Dez meses depois de ter a casa interditada, o aposentado Jorge Cláudio Silveira, de 71 anos, ainda enfrenta dificuldades. Morador da Rua São Gabriel, no Centro de Santa Cruz do Sul, sequer consegue se locomover para ir fazer a barba, como costumeiramente fazia numa escola de cabeleireiros nas proximidades de onde mora. “Eu era um homem que carregava uma pedra de alicerce no ombro, e hoje não consigo levantar um palito de fósforo”, compara Jorge. Além dos problemas de saúde, uma situação volta a preocupar o arrumador de guarda-chuvas, como é conhecido. A casa em que reside precisa de reparos para dar conta do inverno que vem por aí.
“As aberturas que existem nas madeiras nos deixam preocupados com a chegada do frio”, ressalta a filha Cristina Silveira, de 44 anos, que não reside com o pai devido à precária estrutura. “Eu moro numa peça próxima à casa dele. Minha ideia era morar junto para cuidá-lo, mas devido às aberturas da parede, acaba chovendo para dentro e não tem como dormir”, comenta Cristina, que atualmente está desempregada.
Em setembro do ano passado, a casa onde residia precisou ser interditada devido ao perigo de tombamento. Sem local para morar, na oportunidade, a Prefeitura ofereceu à Jorge material para construção de uma nova residência de madeira, ao lado da interditada. A ONG Fazer o Bem Sem Olhar a Quem foi a responsável pela construção. Contudo, com a chegada do inverno cada vez mais próxima, o local precisa de reparos. “Se chove molha boa parte da casa. Quando vier o frio, o vento vai passar com força pelas aberturas nas madeiras. E precisaríamos ter uma instalação elétrica melhor, devido às inúmeras extensões que precisamos usar nas poucas tomadas, que são perigosas”, ressaltou Jorge. Hoje, a instalação elétrica da casa onde vive é ligada junto à morada que foi interditada, podendo, em caso de temporal, arrebentar os fios e causar até mesmo um incêndio devido a um possível curto-circuito.
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Os desafios que surgiram ao longo dos anos
Por causa de complicações envolvendo a diabetes, diagnosticada há cerca de 15 anos, ele teve de amputar um dos dedos do pé direito. Acostumado a ser um “biscate”, como o próprio se define, Jorge era pedreiro, carpinteiro e trabalhava com instalações de água e luz. Em 2005, ao voltar de bicicleta para casa de um dos serviços prestados, um carro fechou a sua passagem na esquina das ruas Galvão Costa e Marechal Deodoro, e o santa-cruzense precisou desviar para o posto localizado às margens da via. O resultado, após bater no concreto do meio-fio da calçada, foram oito pontos na cabeça, duas costelas quebradas e uma grave lesão no baço.
Para Jorge, que toma medicamentos para controlar a diabetes, pressão e triglicerídeos, a situação se agrava por não possuir veículo, nem mesmo uma cadeira de rodas. “Até para ir ao banheiro preciso do auxílio da minha filha”, diz Jorge.
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Jorge e a filha sobrevivem do Benefício da Prestação Continuada (BPC) do governo federal, que paga um salário mínimo (R$ 998,00) por mês a pessoas com mais de 65 anos ou que tenham alguma deficiência. Além desse valor, o homem trabalha há mais de 40 anos no conserto de guarda-chuvas, sombrinhas e guarda-sóis. Outrora fazendo o conserto de 50 sombrinhas por dia, hoje, devido à condição, faz o que pode trabalhando na própria cama. “Eu ia à Porto Alegre e comprava barato as sombrinhas quebradas. Trazia de ônibus para Santa Cruz, consertava e revendia”, explica Jorge, relembrando com orgulho a época ativa.
Segundo ele, alguns guarda-chuvas recuperados foram parar no nordeste brasileiro e até em outros países. “Meus consertos foram para a Argentina, Uruguai e até Suíça. 60% do serviço eu fazia para grandes redes de lojas”, diz, relembrando a condição quase estática que vive hoje em dia.
O que diz a Prefeitura
Em Santa Cruz do Sul, existe uma lei municipal – nº 7.802, de 2017 – que consta ser uma das atribuições da Secretaria Municipal de Habitação auxiliar na reconstrução de moradias de famílias carentes, avariadas por sinistros ou eventos climáticos adversos. Sobre o assunto, também há uma lei federal – nº 11.888, de 2008 – que assegura às famílias de baixa renda, assistência técnica pública e gratuita para o projeto e construção de habitação de interesse social.
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Ciente da situação de Jorge, a Prefeitura busca novamente atuar no caso. “Sempre que as pessoas nos procuram, encaminhamos uma assistente social fazer uma avaliação e emitir um parecer, avaliando as questões de vulnerabilidade como renda; se está em área regular ou não; se possui mão de obra; se tem morador com mais de 65 anos, criança e deficiente; se possui doença; ou mesmo se está em situação de co-habitação. Após isso verificamos o que é necessário fazer com a equipe da área técnica de construção, junto aos nossos carpinteiros, pedreiros e engenheiros”, comentou a secretária municipal de Habitação, Aretusa Scheibler, que irá disponibilizar uma equipe para ir até a casa de Jorge avaliar os reparos necessários.
Tendo visitado recentemente a casa do santa-cruzense, a secretária municipal de Políticas Públicas, Guiomar Machado. também se comprometeu em auxiliar. “Vamos ajudar na alimentação, medicamentos e na própria estrutura”, comentou Guiomar, que sugeriu à filha de Jorge realizar um cadastro no programa Bolsa Família. “A secretaria vai acompanhar em tudo que precisarem”, garantiu a secretária.
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