Categories: Romar Beling

Certas coisas nunca mudam

A cada dia que passa ouve-se mais e mais anúncios do fim do mundo como o conhecemos e previsões da chegada de um mundo novo, como nunca se viu antes. Novas tecnologias (isso quando não é basicamente a expectativa das novas gerações) costumam inspirar tais entusiasmos. Prever, consultar bola de cristal e cartas faz parte da propensão do ser humano a (tentar) enxergar algo do futuro, a ter informação do que virá. 

Hoje, a bola de cristal e as cartas assumem a forma de uma tela, na qual muitos garantem vislumbrar o futuro. De certo modo, até aí nada mudou. A simples tentativa de alardear o que ainda não se pode ver (o que não existe porque é só hipótese, e talvez nunca existirá, porque seria concreto se de fato viesse a existir) só corrobora que ainda somos os mesmos, e vivemos, enfim…

Com o advento da internet, proliferam não só arautos como multiplicam-se as certezas. O mundo nunca mais será o mesmo, lê-se. Mas, cá entre nós, algum dia, propriamente dito, alguma vez já foi igual a outro? Só quem segue igual, exatamente igual (falho e iludido), é o ser humano, preso ao eterno presente, do qual jamais consegue se livrar. Diz-se que o mundo nunca mais será o mesmo, porque agora se tem um novo recurso. 

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Porém, quantas e quantas vezes terá sido dita frase similar. Descobriu-se a América, e o mundo nunca mais seria o mesmo. Inventou-se o avião, terminou a Primeira Guerra Mundial, depois Hitler foi derrotado, e a paz e o amor foram instaurados nos anos 1960; os Beatles atravessaram a faixa de segurança, o homem chegou à Lua!, esquentou a guerra fria, esfriou de novo, derrubou-se o muro de Berlim. Inventou-se o satélite, a TV a cabo, o celular, o drone, o carro sem motorista. Agora andamos com a cabeça em Marte, e o mundo nunca mais será o mesmo, afirmam.

No entanto, ano após ano, talvez uma única previsão nunca falha, nunca falhará: feliz ou infelizmente, sabe-se lá, o mundo seguirá exatamente o mesmo. Por questão muito simples: o que faria o mundo nunca mais ser o mesmo não é um invento. Mudam as tecnologias, muda até a forma de (tentar) olhar o futuro. Só não muda quem olha, quem tenta olhar: o ser humano, geração após geração, é sempre o mesmo. E não há nenhum indicativo (por mínimo que seja) de que isso vá mudar. Cada tempo garante que agora tudo será diferente, sem se dar conta de que, justamente por tal convicção, tudo segue exatamente igual.

Ah, se fosse tão fácil alterar a existência. Talvez, para o bem do futuro, para o bem do ser humano do futuro, compita aos de hoje cuidar mais e melhor do presente, e prestar mais atenção no passado do que naquilo que ainda não existe, para não prever sempre o óbvio. Assim deixaríamos em paz, menos ansioso e menos tenso, o ser humano do presente, menos pressionado a gastar o que nem tem para adquirir o que não precisa, nem vai precisar. 

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A vida é simples, e o que se precisa para viver bem também é muito, muito simples. Com menos previsão e menos ansiedade em torno da “chuva” de amanhã (para aproveitar o sol de hoje!), o mundo poderá girar mais sossegado. Que é tudo o que se poderia almejar. O mundo é (e será) o que sempre foi: imponderável.

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