Muitas coisas mudaram desde que o Brasil teve seu primeiro caso positivo de Covid-19. A confirmação da chegada da pandemia no País impactou a forma de trabalhar, as relações sociais, os cuidados com a saúde e até mesmo as preferências no momento de escolher o lugar ideal para morar, já que, para muitos, o lar virou também local de trabalho.
Contudo, não foram apenas as intenções dos clientes que se modificaram no setor da construção civil. O segmento registrou momentos de queda na procura por imóveis, principalmente devido ao receio de investir com a incerteza decorrente da crise sanitária.
Além disso, a dificuldade em comprar materiais e o aumento no valor desses insumos também resultam no acréscimo dos valores do metro quadrado. Outro problema verificado é a falta de mão de obra. Mesmo assim, o ramo da construção civil ainda é um dos menos prejudicados pela crise, já que para a maioria das empresas a procura por imóveis se manteve, ainda que com características modificadas.
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A Gazeta do Sul conversou com oito construtoras para saber de que forma o setor foi afetado desde o início da pandemia, quais suas expectativas para a segunda metade deste ano e como as necessidades dos clientes foram atendidas. Confira o que dizem os proprietários e diretores.
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Vargas Construções e Incorporações
Clécio Vargas, diretor da Vargas Construções e Incorporações Ltda., destaca que o grande incremento na construção se deve à queda dos juros, principalmente nas aplicações. “Pouco tempo atrás, colocava-se dinheiro no banco e se ganhava 1,2% ou 1,3% de rendimento, então, as pessoas não queriam mais investir. Com a queda nas aplicações, o pessoal voltou para o mercado. Quem tinha dinheiro parado começou a pensar em investir. Esse é um fator que fez bastante diferença no nosso segmento.”
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A empresa trabalha com empreendimentos comerciais e residenciais. Um dos últimos e de maior destaque é o Lisaruth Open Mall, junto ao viaduto Fritz e Frida. Segundo Vargas, o primeiro semestre deste ano foi muito bom. “Os negócios vêm acontecendo, e a perspectiva é que o segundo semestre e o ano que vem sejam muito positivos.” Para a empresa, a alta nos valores de insumos é o grande complicador. “Esse aumento está muito atrelado à alta do dólar, principalmente em subsídios importados, e reflete também nos produtos que o Brasil exporta, especialmente minérios de ferro.” Vargas ressalta que são verificadas mudanças nos gostos dos clientes, que, além de procurar espaços mais amplos, também têm buscado casas e chácaras.
Construtora Zagonel
O ano de 2021 começou bem para a Construtora Zagonel, mas a nova onda e a piora nos casos da Covid-19 no Estado ameaçaram gerar um novo impacto no setor da construção civil. “O primeiro trimestre foi bom, mas depois, com o recrudescimento da pandemia, março e abril tiveram queda. Em junho, o setor começa a reagir novamente e a expectativa para os próximos meses é grande”, diz o diretor e fundador da construtora, José Zagonel.
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Não só a procura por espaços mais amplos foi verificada, mas também a preferência por residenciais. “As pessoas valorizam muito isso. Um exemplo é o Residencial Aurora, que tem ampla área de lazer, espaço pet, pracinha, piscina, salão de festas. As pessoas buscam isso, segurança e principalmente empreendimentos que tenham área de lazer. É emocionante ver o encantamento e a surpresa do cliente, todos ficaram encantados com a beleza, funcionalidade e lazer”, comenta Zagonel.
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O jovem casal Guilherme Assmann, de 28 anos, e Sabrina Toillier, de 27, são um dos que optaram por iniciar a vida a dois no Residencial Aurora. Na espera pelos móveis planejados, eles projetam a mudança para os próximos meses. “Estávamos procurando apartamento ou casa e encontramos esse. Achamos um empreendimento bom de se investir, em um lugar acessível com uma ampla área de lazer. Tem campo de futebol, espaço pet, quiosques, lugar para as crianças brincarem, foi um espaço muito bem aproveitado”, conta Assmann.
Apesar de o negócio ter sido fechado antes do início da pandemia, hoje Guilherme afirma que a escolha foi acertada. Localizado no Bairro Senai, bem próximo ao Centro, além de toda a área de lazer, o local oferece funcionalidade. “Tem tudo perto”, observa.
Entretanto, a parte negativa para o setor da construção civil, segundo Zagonel, é a falta de insumos e o aumento nos preços. O diretor da empresa salienta que a construção civil demonstra grande potencial de empregabilidade, diante da falta de mão de obra verificada nos últimos tempos.
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Construtora Casa Nova
Segundo a arquiteta e diretora da Construtora Casa Nova, Amanda Anderson Passos, as perspectivas são boas diante do cenário financeiro favorável ao setor imobiliário, em relação a juros e novas modalidades de crédito. “As expectativas foram alcançadas, e pretendemos continuar com essa projeção para o segundo semestre. Nosso setor foi prestigiado pela mudança na relação das pessoas com suas residências, em virtude do isolamento. Esse fato trouxe a necessidade de espaços mais amplos, reformas e procura imediata para iniciar os projetos dos novos lares.”
Embora o início da pandemia tenha sido de adaptação, Amanda acredita que soube tirar proveito positivo da situação. “Trouxe-nos impactos favoráveis na forma de organização da instituição, possibilidades de reformas e momento de arrumar a casa.”
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A arquiteta diz que o grupo busca investir cada dia mais em tecnologias. “O lançamento de forma digital foi um ponto muito favorável, além de mais seguro, permitiu maior alcance de clientes. Hoje temos nossos empreendimentos em site, com atualizações da execução e disponibilização de fotos, mapas interativos, tabelas e atendimento a corretores 100% digital, o que facilita e agiliza negociações e processos imobiliários.”
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João Dick Empreendimentos
A João Dick Empreendimentos trabalha com construções residenciais e comerciais. Mas foi nos residenciais que a empresa sentiu maior diferença na demanda. “O morar bem tem cada vez mais importância. Temos um empreendimento que vamos lançar, que originariamente seriam apartamentos de um e dois dormitórios. Só que, com a pandemia, decidimos não ter mais apartamentos de um dormitório, e sim todos de dois. Isso porque o segundo dormitório passou a ser um respiro do apartamento, ele tem uma utilidade muito grande para home office, para receber visitas, para quem tem filho”, explica o empresário João Dick.
O proprietário e diretor da construtora fala sobre o aumento considerável em insumos, principalmente ferro e aço. “Isso fez com que o preço de produção aumentasse muito e, repassando para o preço de venda, aumentou o preço dos imóveis.”
Delta Projeto e Obra
A Delta Projeto e Obra trabalha na linha de empreendimentos para investidores e tem em seu currículo construções de grande relevância, como o novo prédio da Polícia Federal, a nova sede da Justiça Federal e o Centro Integrado de Segurança Pública e Cidadania da Zona Sul, entre outros.
O proprietário, Silvio José Kist, destaca que o impacto foi maior nos primeiros meses da pandemia. “No início, as regras foram mais rígidas e tivemos que afastar pessoal de obra, a quantidade de pessoal por metro quadrado foi limitada, alguns funcionários precisaram se afastar em função da idade e houve uma demanda de equipamentos e material para proteção. Tudo isso teve um acréscimo no preço.”
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O isolamento social também refletiu no setor. “Em função de as pessoas estarem muito em casa, sem sair, isso automaticamente reduziu a demanda. A indústria do entretenimento está fechada, restaurantes com restrições. Todos são clientes da construção civil, então nos afetou bastante de uma maneira geral”, diz, ressaltando que, além disso, foram abusivos os aumentos de insumos, como de aço e louças.
Vêneto Empreendimentos Imobiliários
Este ano é de boas previsões para a Vêneto Empreendimentos Imobiliários. O engenheiro civil Astor José Grüner, sócio-proprietário e diretor administrativo da empresa, afirma que no ano passado o início da pandemia trouxe preocupação e, como reflexo, o mercado recuou. “No segundo semestre, houve redução do dinheiro no mercado financeiro, implicando na migração dos investimentos para o mercado imobiliário. Embora o final de 2020 e início de 2021 tenham sido de nova retração, no segundo trimestre já se pode notar que começou a movimentar o mercado. Portanto, a expectativa para 2021 é muito positiva”, ressaltou.
Em agosto, a Vêneto iniciará a execução da obra do Residencial Maggiore Vêneto, na Rua Rio Branco. O empreendimento terá 22 pavimentos de apartamentos – um por andar – com ampla infraestrutura. Segundo o engenheiro civil, com a popularização do home office e as escolas fechadas durante certo período da pandemia, houve aumento no número de pessoas buscando morar em casas, especialmente em condomínios fechados. “Nesse sentido, também percebemos uma atenção maior das pessoas com relação ao projeto interno, observando a disponibilidade de espaços com privacidade.”
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O maior impacto decorrente da pandemia foi quanto aos prazos de execução das obras, visto que haviam sido previstos em período anterior à crise sanitária. “Cabe citar a paralisação de atividades e as restrições quanto ao número máximo de trabalhadores e grupos de risco; dificuldades na contratação de novos funcionários e de serviços terceirizados, devido às incertezas do cenário de pandemia; escassez de matérias-primas e consequente aumento de preços e demora na entrega. Sentimos a necessidade de postergar o lançamento de novos empreendimentos, porque são projetos de grande porte”, salienta o sócio-proprietário, que acrescenta: “Investimento seguro é no mercado imobiliário.”
Intercontinental Empreendimentos Imobiliários
A recuperação vem com força e acompanhada pelo interesse das pessoas por imóveis de alto padrão. O diretor da Intercontinental Empreendimentos Imobiliários, Carlos Klemm de Anastacio, comenta que a empresa tem percebido um incremento na procura, ainda que haja problemas com insumos e mão de obra. “Vemos dificuldades ainda no fornecimento de materiais, tanto os mais pesados quanto de acabamentos, além da dificuldade em conseguir mão de obra e grande aumento nos custos dos insumos, principalmente do aço.”
Situado no Bairro Higienópolis, em Santa Cruz do Sul, o condomínio Portofino é um dos destaques da construtora. “Percebemos que há um interesse por espaços mais amplos e as pessoas procuram apartamentos maiores, por conta de estarem ficando mais em casa”, diz o diretor da Intercontinental. Durante a pandemia, o impacto ocorreu devido ao medo de clientes investirem, mas o retorno positivo foi verificado ainda no final do ano passado. “Em outubro, começamos a sentir uma retomada no interesse e uma procura maior por imóveis. E este ano está em um ritmo bem interessante.”
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Rosacruz Incorporadora
Para a Rosacruz Incorporadora, a perspectiva é boa em relação aos novos lançamentos, embora o aumento significativo dos valores de materiais de construção tenha impactado no preço final do metro quadrado do imóvel. “Minha expectativa para este primeiro semestre é que, através da construção civil, venhamos a ter uma resposta significativa de aquecimento de mercado no final do ano. Assim que tivermos uma estabilização, a decisão de investir virá naturalmente”, salienta o CEO da construtora, Ricardo Franck.
A construtora, que possui trajetória com empreendimentos centrais de sucesso, lançou em 2020 o Edifício Gaudí, localizado na área central de Santa Cruz, sendo considerado destaque no mercado. “Vendemos 70% do prédio no seu lançamento. Obviamente, no começo de 2021 houve uma retração natural do mercado, em função da segunda onda da pandemia, mas agora, com a vacinação e a resposta mundial no que tange a crescimento, devemos ter uma estabilização e resultados positivos. Isso vai fazer com que tenhamos novamente um aumento de vendas no setor imobiliário”, complementa Franck.
O CEO observa que a pandemia resultou na readaptação na forma de trabalhar, conviver socialmente e residir. “Percebemos um novo modo de morar e se relacionar, tanto com as pessoas quanto com a própria cidade. É a fusão dos ambientes de lazer e trabalho, com um novo olhar para o aproveitamento de tempo e performance de vida. A Rosacruz acredita, a cada dia mais, que morar bem é estar próximo de tudo aquilo que você precisa. E o Centro entrega todos esses benefícios, como funcionalidade, lógica de locomoção, conveniências e valorização de um bem extremamente importante: o tempo.
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Imobiliárias também sentiram impacto
Assim como todos os setores da economia que foram impactados pela pandemia de Covid-19, a situação não foi diferente para o mercado imobiliário. De acordo com o presidente da Sociedade das Empresas Imobiliárias de Santa Cruz do Sul (Seisc), Flávio Bender, o período mais complicado foi registrado nos primeiros meses da pandemia, em 2020. “Toda nossa economia foi paralisada e houve retração nas intermediações imobiliárias e muitas negociações no setor de locação, onde os comerciantes inquilinos e proprietários negociaram valores dos aluguéis”, relata.
Bender destaca que se confirma a tendência de as pessoas buscarem imóveis mais amplos. “O isolamento social trouxe uma nova cultura e hábitos diferentes para todos. Com a maior permanência nas residências, as pessoas começaram a procurar por lugares maiores, com mais espaços, onde poderiam fazer um local para trabalhar ou mesmo para lazer. Também houve uma procura maior por áreas rurais, por chácaras.”
Além disso, a expansão para outras regiões da cidade, tais como Linha Santa Cruz, João Alves, Bairro Aliança, é natural pelo crescimento da cidade e consequente necessidade de mais espaço para novos loteamentos e empreendimentos. “Mas também na área central existe uma procura grande por imóveis, e aí, por falta de espaço para construções unifamiliares, são construídos prédios de apartamentos”, esclarece.
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Taxa Selic e o mercado de imóveis
A Selic é a taxa básica de juros da economia e o principal instrumento de política monetária utilizado pelo Banco Central para controlar a inflação. Após a última alta, de 0,75%, atualmente a Selic está em 4,25% ao ano. Com o aumento, ainda que com a redução dos preços dos imóveis, haverá também reajuste no valor dos financiamentos.
O doutor em Economia Silvio Cezar Arend explica que a elevação da Selic é repassada aos tomadores de empréstimos quase imediatamente, pois o custo do dinheiro se eleva para o setor financeiro. “O repasse em maior ou menor grau depende do grau de concorrência no segmento específico, das estratégias dos bancos para conquistar mercado, etc. Então, não necessariamente o repasse é efetuado automaticamente, pode levar um tempo, enquanto os agentes financeiros observam uns aos outros, quais as reações da concorrência. Mas a tendência é que seja repassado ao custo dos novos financiamentos – os que serão contratados a partir de agora”, diz Arend.
Conforme o especialista, nos contratos em vigor, dependendo do que foi pactuado, não haverá alteração. “A menos que tenham sido contratados com taxa flutuante – ajustada a cada momento do tempo.” Ainda segundo Arend, a tendência é que a taxa sofra mais uma elevação na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorre em agosto. “O cenário é de alta futura das taxas de juros”, completa.
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