A Justiça do Rio de Janeiro emitiu no último dia 17 uma decisão que impede a polícia de prender a advogada Margarete Santos de Brito e seu marido, Marcos Lins Langenbach, por plantarem maconha em casa. Eles cultivam a erva para usar no tratamento de sua filha Sofia de 7 anos, portadora da Síndrome de Rett, doença rara que causa convulsões frequentes, entre outras consequências.
Segundo o advogado autor do pedido à Justiça, foi a primeira decisão desse tipo emitida no Brasil. “Sofia têm convulsões desde que completou 45 dias de vida. Tentamos todo tipo de tratamento, sem o resultado esperado”, conta Margarete, de 44 anos. Sofia, que vai completar 8 anos no próximo dia 3, chegou a ser submetida a uma cirurgia para implantação de um aparelho estimulador do nervo vago, mas as convulsões continuaram.
“Em 2013, descobrimos uma menina americana que se tratava com extrato de maconha”, lembra Margarete. “Decidimos tentar esse tratamento e, em outubro daquele ano, importamos o produto. Era uma importação ilegal, claro, mas decidimos correr o risco, porque precisávamos testar.” O produto americano é industrializado, e logo o casal soube de um grupo carioca que usa a substância, extraída artesanalmente da planta. Aliando os produtos importado e artesanal, o tratamento finalmente deu resultados.
Publicidade
“O número de convulsões da Sofia diminuiu 60%, e o estado geral dela também melhorou”, comemora a mãe da criança. O casal tem outra filha, Bia, de 6 anos. A família informou ao neurologista que acompanhava Sofia sobre o novo tratamento dela. O médico também constatou a melhora da qualidade de vida da paciente, além de não identificar efeitos colaterais negativos.
CULTIVO
Margarete e o marido decidiram então adotar o tratamento e se aliaram a outras famílias que usam a maconha com fins medicinais para tentar conseguir o produto de forma lícita. “Pessoas que usam a droga de forma recreativa passaram a nos apoiar também. Para não estimular o tráfico, elas plantavam maconha em casa, e passaram a nos fornecer”, afirma a advogada. “Não basta ter a planta, tem que dominar o processo de transformação do material, e esse grupo sabia fazer isso.”
Publicidade
“No início deste ano, decidimos nós mesmos plantarmos a maconha, para não expor mais essas pessoas. Elas corriam risco de serem presas por nos ajudar”, afirma Margarete. “Então, começamos a cultivar em casa, e também aprendemos o processo de extração do produto. Desde então, junto com outras famílias, Margarete já fez duas colheitas da maconha, que renderam três litros do remédio usado por sua filha.
“Cada paciente reage de uma forma a essa medicação. Para alguns o tratamento não funciona; para outros, como a Sofia, é ótimo”, diz a advogada. A menina usa dez gotas do extrato, por via oral, a cada oito horas.
DECISÃO JUDICIAL
Publicidade
“Decidimos entrar na Justiça para garantir nosso direito de plantar a maconha, que usamos exclusivamente para o tratamento médico”, conta Margarete.
Em junho, ela e o marido ingressaram com ação na Justiça Federal pedindo o reconhecimento do direito de cultivar maconha em casa. Pediram uma liminar (decisão imediata provisória) autorizando o plantio, mas o juiz Maurício da Costa Souza, da 14ª Vara Federal Cível, não concedeu. Esse processo continua tramitando, aguardando perícias.
Em novembro, o casal recorreu então à Justiça Estadual, pedindo habeas corpus ao 1º Juizado Especial Criminal. No dia 17, a juíza Lídia Maria Sodré de Moraes concedeu a medida. O habeas corpus preventivo tem como alvos as Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro, personificadas em seus comandantes (o delegado Carlos Augusto Leba e o coronel Wolney Dias Ferreira, respectivamente).
Publicidade
“Concedo o salvo-conduto a fim de que as autoridades encarregadas sejam impedidas de proceder a prisão em flagrante dos pacientes pela produção artesanal de Cannabis sativa para fins medicinais, bem como fiquem impedidas de apreender os vegetais mencionados”, afirma o magistrado na decisão.
Ela vale até que seja emitida decisão definitiva no processo em trâmite na Justiça Federal. “Queremos incentivar outras famílias que enfrentam situação semelhante a também buscar amparo na Justiça”, diz Margarete.
Publicidade
This website uses cookies.