Quarta-feira, hora do almoço. Na chegada ao restaurante vejo uma moça. Faz calor e ela está com um leve vestido de verão. Nos pés, uma sandália rasteira, comum. Parece ter saído do banho. É uma mulher graciosa, de longos cabelos ondulados e que transmite uma discreta sensualidade. Mas há um detalhe: ela é gordinha. Exatamente assim. Gordinha. A palavra que se usa para alguém visivelmente acima do peso, mas que não está obeso. Há curvas ali. Braços, pernas, quadril, busto, barriguinha saliente. Tudo nela é arredondado. Curvilíneo e maciço. E que balança um pouco por baixo da roupa vaporosa. É uma cena bonita. Uma garota fora dos padrões. E muito bela.
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Terça-feira. A mídia brasileira noticia a morte de Luana Andrade Lopes, paulistana de 29 anos. Modelo e influencer – uma espécie de profissão dos que têm milhares ou milhões de seguidores na internet. Luana foi a óbito ao se submeter a uma lipoaspiração no joelho. Ou nas proximidades do joelho. Ou no entorno do joelho. Tanto faz. O fato é que ela não estava satisfeita com a gordurinha que tinha… nos joelhos. Olhando suas fotos, me pergunto se alguém além dela mesma percebia algum problema. Boca preenchida, seios siliconados, rosto harmonizado, nariz modificado… A genética e os procedimentos já haviam deixado Luana lindíssima. E, no entanto, ela não estava satisfeita.
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Até quando vamos aceitar essa violência? A serviço de quem estamos quando ultrapassamos a linha do bom senso em nome da nossa aparência? Por que o olhar do outro sobre os nossos corpos se tornou tão terrivelmente importante? Até quando vamos nos submeter a uma megaindústria que lucra trilhões nos convencendo de que precisamos ser magras, firmes, jovens e gostosas?
Estamos necessitando urgente de um limite. Um limite antes, bem antes do deslumbramento e do inevitável fracasso. Você talvez olhe para uma boneca que corre insana atrás do corpo perfeito e pense: “Que criatura superficial”. E no entanto, ela é uma vítima. Há uma imensa e poderosa máquina a triturar mulheres. Sutil ou intensamente, somos todas bombardeadas pela ditadura do feminino ideal. Que o certo é assim e não assado. E que aquela garota que vi no restaurante precisa entrar nos padrões para ser aceita.
Isso tem que acabar. Não se trata de extirpar a beleza do mundo. Trata-se de entender que a beleza não pode ser encarcerada nesses ditames. Nós mulheres precisamos virar esse jogo. Ou começa por nós, ou não vai acontecer.
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