Passadas duas décadas do massacre em que 19 trabalhadores sem-terra foram mortos pela Polícia Militar, a região de Eldorado dos Carajás, no sudeste do Pará, volta a ser o centro das atenções da comunidade internacional dedicada à luta no campo e permanece uma das áreas de maior tensão no meio rural brasileiro.
Como em todos os anos, as 690 famílias sobreviventes que hoje vivem no assentamento 17 de abril participam de um ato ecumênico na curva do “S”, na BR-155, onde ocorreu o massacre. Lá, 19 castanheiras foram plantadas em homenagem às vítimas da chacina.
Este ano, juntam-se a eles dezenas de representantes de movimentos em defesa da reforma agrária que vieram de países da África, Ásia, América Latina e Europa. “Eldorado dos Carajás é um evento emblemático para a comunidade internacional que luta pela reforma agrária, que abriu nossos olhos para a necessidade de globalizar a luta”, disse Faustino Torrez, da Asociación de Trabajadores del Campo (ATC), da Nicarágua.
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A grande comoção mundial gerada pela dramaticidade do massacre – no qual os legistas apontaram a ocorrência de execuções à queima roupa de camponeses, além de trabalhadores mutilados após serem perseguidos pelos policiais até as barracas nas quais acampavam à beira da estrada – levou o dia 17 de abril a se tornar o Dia Internacional de Luta no Campo.
O ato realizado neste domingo pede também pelo fim da impunidade no campo. Até hoje, dos 154 policiais militares denunciados pelo Ministério Público, apenas dois foram condenados por homicídio doloso e encontram-se presos, o coronel Mário Collares Pantoja e o major José Maria Pereira, que comandaram a ação no dia do massacre.
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A falta de punição dos envolvidos é apontada como uma das principais razões pelas quais a região de Eldorado dos Carajás continuar entre as mais tensas do campo brasileiro. De acordo com um levantamento feito pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), dos 846 assassinatos registrados na região entre 1980 a 2014, apenas 293 tiveram inquérito policial instaurado. Desses, 62 pessoas foram levadas a julgamento.
“O massacre acabou estimulando ainda mais a luta dos camponeses na região pela disputa da terra. Por outro lado, também resultou numa continuidade da situação de violência. Apenas após o massacre, de 1996 para cá, a CPT registrou 271 assassinatos de trabalhadores rurais no estado do Pará, sendo a maioria absoluta nessa região do sul e sudeste do estado”, disse João Batista Afonso, coordenador da área jurídica da Pastoral em Marabá, maior cidade da região.
Segundo a CPT, existem no momento 130 fazendas ocupadas por acampamentos do MST no sul do Pará. Enquanto algumas dessas ocupações foram montadas nos primeiros meses deste ano, outras já completam duas décadas sem que se tenha sido resolvido o impasse pela disputa de terras. Estima-se que proximadamente 14 mil famílias estejam acampadas ou aguardando por assentamento na região.
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Para o procurador do Ministério Público Federal Felício Pontes, que há mais de uma década atua na conciliação de conflitos no Pará, a tensão na região é resultado do modelo de desenvolvimento implantando nos arredores de Eldorado dos Carajás, baseado na extração mineral.
“Com essa crise econômica, agravada pela queda do preço das commodities minerais, diminuiu muito a produção e houve uma retração na economia dessa região”, disse Pontes. Com isso, as pessoas que chegam em busca de emprego e não conseguem voltar buscam sobrevivência em terras públicas, muitas vezes reivindicadas por posseiros. “Enquanto persistir esse modelo, a violência vai continuar”, avaliou.
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