a importância do trabalho voluntário. Isso exaltou mais a pertinência das mensagens positivas para a recuperação das pessoas”, frisa.
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Claudia Hochscheidt integra o Doutores Só Riso desde 2016. Segundo ela, são quase dez anos de voluntariado. “Preenche meus dias e meu coração. O trabalho voluntário não é só doar o seu tempo. É também uma forma de doar respeito, cuidado, carinho e amor, e levar um pouquinho de alegria para todos. Só posso agradecer por todas as pessoas que fazem esse trabalho comigo e por todas aquelas que sorriem para mim depois de uma música, uma oração, uma palavra de afeto”.
Acolhimento e escuta
Com diversos sentimentos potencializados pelo distanciamento social, um serviço que continuou sendo essencial foi o do Centro de Valorização da Vida (CVV). Totalmente voluntária, a organização atende cerca de 11 mil ligações diárias em todo Brasil. Por ligações telefônicas pelo 188, e-mail ou por chat, o CVV proporciona apoio emocional e prevenção ao suicídio, atendendo gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo.
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Santa Cruz do Sul é a única cidade dos vales do Rio Pardo e Taquari que possui um polo do CVV e, atualmente, conta com 16 voluntários treinados para atender quem precisa ser ouvido. Uma dessas pessoas é Naira Lisane Zanette, de 57 anos, que faz voluntariado desde 2013. “Eu sempre quis fazer um trabalho voluntário, mas queria algo diferente, com intensidade. Apesar de eu ter formação em Ciências Contábeis, desde pequena sempre fui muito de evitar brigas, de ouvir. Me encantei, entrei no treinamento e vi a grandeza daquele trabalho”, relata.
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Sucessivamente, após o treinamento, foram três meses para saber se estava realmente apta ao trabalho. “Estamos num mundo em que quase ninguém tem tempo para escutar. Quando a pessoa está com um problema, ela quer ser ouvida. No momento que você atende aquele telefonema, o nosso tempo é integral para aquela pessoa. Prestar atenção é muito importante para quem está do outro lado da linha”, esclarece.
Durante a pandemia, segundo Naira, algumas ligações abordaram temas relacionados à ansiedade causada pelo isolamento. “As pessoas ficaram muito reclusas, muitas moram sozinhas, ficaram ansiosas e com medo da situação. Isso as afetou muito e elas ligavam para nós, expondo seus medos e ansiedades”, conta a voluntária.
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Doar tempo e a profissão
É na profissão que o psicólogo clínico Juliano da Cruz, de 51 anos, encontra uma forma de oferecer auxílio ao próximo. Pós-graduado em Administração de Pessoas e aluno do Mestrado Profissional da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Juliano atua, há seis anos, como voluntário na Liga Feminina de Combate ao Câncer de Venâncio Aires. No local, realiza o acompanhamento psicológico dos pacientes com sessões presenciais, virtuais, terapias em grupos e também visitas domiciliares para os pacientes com dificuldades de deslocamento.
“Participo das campanhas de prevenção e arrecadação, acompanho a equipe de voluntárias e a distribuição de donativos. Sempre tive desejo de contribuir e comecei através do convite de uma voluntária, visitando pacientes acamados para conhecer sua realidade e necessidades. As responsabilidades foram sendo ampliadas com o passar do tempo, mas tenho orgulho dessa trajetória. Espero que ainda seja só o início, e que ainda possa contribuir muito, enquanto me sentir útil.”
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O profissional salienta que, para ser voluntário, é preciso sentir alegria em servir, gostar de trabalhar em grupo e participar de atividades sociais voltadas para o bem-estar das pessoas. “Isso acaba trazendo prazer e alegria para quem pratica, fortalecendo laços de convívio e amizade que não raramente se estendem para a vida, rompendo as barreiras do voluntariado. Cada conquista alcançada para a causa costuma ser comemorada, não no individual, mas no coletivo, proporcionando uma sensação de prazer ampliado”. Além disso, para Juliano, a atitude é viciante. “Falar de voluntário é falar de quem doa um pedaço do seu tempo e da sua força de trabalho para outras pessoas que estão necessitando, geralmente movidos por um desejo solidário de transformação de alguma realidade social”, salienta.
A pandemia de Covid-19 intensificou muitos problemas sociais. Como consequência, cidadãos dispostos a ajudar também começaram a aparecer em diversos setores da sociedade. “Na crise provocada pela pandemia, os sentimentos de inércia e impotência foram potencializados, nos sentimos todos desamparados e incertos sobre o futuro. Na verdade, ninguém sabia exatamente o que fazer e como seriam os desdobramentos dessa doença. Nos vimos separados das pessoas que amamos, obrigados a confiar na ação dos governantes, nas redes de saúde e não sabíamos nem se estaríamos abastecidos de alimentos”, frisa o psicólogo.
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Ele crê que o motivo do engajamento em situações de estresse alto é uma reação das pessoas que não se conformam em ficar inertes quando expostas a situações catastróficas. “Estar ligado a uma causa oferece conforto e serve como consolo emocional. Nada como trabalhar com os outros em busca de um objetivo comum”, conclui.
Sem pensar em receber algo em troca
Há pouco mais de um ano, a Associação Comunitária Pró Amparo do Menor (Copame) de Santa Cruz do Sul conta com o trabalho voluntário de Maiara Tanize Matos, de 22 anos. Presidente da Diretoria Jovem da entidade – papel que ela considera o mais bonito que já exerceu –, participa de atividades como horta, reforço, saúde, reformas e capacitação dos jovens. “Atuo coordenando e direcionando algumas atividades dentro do grupo e incentivando os demais voluntários para que participem das ações. Temos como exemplo os almoços beneficentes, divulgação dos produtos da padaria e comercialização, rifas realizadas com parceiros, etc.”, comenta.
Segundo Maiara, foi a partir de um trabalho voluntário de jovens junto à Polícia Civil que a vontade de realizar mais ações do tipo foi despertada. “Na Copame, eu tive a oportunidade de dar continuidade nesse meu desejo. Sempre cresci com a vontade e a disponibilidade de ajudar o outro, sem pensar em receber algo em troca”. De acordo com a jovem, faltam palavras para descrever a sensação que é fazer parte da Copame. “Sinto alegria, entusiasmo, fico enérgica com os projetos novos, tenho força para dar continuidade nas ideias e gratidão por ter sido escolhida para exercer esse papel de liderança”.
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A pandemia do novo coronavírus causou um impacto que, conforme Maiara, foi sentido por todo o grupo. “Muitos planos e projetos tiveram que ser adiados, não pudemos ter a presença das crianças na horta, restrições, a falta de abraço, o carinho de perto”, pondera.
Animais também contam com apoio
Sem uma sede, a ONG Protetores de Santa Cruz do Sul conta com doações e, principalmente, com o tempo e espaço dos voluntários ligados à entidade. Isso porque os animais resgatados de situações de maus-tratos e abandono precisam de lares temporários. A servidora pública Aline Coimbra, de 44 anos, é uma dessas pessoas.
Foi durante a pandemia que ela percebeu que poderia doar parte do tempo dela à causa. “A ONG seguido precisa de lar temporário para deixar os cachorros, não tem onde colocar depois do resgate. Então eu me ofereci para abrigar. Com a pandemia se estendendo e a gente em casa, pensei que ajudava só com dinheiro, não participava, e que poderia ajudar a colocar a mão na massa. Tu vê os animais chegando magrinhos, assustados e depois ficam tão bem. É muito bom, dá vontade de trazer todos.”
Atualmente, Aline está abrigando temporariamente Joana, que é uma cadela mais idosa e requer diversos cuidados, e Pilar, uma cachorra mais jovem e de porte grande. Diariamente, ela leva as duas para brincar em uma praça perto de casa, no Bairro Verena. “A gente não deposita eles em casa, a gente leva para brincar, socializar, para eles terem uma família, ainda que temporária. Quando eles chegam são muito assustados, e quando eles brincam e socializam, vão perdendo os traumas”, explica Aline.
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