Categories: Ruy Gessinger

De viagens e canseiras (II)

Regem as disposições universais de boas maneiras e elegância que quando não se tem intimidade com uma pessoa, que se use, de entrada, o plural majestático. Em português seria dar tratamento de senhor o tempo todo. O senhor Becker, apesar de toda sua afabilidade, creio que achou melhor nos tratarmos assim, um dando senhoria para o outro. Ao nos despedirmos, com votos de ele nos visitar no Rio Grande do Sul, perguntei-lhe, em alemão, “O senhor me permite dar-lhe um abraço”? Ele acedeu e nos demos um abração bem à moda gaúcha. Eu acho que ele nunca tinha recebido um quebra-costelas assim. Ficou muito comovido.

Muito falamos sobre o Brasil e seus rumos. Mas sua curiosidade era sobre as cidades colonizadas pelos alemães. Na ocasião, tivemos longas conversas e lhe falei bastante sobre o milagre de pujança que é Santa Cruz do Sul. Admirou-se muito quando lhe disse que o idioma alemão tinha sido proibido durante um tempo, mas no interior das casas se continuava falando. No momento ele quase foi às lágrimas ao recordar os horrores da guerra.

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Também falamos sobre as especificidades do Rio Grande: seu modo de falar, suas tradições, sua cultura. Presenteei-o com um CD com minhas composições.

O que muito o impressionou foi a coragem dos imigrantes em largar tudo, atravessar o oceano e desbravar uma terra onde havia tudo por fazer.

Já a situação das nossas esposas, ambas brasileiras, foi de uma eletricidade imediata. Ambas se apresentaram, já se abraçaram e saíram conversando como se fossem vizinhas de casa já desde crianças. E acho isso encantador no povo brasileiro. A Cristina, esposa do sr. Becker, passava aparteando seu marido: “Oh Roland! para com isso de senhoria!”, ao que seu marido fazia que não tinha ouvido.

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Enfim, o casal é muito feliz, possui três imóveis no Rio, onde ultimamente passam três meses por ano. Hoje isso é muito comum, dadas as facilidades da internet.

Agora vou contar uma boa. Nós estávamos no restaurante do Hotel Oceânico, na Barra da Tijuca, onde recepcionamos o casal Becker e mais um amigo dele de Heidelberg. Becker não gosta de cerveja, assim como eu, e concordou em saborearmos um vinho chileno. Pedi ao garçom para esfriá-lo um pouco no baldinho de gelo, coisa que acho importante de fazer num clima quente. Ao brindarmos, meu filho Rudolf e eu começamos a entoar o “ein Prosit, der Gemütlichkeit”, com direito a segunda voz, ao que o sr. Becker sussurrou a seu amigo: “Eles são mais alemães que nós”. Querem saber? Acho que pode ter razão. Brasileiros sim, com orgulho, mas guardando tradições.

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