Como ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil acompanha a situação do setor no atual governo. Mas não adianta você estimulá-lo a dizer o que quer que seja. “As manchetes abundam, não é preciso que eu diga nada.” O cantor e compositor recebe a reportagem em seu escritório na Gávea. A entrevista realizou-se depois de o repórter assistir ao documentário de Lula Buarque de Holanda, Gilberto Gil – Antologia Volume 1. Gil está sem camisa – de peito nu –, o que está de acordo com o espírito da obra. “O Lula, em quem eu tenho integral confiança, me propôs esse formato que achei bem interessante. Ele selecionou músicas dos anos 1960 aos 80, compostas na época do regime militar, e me pediu que comentasse elas.”
Volume 1 abriu a seção Retratos Musicais da Première Brasil, que sempre foi a grande vitrine da produção nacional no Festival do Rio. Gil foi na sessão. O mais perto que chegou de uma crítica foi ao dizer: “O Brasil é muito maior e mais complexo do que essa camisa de força reducionista em que querem colocá-lo”. No filme, é mais contundente. Ao revisar Cálice, evoca o absurdo da censura ao jornal O Estado de S. Paulo, nos anos de chumbo, à qual o jornal reagiu publicando receitas de bolos e trechos de Os Lusíadas. Lembra: “Havia combinado de ir no sábado à casa do Chico (Buarque), para colocarmos letra numa música que os militares queriam proibir. Mas era Sexta-Feira Santa, e o clima era de evocação do sofrimento do Cristo. Cheguei lá e o Chico me serviu uma bebida amarga, e foi assim que surgiu o Cálice.”
São muitas e deliciosas histórias. Gil estava reunido com amigos em sua casa, durante o exílio em Londres. Experimentaram um ácido, ele viajou. “Havia um caderninho, e eu fiz umas anotações. Muito tempo depois, mais de ano, em outra casa, encontrei o caderno e aquelas linhas colocaram em circulação o Expresso 2222.” Aquele Abraço? “Estava preso e no quartel ouvia muito os soldados repetirem ‘Aquele Abraço’, que era o bordão de um comediante de sucesso. Quando saí, era Quarta-Feira de Cinzas, e a cidade (o Rio) exibia os restos da grande festa. E foi assim que surgiu ‘O Rio de Janeiro continua lindo’.”
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Embora o filme seja centrado nele, aparecem Chico Buarque, Caetano Veloso e outras personalidades. “Foram as pessoas que conheci e com quem convivi que me abriram os horizontes, a mente. A arte ilumina, é para ser compartilhada, faz crescer. Por isso, mete medo.” Antologia Volume 1 vai chegar ao canal Curta! no dia 23. É belíssimo.
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