Com mais de 20 anos de carreira na Polícia Civil somente em Santa Cruz do Sul, o delegado regional da Polícia Civil do Vale do Rio Pardo, Luciano Menezes, ficou estarrecido com a violência empregada em homicídios na região. Os crimes deram início a uma intensa investigação e culminaram na Operação Tentáculos, deflagrada nesta quinta-feira, 10, em Rio Pardo, Santa Cruz do Sul, Canoas e nos presídios de Charqueadas e Ijuí.
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Um dos casos mais chocantes, segundo Menezes, envolveu a morte de um motorista de aplicativo, morador de Cruz Alta, cujo corpo foi encontrado há exatos três meses, no dia 10 de setembro, em Rio Pardo. Conforme o delegado, a brutalidade foi peça-chave do caso.
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“Um dos homicídios, mesmo que vários deles sejam bastante brutais, chamou bastante atenção. [Foi o caso] de um motorista de aplicativo, de Cruz Alta, que foi degolado, cortaram a cabeça dele ainda vivo – temos um vídeo disso, um ‘troço’ extremamente estarrecedor. Então para a gente, que já é policial bastante antigo, chama atenção a violência banal que é praticada por parte dessas pessoas, que são vinculadas a facções criminosas e que, por conta do lucro do tráfico, estão cometendo uma série de barbáries como se nada tivesse acontecido. E, como sempre, o comando destas ações está saindo de dentro dos presídios”, comentou.
A morte de Patrick Brum Dall Ongaro, de 30 anos, soma-se a outros 20 homicídios cometidos em Rio Pardo em 2020. O número, segundo Menezes, é atípico. “Praticamente todos esses homicídios são derivados de relações do narcotráfico, de facções, brigas entre eles, desajustes, traição, falta de pagamento. E é um fato inédito para a cidade, acho que no ano passado tivemos oito [homicídios] só. A investigação, que hoje culmina com a prisão dessas pessoas, é uma resposta da polícia, para dar um freio neste tipo de situação, que complica bastante a ordem pública.”
As ordens de morte, conforme Menezes, vêm de dentro dos presídios, razão pela qual também são cumpridas ações da operação em casas prisionais do Estado. “O comandante de pelo menos dez destes homicídios é um apenado de Santa Cruz, que manda matar de dentro da cadeia”, disse Menezes, ao citar que, apesar de o foco da operação ser Rio Pardo, outros municípios do Vale do Rio Pardo também têm repercussões, já que os criminosos não atuam apenas na Cidade Histórica.
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Além das ramificações, o delegado destacou que as prisões não tiveram início apenas nesta quinta-feira: “Nós prendemos nos últimos dias pelo menos três traficantes que são mandantes de crimes e são, digamos assim, membros da organização criminosa ‘dos andares de cima’. Um nós mandamos para Santa Catarina, outro prendemos na semana passada no Bairro Santa Vitória. E não são apenas os executores. Hoje foram [presos] muitos executores, muita gente que está no escalão inferior da facção. Mas é importante frisar que além destes executores dos homicídios e dos que operam com o tráfico, nós também conseguimos colocar na cadeia algumas lideranças.”
Segundo Menezes, esta é a resposta da polícia aos crimes cometidos na região. “Diante da nossa perspectiva, pelo menos vamos encerrar o ano um pouco melhor. Claro que a gente sabe que as lideranças presas continuam comandando, traficando, mandando matar de dentro do presídio, mas pelo menos a gente dá uma resposta social, dá uma embaraçada no organograma do crime”, declarou.
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“Sem dúvida alguma, hoje é um marco na história da polícia de Rio Pardo, porque além de tirar essas criaturas de circulação, e além de dar uma freada nos homicídios, [a ação] tem uma finalidade pedagógica para essas facções de saber que a polícia se reúne, que a polícia tem força, que a polícia vem com a função de responsabilizar e esclarecer os crimes. Então, como eu disse, dos 21 homicídios [do ano], pelo menos dez estão neste grupo, estão provados, comprovados, fatalmente [os responsáveis] serão condenados por esses homicídios”, comentou o delegado.
Elogios
O delegado também não poupou elogios às equipes que integram a ação, principalmente da Delegacia de Polícia de Rio Pardo, que encabeçou a operação. “O pessoal de Rio Pardo está de parabéns, se debruçaram sobre este trabalho, uma dedicação bastante qualificada, a prova já foi toda antecipadamente produzida, hoje é só o coroamento da operação, tanto que hoje não importa muito se a materialidade é apreendida ou não, o importante é colocar essas pessoas na cadeia”, disse.
Covid-19 atrapalhou os planos
Durante a ação desta quinta-feira, 10, são cumpridos 40 mandados de busca e 19 prisões. Conforme o delegado regional, Luciano Menezes, no entanto, o número seria maior se não houvesse a influência da Covid-19 na ação. “Nós tínhamos representado aqui em Rio Pardo por muito mais prisões, só que daí, por essa questão de Covid-19, lotação de presídio, tem que ter um olhar diferenciado. E a gente agradece muito ao Poder Judiciário e Ministério Público, que nos apoiaram nesta operação. Pretendíamos prender o dobro [de pessoas] que foram presas, mas infelizmente temos um problema de conjuntura hoje”, disse.
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Os mandados são cumpridos por 190 policiais civis (incluindo dez delegados), 60 agentes da Susepe e dez policiais militares. “Uma nuance da operação é a questão de reunir efetivo. Jamais conseguiríamos fazer 1/3 desta operação se não contássemos com o apoio de pessoas de outros municípios”, comentou Menezes.
“Temos gente de Pelotas, Caxias [do Sul], Flores da Cunha, da Região Carbonífera, tem gente de tudo que é parte do Estado. Cada um dá um pouquinho, até porque a Covid-19 também chegou na polícia, em quase todas as delegacias do Estado tem gente com Covid. Então é louvável que a gente possa contar com o apoio das pessoas, dos amigos. Semana que vem a gente viaja com 40 policiais para outra região, então vamos nos virando, vamos fazendo o que dá”, destacou.
A procura por corpos
O delegado ainda comentou, durante esta manhã, sobre a ação realizada em uma casa do Bairro de Ramiz Galvão, em Rio Pardo. Com duas equipes, o delegado Anderson Faturi comanda uma das ramificações da megaoperação Tentáculos, na procura por corpos.
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“E, agora, nós temos a expectativa sobre o delegado Anderson, que está com duas equipes com uma retroescavadeira no local, porque estamos atrás de dois corpos [de pessoas] que desapareceram, sumiram, mas a gente sabe que foram mortos. Em princípio foram enterrados nesta propriedade. Então, talvez, no andar da manhã tenhamos uma informação positiva no sentido de localizar a ossada dessas duas pessoas que estão desaparecidas”, finalizou Menezes.
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A entrevista com o delegado regional foi realizada pelo jornalista Cristiano Silva, durante a ação, em Rio Pardo.