As articulações da 2ª Promotoria de Justiça de Rio Pardo para adequar o serviço de energia elétrica prestado no município de Pantano Grande começam a trazer maior tranquilidade à população. O Ministério Público abriu um inquérito civil em janeiro do ano passado e desde novembro realiza reuniões públicas mensais na sede da Câmara de Vereadores para tratar sobre a infrequência no fornecimento do serviço.
A promotora de Justiça Christine Mendes Ribeiro Grehs ajuizou ação civil pública (ACP) no dia 26 de janeiro deste ano, após a concessionária não aceitar a oferta de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Mesmo assim, houve a manutenção das audiências mensais na Câmara. As tratativas sobre os problemas e meios de solução, com o engajamento da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) – Grupo Equatorial Energia, da Prefeitura e da comunidade, já resultaram em mudanças no cenário da descontinuidade no fornecimento do serviço básico e demora para o restabelecimento.
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A promotora Christine ressalta que os resultados atualmente colhidos resgatam a dignidade dos consumidores de Pantano Grande. “As providências adotadas pela CEEE Equatorial se aproximam do que foi visado pelo Ministério Público desde a instauração do inquérito civil. E o apoio da Prefeitura se soma aos esforços para garantir o fornecimento da energia elétrica de forma mais contínua aos usuários do serviço público.”
A população de Pantano Grande guarda na memória maus momentos passados após a mudança da concessão de energia elétrica na área de abrangência do município, com o leilão que vendeu a CEEE à Equatorial, em março de 2021. Com quedas frequentes no abastecimento e demora de até 20 dias para o restabelecimento em algumas localidades, o sentimento de desamparo se tornou ainda maior diante da falta de retorno dos contatos com a empresa, a ausência de perspectivas em relação ao atendimento e o despreparo das equipes técnicas.
O vereador e advogado Lucas da Silva Rodrigues (PT) lembra que o posto de atendimento na cidade, com equipe técnica, foi desativado quando a Equatorial assumiu o serviço de distribuição de energia. Rodrigues explica que, diante do caos no setor, um abaixo-assinado foi encaminhado à 2ª Promotoria de Justiça de Rio Pardo.
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A promotora Christine Mendes Ribeiro Grehs abriu inquérito civil em 31 de janeiro do ano passado, após receber notícias de moradores sobre períodos sem o fornecimento de energia elétrica. Christine expediu ofícios à CEEE Equatorial e à Prefeitura sobre os problemas. A administração municipal confirmou na época as dificuldades na prestação dos serviços, com a promessa, pela concessionária, de investimentos na rede elétrica, mas sem a execução de forma suficiente.
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Os técnicos contratados pela empresa, procedentes de outros municípios, conforme Rodrigues, não conheciam a rede e isso atrapalhava a agilidade para a resolução dos problemas. Com a permanência das reclamações, a Câmara realizou audiência pública no dia 5 de outubro do ano passado, proposta pelo vereador Lucas da Silva Rodrigues, para tratar da infrequência no fornecimento de energia. A reunião teve a participação de representantes do Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), CEEE Equatorial, Prefeitura e comunidade.
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No encontro, o prefeito Alcides Paganotto (PSDB), mais conhecido por Mano, relatou a extensão do drama vivenciado pela população, que se sentia impotente contra o descaso imposto pela CEEE Equatorial. A promotora Christine Mendes Ribeiro Grehs, ao constatar os graves problemas vividos pela comunidade, passou a marcar reuniões mensais para ouvir os consumidores afetados pela infrequência na energia elétrica, sediadas sempre na Câmara.
Com o objetivo de aprofundar a coleta de dados sobre os problemas, a promotora de Justiça de Rio Pardo criou um formulário, entregue ao usuário do serviço de energia participante em cada encontro na Câmara de Pantano Grande a partir de novembro do ano passado. A medida viabilizou a atualização mensal sobre os fatos desde a última audiência.
No documento, os consumidores puderam informar o número do protocolo da reclamação junto à empresa, se houve variação nos níveis de tensão, se aconteceu interrupção no fornecimento de energia e, em caso positivo, qual a causa provável. Além disso, se teve demora no restabelecimento do serviço e, em se confirmando, qual o tempo aproximado até o restabelecimento, bem como se houve danos e se eles foram ressarcidos.
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Além dos formulários, a promotora passou a gravar os relatos de quem mostrava interesse em se manifestar verbalmente. Cópia dos documentos foram, mensalmente, enviadas à CEEE Equatorial, com a solicitação de informações sobre as causas da infrequência no fornecimento da energia. O material também foi anexado à investigação ministerial. Os dados e a resposta da concessionária viabilizaram a oferta de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que não foi aceito pela empresa.
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Diante disso, a promotora Christine Mendes Ribeiro Grehs ajuizou ação civil pública (ACP) no dia 26 de janeiro deste ano, com o objetivo de adequar o serviço de energia elétrica prestado em Pantano Grande pela CEEE Equatorial. A juíza de Rio Pardo, Magali Wickert de Oliveira, deferiu no dia 8 de fevereiro o pedido do Ministério Público e determinou que a CEEE adotasse uma série de medidas para garantir a melhoria do serviço de energia elétrica.
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Mesmo após essa medida, a promotora manteve as reuniões mensais com a comunidade. Até o dia 17 de outubro, o encontro apenas não ocorreu em maio devido à interrupção das estradas em consequência do desastre climático no Estado. Christine explica que as soluções surgiram por meio do regime de colaboração e a CEEE Equatorial mostrou capacidade de resolver os problemas no trabalho com as equipes.
Os constantes problemas no abastecimento de energia elétrica levaram a sensação de descaso à população de Pantano Grande. A Gazeta do Sul mostrou o caos na edição de 27 e 28 de janeiro deste ano, com relatos de diversos moradores. Residente na Vila Frantz, Sandra Guerreiro Teixeira contou que a situação prejudicava o seu trabalho de manicure e costureira, além de afetar a saúde da mãe, que precisa de cuidados com o uso de oxigênio. Observou que as equipes da concessionária ficavam dando voltas pelas ruas e não encontravam o endereço da notificação sobre os problemas. Ouvida novamente esta semana, Sandra contou que as interrupções hoje são menos frequentes e o tempo para o restabelecimento é mais curto.
Com serviço de britagem na localidade de Venda Velha, a 20 quilômetros da área urbana de Pantano Grande por estrada de chão batido, Cátia Bitencourt afirma que teve prejuízos durante vários meses com a demora de até uma semana para o restabelecimento da energia quando ocorriam quedas no fornecimento. Além de paralisar o trabalho, inclusive sem poder emitir notas fiscais, havia a perda dos alimentos armazenados sob refrigeração.
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Cátia atribui a melhoria no serviço às reuniões mensais promovidas pela Promotoria de Justiça e consequentes cobranças à CEEE Equatorial. “Hoje ainda ficamos às vezes três dias sem energia, mas se não fossem essas reuniões, não sabemos como estaria a situação”, conta. A preocupação atualmente é diante dos riscos com possíveis temporais, pois a vegetação próxima à rede elétrica na propriedade ainda não foi cortada.
O professor aposentado Nelson Beinecke reside em Lajeado, mas gosta de aproveitar a tranquilidade do sítio na localidade de Coxilha Bonita, em Capivarita, no interior de Pantano Grande. Quando está no município participa das reuniões mensais sobre a questão da energia e considera importante a documentação dos problemas com os formulários fornecidos pelo Ministério Público para pressionar a concessionária. Lembra que durante todo o mês de setembro do ano passado contabilizou apenas dez dias com abastecimento de energia elétrica. O prejuízo só foi amenizado com um gerador.
Beinecke afirma que o serviço melhorou e muitas vezes alguns vizinhos conseguem agilizar a solução de problemas, pois têm contato direto com funcionários da empresa. Mas reconhece que o grande desafio se relaciona à vegetação próxima das redes de energia. Observa que no município há muito mato de eucalipto, com árvores de até 25 metros de altura que atingem a fiação quando ocorre a queda durante os temporais.
Autor da proposta de audiência pública na Câmara há um ano, o vereador Lucas da Silva Rodrigues afirma que o serviço de energia elétrica melhorou 85% com as reuniões mensais da Promotoria de Justiça, com cobranças à concessionária. “O trabalho do Ministério Público foi fundamental diante da situação caótica que vivíamos, pois não se tinha retorno ao ligar para o telefone 0800 da empresa. E hoje na cidade quase não há mais reclamações”, afirma Rodrigues.
O vereador observa que a empresa recontratou dois eletricistas do município que conhecem a rede e os locais onde há transformadores. A medida auxilia na agilidade da equipe para a localização dos problemas quando há queda de energia. Além disso, uma força-tarefa fez a poda da vegetação nos locais de passagem da fiação para evitar danos com qualquer vento mais forte. A Prefeitura participou com o mapeamento da rede.
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Também ressalta a reabertura do ponto de atendimento na cidade. Com isso, os moradores não precisam mais se deslocar até Butiá, a 42,6 quilômetros de Pantano, para encaminhar os pedidos de ligação à rede ou fazer reclamações por cobranças inadequadas.
Policial militar da reserva da Brigada Militar, Jorge Miranda participou da primeira reunião mensal promovida pelo Ministério Público no ano passado e da última, no dia 17 de outubro. Ele confirma que o serviço melhorou, resultado da mobilização de moradores exigindo melhor prestação do serviço.
Lembra que a qualidade teve notável queda após a CEEE Equatorial assumir a concessão. “Qualquer temporal provocava a queda na voltagem e na energia, depois demorava muito para normalizar e não adiantava fazer contato, pois não havia retorno.”
Miranda afirma que um dos fatores que influenciaram na melhora foi a recontratação de funcionários da cidade, bem como o início das podas na vegetação. Mas observa que ainda há dois lugares com problemas: em Venda Velha e Passo do Canto, que são localidades vizinhas. Explica que os postes são antigos, a rede é obsoleta e falta manutenção. Com isso, moradores daquela área relatam que em setembro ficaram oito dias sem abastecimento com energia elétrica.
O prefeito de Pantano Grande, Mano Paganotto, lembra que o município, antes da mudança na concessão, “tinha como o mais importante uma equipe de funcionários da concessionária na cidade, que conheciam toda a rede, tanto na área urbana como na rural”. Com o desligamento desses profissionais, os poucos que vinham para os atendimentos eram de outros estados e não sabiam a localização dos ramais. Com moradores permanecendo por até 20 dias sem luz, diante da falta de suporte local, Paganotto disse que recorreu à promotora de Justiça de Rio Pardo, Christine Mendes Ribeiro Grehs, com a realização depois de sucessivas audiências com a participação da comunidade.
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Paganotto destaca que a população do interior teve muitos prejuízos com os problemas de energia elétrica, com a perda da produção de leite e outros alimentos. O mesmo ocorreu na cidade, com mercados e outros estabelecimentos comerciais sem gerador próprio. Afirma que nas sucessivas reuniões, com a convocação da CEEE Equatorial e outras entidades, iniciou-se uma conversa em busca de soluções. “Muitas vezes não se tinha nenhum retorno, mas a insistência da promotora Christine e a mobilização dos vereadores, do Executivo e dos moradores começaram a resultar em melhorias, com a colocação, no primeiro momento, de um gerador de luz na Corsan, para garantir o abastecimento de água quando havia queda na energia elétrica”, explica.
O prefeito destaca que a recontratação de alguns funcionários da cidade melhorou muito o serviço. “A Prefeitura também entrou com força total, com o mapeamento, pela Secretaria de Meio Ambiente, de árvores e galhos na área urbana e rural com risco para a rede, onde a CEEE Equatorial passou a fazer os cortes da vegetação. Com essa união de forças, hoje vivemos um momento muito bom. A falta de energia não é mais constante, pois houve investimentos na poda e em novos cabos de transmissão, como também em postes, com a substituição das estruturas de madeira por outras de concreto.”
O relato dos consumidores mostrou que uma das causas das frequentes interrupções no fornecimento da energia elétrica era a vegetação que avançava sobre a rede. Diante disso, a Promotoria de Justiça instaurou novo inquérito civil. Nessa investigação, a promotora Christine Mendes Ribeiro Grehs passou a fazer, além dos encontros mensais na sede da Câmara, reuniões virtuais a cada 30 dias ao constatar a fragilidade no diálogo entre a CEEE Equatorial e a Prefeitura de Pantano Grande.
Os encontros virtuais viabilizaram o entrosamento entre as duas partes para a efetivação das podas da vegetação. Conforme a licença expedida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), a concessionária tem obrigações em relação ao manejo e ao corte dos galhos e árvores nativas ou exóticas – tanto em área urbana quanto rural, nas faixas de segurança das redes de distribuição de energia – e à eliminação de situações de risco iminente de queda e/ou interferência.
A promotora explica que o Município passou a ser orientado e incentivado a cumprir sua obrigação de poda da vegetação na área urbana, antes que encoste na rede elétrica, e a conscientizar a população a fazer o procedimento preventivo nas propriedades particulares antes de atingir a fiação, caso em que cabe somente à CEEE Equatorial fazer o trabalho diante do risco. O serviço avançou na cidade e no interior, mas algumas áreas ainda necessitam das intervenções.
A presidente da Associação dos Pequenos Produtores Rurais, Sônia Alves, residente em Linha Venda Velha, ainda vê riscos com a vegetação próxima das redes. Explica que o serviço de podas não ocorreu na localidade, pois as equipes seguiram em outra direção. Sônia percebeu melhorias no abastecimento de energia na área urbana, mas no interior ainda há necessidade de corte de plantas, troca de postes e avanços no sistema da rede.
Ela tem más lembranças do fim do ano passado, quando a localidade ficou sem luz de 19 de dezembro até 2 de janeiro. Com isso, perdeu todos os alimentos no freezer. Ela considera importantes as reuniões mensais da Promotoria para avaliar os problemas e sugere a disponibilização de ônibus para viabilizar mais participação de moradores do interior.
O superintendente regional da Região Norte da CEEE Equatorial, Sergio Valinho, informou que a aproximação com órgãos como prefeituras, câmaras de vereadores, Ministério Público e a comunidade, é fundamental para atender demandas e cumprir os compromissos regulatórios. Segundo ele, entre as medidas adotadas pela empresa para melhorar o serviço, está a aquisição de equipamentos que permitem a automação, viabilizando condições de identificar de forma remota problemas na rede.
Também houve a recomposição da equipe de limpeza e atualmente existem 28 grupos em toda a área de atuação. “Isso representou um ganho significativo e, para Pantano Grande, foi bastante relevante”, destaca Valinho. Acrescenta que houve a capacitação dos profissionais com maiores conhecimentos e não apenas em algumas especialidades, para a formação de equipes multifuncionais. Isso também exigiu a adequação de equipamentos e troca de veículos para os trabalhos.
Outra mudança ocorreu na estrutura organizacional, com o fortalecimento da unidade regional de Guaíba, cuja abrangência se estende até Pantano Grande. Ela coordena as equipes de trabalho, divididas em duas seccionais, com uma das bases em Butiá, atendendo Pantano. Valinho afirma que também houve a aproximação com os poderes públicos para ouvir as necessidades. Observa que em Pantano Grande a Prefeitura auxiliou muito na questão da vegetação em contato com a rede elétrica.
Na contramão da maior parte do Brasil, Valinho afirma que na área de concessão quase a totalidade dos postes ainda era de madeira, totalizando em torno de 880 mil. Observa que, em contato com o solo, eles começam a apodrecer e causam problemas na manutenção da rede. Em três anos, em torno de 220 mil foram substituídos por estruturas de concreto nos locais onde a situação era mais crítica, com a realização de mutirões. Ressalta que o processo não é tão simples, pois o trabalho envolve a necessidade de desligamento da rede.
O superintendente considera de grande importância a automação, por isso a empresa investe na tecnologia por satélite, pois os celulares, em muitas áreas, ficam sem sinal. Ressalta o apoio forte de alguns clientes grandes, como a fábrica de celulose CMPC, para alargar a faixa por onde passa o circuito da rede elétrica nas áreas reflorestadas, com plano de controle da vegetação. Da mesma forma, existe articulação com as prefeituras para haver plano de controle no plantio de árvores na área urbana, com a adoção de espécies adequadas.
A CEEE Equatorial tomou diversas providências ao longo do ano para tentar solucionar os problemas dos usuários com as frequentes quedas no fornecimento de energia elétrica e demora para o restabelecimento. Entre elas estão:
O superintendente regional da CEEE Equatorial, Sergio Valinho, avalia que é natural no processo de privatização um ciclo de problemas. Segundo ele, a concessionária estatal não tinha capacidade para realizar investimentos para melhorar o serviço entregue à população e focava no atendimento às falhas. Observa que o ativo da antiga CEEE era complexo e, diante disso, até mesmo a RGE, que já operava na concessão em outras regiões do Rio Grande do Sul, não fez proposta. A Equatorial a única interessada no leilão da estatal.
Valinho explica que a área de concessão da Equatorial fica em uma região de muita influência dos fatores climáticos, com aumento dos problemas nos últimos anos. Afirma que havia um passivo muito grande, que não estava dimensionado, para atender às necessidades dos consumidores. Com isso, a empresa passou a fazer uma série de investimentos, com a substituição de postes e condutores e poda na vegetação. Observa que o corte da vegetação ao longo da rede, nos últimos anos de operação da estatal, não era feito. E o contato com a fiação elétrica é uma das maiores causas da interrupção no fornecimento de energia.
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