Existem pessoas mais humanas e outras menos? Vidas com valor e corpos descartáveis? Há mortes que devemos lamentar e outras convém ignorar, inclusive desprezar? Se no Brasil a catástrofe de maio mobilizou – e ainda mobiliza – energias para salvar e prestar ajuda, em alguns lugares do mundo vemos o contrário.
Fiz um exercício de imaginação. Vamos supor que dois criminosos, responsáveis por assassinatos em massa e outros crimes, foram localizados na área central de Santa Cruz do Sul. Dias depois, aviões do Exército bombardeiam dois ou três quarteirões da Marechal Floriano, destruindo tudo e todos por lá, inclusive crianças a passeio. Por quê? Para eliminar dois terroristas. Quantas pessoas achariam isso sensato? Quantos diriam: “Está certo, o País precisa se defender”?
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A comparação pode ser tola, mas não me ocorre nada melhor após mais uma atrocidade na Faixa de Gaza. No último domingo, Israel bombardeou um campo de refugiados na cidade de Rafah, deixando 45 mortos e mais de 200 feridos – crianças, mulheres e idosos entre as vítimas. Benjamin Netanyahu chamou o bombardeio de “erro trágico”, mas as bombas continuam a cair sobre civis palestinos. Até agora, calcula-se que mais de 35 mil morreram desde o início do conflito, no ano passado.
Qual era o objetivo do ataque em Rafah? Eliminar apenas dois líderes do Hamas, o grupo terrorista que matou em torno de 1.400 israelenses e sequestrou algumas centenas, em outubro. Para o Hamas, não há diferença entre governantes e civis de Israel: qualquer judeu é um ocupante do território palestino, um invasor, inimigo a ser combatido sem piedade.
Da mesma forma, a ofensiva israelense trata cada palestino como alvo. Qualquer mulher ou criança pode esconder um terrorista, então não importa quem e quantos vão morrer. “Eles não merecem nada melhor.” Aviões bombardeiam zonas residenciais, hospitais e acampamentos de refugiados, sem discriminação nem remorso. A ajuda humanitária é rechaçada.
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Tal resposta militar, que alguns ainda avaliam como “justa”, tornou-se punição coletiva, crime de guerra conforme o direito internacional. E já seria terrível o bastante se isso acontecesse somente em Gaza. Mas sabemos que não.
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