Há poucos dias, celebramos o início do novo ano. Na passagem de ano, além das festas, comidas típicas, roupas especiais, das mandingas e simpatias, dos rituais, fazem parte as resoluções e promessas: parar de fumar, fazer exercícios, emagrecer, fazer algum curso, mudar de emprego, abrir o próprio negócio, cuidar da saúde, reatar ou encerrar algum relacionamento, melhorar ou recuperar as finanças pessoais ou familiares e por aí vai. A questão das finanças sempre é lembrada nesses momentos, com a promessa de que, no ano que inicia, vamos cuidar melhor do dinheiro, poupar algum valor, investir. Tudo muito vago.
Passada a euforia das festas, viagens, férias, etc, a pessoa se dá conta ou quer se justificar de que não consegue poupar algum dinheiro porque simplesmente não sobra. Carol Sandler, fundadora da plataforma online Finanças Femininas e da TV Carol Sandler, fez uma pesquisa junto a suas seguidoras, no Instagram, para saber qual era a maior dificuldade delas para guardar dinheiro. Além de alegarem a existência de dívidas e falta de planejamento, o motivo mais repetido foi que não “sobrava dinheiro”.
De fato, é difícil encontrar alguém que diga que está sobrando dinheiro para ele. Pelo contrário, geralmente falta. A maioria das pessoas simplesmente não poupa porque não consegue, por várias razões. Uma delas é o viés do presente, explicado pela economia comportamental. Wendy de La Rosa, pesquisadora de economia comportamental na escola de negócios da Universidade da Pensilvânia, disse, num evento recente em São Paulo, que o mecanismo psicológico do viés do presente faz com que se evitem sacrifícios presentes para ter benefícios no futuro. O viés do presente manifesta-se não só nas finanças, mas também em outras situações, quando, por exemplo, alguém com sobrepeso exagera na comida, enquanto faz planos para emagrecer…
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Outra razão são os anunciantes e as empresas de marketing que afetam nossas emoções a cada dia, fazendo-nos ver os nossos desejos como necessidades. “É ainda mais difícil poupar hoje em dia, porque todas as grandes empresas usam milhares de dados para conhecer os hábitos das pessoas e fazê-las consumir cada vez mais. Não é fácil resistir à tamanha tentação…”, diz a economista Wendy.
E uma terceira razão, cada vez mais forte e decisiva: o viés da visibilidade. Trata da influência das redes sociais, nas finanças pessoais e familiares. As novas tecnologias interferem de maneira forte nas relações sociais. A exibição de fotos de viagens, da vida amorosa, do sucesso profissional, até do que se comeu na última refeição, etc., podem provocar inveja e causar sentimentos de infelicidade e solidão, segundo pesquisadores alemães, e levar as pessoas a fazerem a mesma coisa, gastando muitas vezes o dinheiro que não tem. A comparação com os outros dificulta a poupança. A compra de um carro novo pelo vizinho é visível; já as finanças dele – com que recursos ou financiamentos, por exemplo, ele comprou o carro – são invisíveis. Esse viés da visibilidade pode explicar porque as taxas de poupança pessoal, nos EUA e outros países, estão caindo e, no Brasil, nunca chegaram a decolar, mantendo-se em níveis baixos. Se não esbanjassem tanto em itens desnecessários, as pessoas poderiam economizar dinheiro ou usá-lo para coisas mais práticas ou necessárias.
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Para não ficar só em teorias, a economista Wendy sugere alguns conselhos para quem quer poupar, mas não consegue:
- Automatize: com a programação automática de valores poupados, não há necessidade de ter que tomar a decisão todo o mês, quando do recebimento do salário ou da renda;
- Comece no mês seguinte: isso reduz o sentimento de perda, que é sempre mais forte no presente do que no futuro;
- Corte no lugar certo: as despesas mais lembradas para reduzir são entretenimento, restaurantes, compras; mas, em vez de pensar gastar só “x” com alguma diversão, estabelecer e observar um número de vezes em que vai para determinado lugar; é possível, também, economizar nas compras de supermercado, no dia a dia, apenas diminuindo excessos e eliminando supérfluos;
- Preste contas: convidar alguém para “fiscalizar” suas ações; tem que ser alguém rigoroso, que cobre resultados;
- Enxergue-se no futuro: pesquisas mostram que a pessoa que vê uma foto sua envelhecida, o que um aplicativo faz com facilidade, propõe-se a fazer aportes maiores em seus investimentos;
- Olhe em volta: embora sejam individuais, as decisões de formar uma poupança para a aposentadoria vão afetar toda a família, no futuro.
Nos conselhos sugeridos pela economista Wendy, praticamente não existe cálculo a fazer nem preenchimento de planilhas. Não que não seja importante, nas finanças pessoais e familiares, saber fazer algumas contas, pesquisar preços, preencher alguma planilha, ter pelo menos média escolaridade, etc. São apenas ferramentas para subsidiar uma boa educação financeira. A maioria dos conselhos da economista Wendy focam em comportamentos. Educação financeira tem a ver com comportamentos em relação aos hábitos de consumo; é um modelo mental para a realização de sonhos e projetos.
Talvez começar a guardar algum dinheiro tenha sido, mais uma vez, uma das promessas feitas na passagem do ano novo. É hora, então de começar a organizar o bolso. Uma das primeiras providências é fazer o diagnóstico da situação financeira. Além de relacionar os compromissos financeiros já assumidos – aluguel, prestações, água, luz, internet, etc -, durante 30 dias (quem tem renda fixa) ou 90 (quem tem renda variável) anotar todos os desembolsos efetuados. Depois, elaborar um orçamento, remanejando, diminuindo ou eliminando despesas. Nesse orçamento, o valor que se pretende poupar já deve ser previsto como se fosse um compromisso financeiro consigo mesmo – pagar-se primeiro. Porque são pouquíssimas as pessoas que tem dinheiro sobrando, dando sopa sem uma finalidade definida. Isso só se consegue com o estabelecimento de objetivos. O segredo, portanto, para poupar dinheiro é sonhar e estabelecer metas para realizar os sonhos.
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