O perfil de quem procura emprego há mais de dois anos no Brasil é mulher, jovem e com baixa escolaridade. A cada três trabalhadores desempregados, dois são mulheres. Metade das pessoas que estão desempregadas por muito tempo tem entre 17 e 29 anos. Elas acabam caindo na informalidade ou desistindo de procurar emprego, fenômeno chamado pelos economistas de “desalento”. Do total, 80% dos jovens desempregados por mais de dois anos têm baixa qualificação. Isto é, no máximo, possuem nível médio – 38% deles não tem sequer esse nível de escolaridade.
É o que mostra o raio X do perfil do desempregado traçado pela Secretaria de Política Econômica (SPE), do Ministério da Economia, obtido pelo Estadão. O levantamento avalia o tempo que o trabalhador está à procura de ocupação para identificar a taxa de desemprego de longo prazo (TDLP). Ela é definida como o tempo de procura por um emprego superior a dois anos. O quadro de desemprego persistente é considerado de difícil superação porque acaba gerando um efeito de inércia, relacionado à perda de interesse por parte do profissional, e de competitividade, devido à desatualização técnica e tecnológica. Nas crises econômicas, como a causada pela pandemia da Covid-19, a situação se agrava.
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A divulgação dessa radiografia ocorre no momento em que o governo tenta aprovar no Congresso um pacote que prevê cursos de qualificação dos trabalhadores jovens, afrouxa as regras de contratação e permite até mesmo contratos sem carteira assinada para jovens de 18 a 29 anos e trabalhadores acima de 55 que estejam desempregados há mais de um ano. Não há, contudo, nenhuma medida específica para incentivar a contratação de mulheres.
Quanto mais tempo uma pessoa fica desempregada, maior será a perda de capital humano e, consequentemente, menor a chance de ela se recolocar no mercado de trabalho. “Para desenhar uma política de emprego eficiente, temos de entender qual é a composição da taxa de desemprego, em especial, a TDLP”, diz o subsecretário de Política Fiscal, Erik Figueiredo. Segundo ele, problemas históricos que levaram a esse quadro foram agravados na pandemia.
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O professor de Relações do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP), José Pastore, explica que o mercado de trabalho brasileiro ainda está concentrado em empregos relacionados a commodities (produtos básicos, como alimentos e minério de ferro) e serviços de baixa complexidade com milhões de trabalhadores de baixa qualificação – grande parte informais. No Brasil, 3% dos trabalhadores são analfabetos, 32% têm o ensino fundamental incompleto ou completo, 41% têm o ensino médio incompleto e completo e 24% têm o ensino superior incompleto e completo. “De nada adianta oferecer empregos bons quando não há qualificação, nem ter qualificação se não há bons empregos. Esse é o caso do desemprego de longa duração dos mais educados”, diz Pastore.
É muito diferente da situação da Alemanha, por exemplo, que exporta quase metade do seu Produto Interno Bruto (PIB), com grande concentração em bens de alta tecnologia, que exigem pessoal altamente qualificado. São automóveis, aviões, computadores, maquinário, instrumentos científicos, produtos químicos, farmacêuticos, tecnologias verdes e serviços técnicos de engenharia, robótica, inteligência artificial e outros. Cerca de metade dos trabalhadores alemães completam escolas técnicas; 10% formam-se como especialistas, tornando-se mestres em sua profissão; 22% têm diploma universitário e doutorado; apenas 18% não fizeram cursos profissionais.
Referência
Na nota técnica, foram utilizados os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) referentes ao primeiro semestre de cada ano, para o período 2012-2020. O desemprego de “curta duração” (de até 1 ano), que atingia 5% da população em 2012, cresceu até 8,1% da população no período entre 2014 e 2017. Depois, recuou para 7,3% entre 2017 e 2019 e aumentou novamente em 2020 para 9,5% da força de trabalho devido à pandemia.
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Já o desemprego de longo prazo, por outro lado, apresentou crescimento constante entre 2014 e 2019, partindo de 1,2% da força de trabalho, em 2014, e atingindo o máximo de 3,2% da força de trabalho em 2019. Em 2020, atingiu 2,6% da força de trabalho. Para a SPE, essa queda pode ser resultado de medidas fiscais e de socorro ao mercado de trabalho adotadas ao longo de 2019 e início de 2020, como o programa que permitiu às empresas cortarem salários e jornada ou suspenderem contratos de trabalho.
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“Diferentemente da recessão de 2014 e 2016, o grande movimento negativo no mercado de trabalho durante a pandemia foi a saída de milhões de trabalhadores da força de trabalho”, afirma o economista Fernando Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ele lembra de um estudo do Banco Mundial, divulgado recentemente, o qual aponta que crises econômicas têm efeitos persistentes.
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No caso do Brasil, o impacto sobre emprego e salários do trabalhador médio pode perdurar por nove anos após o início, diz o estudo. Veloso ressalta que a pandemia é uma crise dessa natureza, por ter afetado sobretudo os informais e menos escolarizados. Por isso, segundo ele, é possível que a taxa de desemprego de longo prazo tenha aumentado, ao contrário do que indica a nota da SPE.
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