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OPINIÃO

Com que olhos e braços? – Manifesto a favor do Rio Camaquã

Há uma experiência que todos podemos fazer: nos permitir sermos inundados pelas águas do Rio Camaquã. Rio ancestral, típico da identidade gaúcha. Águas brotadas nas coxilhas de Dom Pedrito, Lavras e Bagé e lançadas na Lagoa dos Patos, após percorrer 430 quilômetros, e drenar uma bacia hidrográfica equivalente a 21.657 quilômetros quadrados, onde se inserem 28 municípios. Entre tantos trechos de rara beleza, podemos observar suas diferentes faces a partir de uma pergunta convocatória: “Como olhamos para o Rio Camaquã?”

  • Como mineradores, movidos pela identificação de uma jazida de areia, de uma ocorrência “preciosa”?
  • Como caçadores, que furtivos, assestam sua mira nos incautos animais que ainda resistem?
  • Como pescadores, prontos a esticar suas redes sufocadoras nos poços e remansos?
  • Como madeireiros, avaliadores da cubagem métrica dos angicos que restam em algumas margens?
  • Como lavoureiros, ávidos por encontrar mais uma réstia de chão para ampliar a sojicultura?
  • Como fracionadores, que através de barragens transformam fluxos em lagos, impedindo a migração dos peixes, modificando o gradiente hidráulico e transformando relações simbióticas?
  • Ou enquanto preservacionistas que enxergam beleza e valor (ao invés de mero recurso a ser explorado), e alongam seu olhar contemplativo para a universalidade de cada árvore, vertente, toca, rocha, habitat e multiexistência?

Interrogantes, com os olhos molhados pelas águas encantadas, nos cabe a proatividade necessária: “Com que braços podemos abraçar o rio Camaquã?”. À percepção cênica e valorativa do rio se impõe a preservação efetiva e urgente, que pode ser alavancada pelas seguintes medidas, entre outras:

  • aproximar respeitosamente as pessoas do rio para conhecê-lo sensível, emocional e racionalmente;
  • promover a educação/prática ambiental;
  • incrementar a pesquisa científica, particularmente sob o enfoque das mudanças climáticas;
  • sujeitar qualquer intervenção significativa à apreciação popular;
  • não adquirir produtos originados da degradação ambiental;
  • valorizar as comunidades locais e suas iniciativas;
  • ampliar as unidades de conservação;
  • institucionalizar a condição de “rio livre de barramentos”;
  • impulsionar o turismo hidrobacial preservacionista.

Abraçar o Camaquã nos convoca para a manutenção vigilante do rio, enquanto fluxo livre de intervenções nefastas, e para a convivência afetiva com suas águas e criaturas. Tanto o rio merece ser protegido quanto nós merecemos suas águas preservadas. Olhos e braços precisam se conjugar em atitudes intransferíveis. Todos devemos zelar pelas naturais “águas ligeiras”, referência nativa a “Icabaquã”. Os outros também somos nós, ao tempo que igualmente somos o rio.

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