15 de dezembro de 1995. O ex-governador do Rio Grande do Sul e então deputado federal Jair Soares se deslocava de carro rumo a Agudo naquela tarde de sol. O objetivo era encontrar um candidato que aceitasse concorrer a prefeito do município, dentro do plano nacional de expansão do PFL (hoje DEM), partido que surgiu de uma dissidência do PDS (antiga Arena). Contra o relógio, Soares precisava chegar em Agudo, convencer o candidato a prefeito que tinha em mente a aceitar o desafio de concorrer, e ainda filiar outras cinco pessoas para oficializar a criação do partido no município.
Após isso, precisava chegar até o cartório eleitoral mais próximo, em Faxinal do Soturno, a 25 quilômetros de Agudo, para registrar as candidaturas até as 18 horas. Às 15 horas, bateu na porta de um homem considerado um dos grandes líderes do município. Eleito vereador mais votado em 1988, Lauro Reinoldo Reetz havia largado a política ao término do mandato, em 1992, para se dedicar às lavouras de arroz que possuía em Agudo e em Dom Pedrito.
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Naquela tarde, porém, aceitaria o convite de Jair Soares e voltaria à política para uma eleição histórica, onde, em 1996, seria eleito prefeito com a maior margem de diferença de votos por quantidade de habitantes na região central do Estado – fato que lhe rendeu um prêmio. Mais histórico do que isso, só quatro anos depois, quando venceu seu oponente por apenas um voto, na primeira eleição municipal com uso de urna eletrônica em 100% do território brasileiro.
Lauro Reetz, aos 80 anos, recebeu a equipe da Gazeta do Sul em sua casa, na área central de Agudo. Ele contou detalhes de sua trajetória e relembrou a vitória marcante por um voto, fato que rendeu uma discussão e quase a prisão de um oponente que observava a contagem dos votos no cartório eleitoral de Faxinal do Soturno, por ter duvidado do resultado.
“Naquela tarde de sexta-feira, era 15 horas quando o Jair Soares bateu na porta da minha casa. Mas eu não estava. Minha esposa comentou que eu tinha ido ao Banco do Brasil. Aí ele foi lá”, contou. O ex-governador foi barrado pelo segurança do banco, pois o estabelecimento já estava fechado. Porém, foi reconhecido pelo gerente, que conversava com Reetz em seu gabinete.
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“O gerente avisou o segurança para deixar ele entrar. Quando entrou, disse que queria conversar comigo. Aí me explicou toda a situação.” Soares e Reetz haviam sido da Arena e do PDS. Devido à rivalidade com o PMDB, o ex-governador chamara Reetz, quando este era vereador da sua legenda, e não o prefeito que era do seu partido opositor, para assinar anos antes um termo de início das obras do asfalto que passaria por Agudo.
“Ele achou que eu poderia ser candidato, por ter sido vereador, líder comunitário. Por fim, ainda firmou o compromisso de liberar emenda de R$ 100 mil para construção de quatro pontes caso eu fosse eleito”, recordou Lauro. A dupla conseguiu encontrar os cinco filiados que precisava em frente ao banco, e levar os documentos até o cartório eleitoral de Faxinal do Soturno para oficializar a candidatura. À noite, um jantar selou o compromisso.
Na eleição, a vitória foi de lavada. Dos 10.118 votos apurados no pleito de 1996, o último municipal com voto impresso, 5.689 foram para Lauro Reinoldo Reetz e 4.086 para Milton Clever Jaeger. A alegria pelo triunfo contrastou com a decepção pelas dificuldades financeiras encontradas por Reetz quando assumiu.
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“Herdei a Prefeitura com 54% da arrecadação comprometida com a folha de pagamento. Equipamentos quebrados, escolas abandonadas, estradas horríveis. Tive de assinar de avalista para conseguir combustível porque a Prefeitura não tinha crédito. Assim começamos. Trabalhando de forma séria, consegui dar retorno para a comunidade do que ela esperava. Na Prefeitura, é como a nossa família em casa, o que é possível fazer com o que temos é feito, e com a Prefeitura não pode ser diferente. Se entrou R$ 1 mil, se gasta R$ 1 mil, não tem como gastar R$ 2 mil.”
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A eleição seguinte, de 2000, seria bem mais difícil. Após a campanha, chegou o dia da apuração. Por volta das 22 horas, a contagem no cartório eleitoral de Faxinal do Soturno definiu a vitória de Lauro Reetz por um voto.
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Dos 10.959 votos válidos, 5.148 foram para Reetz e 5.147 ara Pedro Ozório Oliveira Schorn, com 191 brancos e 473 nulos. “Aquilo foi uma festa. No momento da apuração, após a divulgação do resultado, os adversários tentaram a recontagem. O juiz disse que estava contado, prefeito eleito, pleito decidido. Entraram com fortes questionamentos e dúvidas sobre a votação, mas o juiz eleitoral gritou que iria prender eles se não respeitassem; aí pararam e todo mundo veio embora”, relembrou Reetz.
Ele recorda que muitas pessoas lhe disseram que o voto delas o havia feito vencedor. E lembra do carinho do pai, que, já de idade, insistiu em votar contra sua vontade. “Venci com o voto do meu pai. Ele já estava com 86 anos, e eu disse que ele não precisava ir votar, porque era a primeira com urna eletrônica, ninguém sabia direito como ia ser, mas ele disse que queria ir. Ele foi e eu fui junto pra ajudá-lo. Guardo isso com muito carinho.” O pai, Adolfo Roberto Reetz, faleceu em 2004, com 90 anos, de causas naturais.
Entre as justificativas para a pequena diferença de votos em relação à primeira eleição, Lauro cita que a redução de cargos do primeiro para o segundo mandato pode ter influenciado, e também a expectativa que os eleitores costumam criar em torno de um candidato novo. “Na primeira eleição, você tem tudo a favor. E na segunda, tudo contra. A oposição dá outro incentivo ao eleitor de que o candidato dela vai fazer tudo. Então, depois de quatro anos, para alguma pessoa o prefeito não faz o que ela pediu, para outra também não se consegue, o que é normal. E aí vem outro candidato que dá esperança de que vai fazer, mas não se faz assim.”
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Na juventude, Lauro Reetz trabalhou como empregado por sete anos em uma casa comercial. Aos 20 casou e começou a plantar arroz, trabalho ao qual hoje seu filho dá seguimento. Bem-sucedido, nos anos 1980 começou a participar da vida pública na comunidade onde nasceu e se criou, Porto Alves, ao sul de Agudo. “Havia uma sociedade na nossa comunidade, mas não tinha sede. Em 1983 me fizeram presidente para tentar levantar um local que seria a sede.”
Foi então que Reetz visitou toda a comunidade para ver se ajudavam com valores para compra do material. “Fui em morador por morador. Muitos me diziam que iriam dar dinheiro depois de pronto, e eu aceitava, pois sabia que iria conseguir. Já contava com esse valor, pois as pessoas cumpriam suas palavras. No final, o saldo fechou.” Com o valor, foi possível construir a sede da Sociedade Porto Alves, da qual foi presidente de 1984 a 2004.
Depois a diretoria da Igreja Evangélica Luterana de Porto Alves quis também que Reetz atuasse como presidente. “Não fui na assembleia da eleição, para não me comprometer, pois já tinha trabalhado na grande obra da sociedade, muitas vezes deixando minhas lavouras para acompanhar o trabalho. Naquele momento, precisava plantar arroz, pois não seria a igreja nem a sociedade que iriam me sustentar. Mesmo assim, sem eu estar na assembleia, me elegeram, e não fugi disso também.” Foi presidente da comunidade da igreja de 1992 a 1996.
O Instituto Cultural Brasileiro-Alemão de Agudo (ICBAA) foi outra obra com a mão de Lauro Reetz. Após seu trabalho na igreja, o pastor Richard Rudolf Brauer procurou-o para auxiliar na construção. “Levantamos os recursos e conseguimos construir um local especial para abrigar grande quantidade de itens relacionados à imigração alemã, como roupas, livros, máquinas, quadros, louças e tantas outras coisas.”
Há 32 anos, Reetz também atua como presidente do Sindicato dos Empregadores Rurais de Agudo. “Fui de sorte. Tudo que eu comecei e trabalhei, onde fui procurado, consegui fazer”, frisou. Por último, e não menos importante, outro empreendimento que precisou da perspicácia de Reetz para ganhar vida novamente foi o Clube Centenário, que estava prestes a fechar as portas. A desconfiança com a recuperação do ponto era tão grande que gerou um fato inusitado.
Uma mulher que trabalhava na contabilidade de um posto de combustíveis fez uma promessa se Reetz recuperasse a piscina do clube, que estava atirada, com os azulejos quebrados e o motor pifado. “Ela disse: ‘Se o advogado, de família rica, que administrava antes, não conseguiu reerguer o clube, esse aí é que não vai. Se ele conseguir, eu tomo um banho nua com ele na piscina.'”
Todo o azulejo precisava ser trocado e não havia um real no caixa. A fábrica de motores em São Paulo revelou que o preço era caríssimo. E ainda precisaria que a Corsan a enchesse com água depois de pronta. “Me deu um arrepio quando a mulher disse aquilo, dentro de um banco. No outro dia fui ver o que tinha acontecido. Fiz um levantamento, consegui o valor e restaurei a piscina e recuperei o clube.” Quando perguntado se ela cumpriu a promessa, de que tomaria banho nua com ele na piscina restaurada, Lauro sorri, pensa e responde. “Ela ficou envergonhada”, limitou-se a dizer.
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