Inicio dizendo que o que vou contar é verdadeiro, por incrível que possa parecer.
No início dos anos setenta as mulheres já estavam em toda parte. Nas faculdades de medicina, de odonto, engenharia e tantas mais. Na minha turma do Direito da Ufrgs havia um terço de gurias, todas muito estudiosas. Em várias áreas se destacavam: nas rádios, nas TVs, nos jornais, na advocacia, no magistério superior, na política. Mas não tinham acesso à magistratura estadual aqui no Rio Grande do Sul.
Era assim: o Tribunal de Justiça abria o edital para o concurso a juiz de direito, do qual constavam vários itens como idade, escolaridade, bons antecedentes, mas não havia nenhuma restrição quanto ao gênero. Esgotado o prazo para as inscrições, a lista era submetida ao exame da comissão de concursos, que indeferia, sumariamente, a inscrição das mulheres. No meu concurso, que aconteceu em 1971, eu tinha 25 anos de idade, havia centenas de candidatos aptos a concorrer, mas não aparecia o nome de nenhuma mulher.
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Dizia-se, a boca pequena, que não era viável uma mulher ser juíza de direito lá nos cafundós. Como é que uma mulher poderia ser juíza? E o marido, e os os filhos, e os perigos?
No concurso seguinte ao meu, várias mulheres se inscreveram novamente e o assunto foi levado por mais uma vez ao órgão especial do TJRS. Acontece que o colegiado já tinha uma composição de desembargadores mais jovens, não tão conservadores. Foi fundamental, a meu ver, o fato de uma filha do desembargador César Dias haver se inscrito. Seu nome: Maria Berenice Dias. Aí mudou a cantilena. Houve uma grande discussão interna e a votação mudou, abrindo as portas para as mulheres. Maria Berenice fez uma maravilhosa carreira, foi juíza brilhante, ascendeu ao cargo de desembargadora, hoje está aposentada e é uma famosa escritora e advogada no campo do Direito de Família.
Assim como a pioneira Maria Berenice as mulheres começaram a se destacar, ruindo por terra todas aquelas falácias que eram motivo para os receios já narrados.
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Muitas se casaram, se separaram, tiveram filhos e ninguém morreu por causa disso. Foram se destacando e hoje, salvo engano, constituem quase 50% no quadro dos magistrados estaduais. As mulheres galgaram todos os cargos, inclusive na Ajuris.
E eu, modéstia à parte, sou pai de uma guria linda, que se formou na Ufrgs, casou e conservou seu nome de família, tem dois filhinhos e é juíza de Direito na Comarca de Tramandaí, Milène Koerig Gessinger.
Agora temos a primeira mulher presidindo nosso Tribunal de Justiça, a desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira.
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