A menina carioca de 8 anos que começou a dançar balé em um projeto social nem poderia imaginar aonde suas sapatilhas de ponta a iriam levar. Ingrid Silva nasceu em Benfica, no Rio de Janeiro, e fez da arte sua profissão. Estudou na Escola de Dança Maria Olenewa e no Centro de Movimento Deborah Colker com bolsa integral. Aos 17 anos, juntou-se ao Grupo Corpo como estagiária. Em 2007 ganhou uma bolsa de estudos para o Dance Theatre of Harlem School, em Nova York, e logo se juntou à companhia.
De lá pra cá, a brasileira de apenas 29 anos se tornou a primeira bailarina do Dance Theatre of Harlem (DTH), primeira companhia clássica do mundo para negros. Hoje em dia, casada com o santa-cruzense Luis Fernando Brixner e morando em Nova York, onde os dois são os “pais” de uma buldogue francesa chamada Frida Kahlo, Ingrid excursiona com os espetáculos, realiza campanhas publicitárias e dá aulas de balé. No entanto, a rotina continua sendo pesada: são sete horas de ensaio diariamente. O reconhecimento começou a vir aos poucos, enquanto ela ganhava visibilidade por seu talento, com reportagens no Globo Repórter, Folha de São Paulo e nas revistas Vogue, Glamour e Claudia. A brasileira já foi embaixadora cultural para os Estados Unidos e levou workshops à Jamaica, Honduras e Israel. Também teve sua história retratada em um curta-metragem dirigido por Ben Briand.
Mas chegar lá não foi todo esse glamour. Com 18 anos, quando desembarcou em Nova York, Ingrid não falava inglês e não estava preparada para o clima gelado da cidade, acostumada com o calor do Rio de Janeiro, e precisou se virar com doações. Na companhia, ela já não era mais a única dançarina negra e precisou se dedicar para se destacar. Até ganhar mais visibilidade e dançar em papéis principais e solos, chegou a ser cuidadora de cachorros, babá e trabalhou em eventos.
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Tudo isso, enfrentando as dificuldades de uma carreira altamente competitiva e carregando com orgulho suas bandeiras de mulher negra e brasileira. Hoje, a artista é considerada uma das bailarinas mais importantes do mundo e usa sua posição como plataforma de empoderamento e representatividade. Em entrevista ao Magazine, ela contou sobre sua carreira, projetos e sua relação com Santa Cruz do Sul, cidade do marido.
Ingrid Silva
Bailarina
Magazine – Como você vê esse crescimento do seu reconhecimento ao longo dos últimos anos?
Ingrid – Bom, eu já moro em Nova York há 11 anos e tenho uma longa carreira por aqui. Em breve a companhia estará indo para o Brasil, estaremos dançando em São Paulo e Trancoso em outubro. Estou muito feliz! A cada trabalho que faço tenho muita gratidão pelo reconhecimento do público, que é muito importante. Definitivamente, mais brasileiros estão conhecendo meu trabalho nos últimos anos.
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Magazine – Você se vê como uma figura de representatividade para meninas brasileiras que sonham em ser bailarinas?
Ingrid – Sim, com certeza. Acho que é uma responsabilidade muito grande. Porque sou uma inspiração também para muitas crianças que conhecem a minha história ou me veem dançando. É sempre importante lembrar que quando eu comecei, não tinha visto alguém no mundo da dança que me representasse. Hoje em dia tem mais diversidade, mas ainda é importante ressaltar que mais oportunidades precisam ser dadas, para que mais crianças tenham a chance de se ver.
Magazine – O que podemos esperar da sua carreira em 2019 e nos próximos anos?
Ingrid – Espero poder continuar fazendo a diferença através da arte e dar aula no mundo todo, em especial lugares aonde não se tem acesso. Fazer eventos do EmpowHer New York no Brasil. E o futuro está bem promissor, prefiro deixar as portas abertas para que mais oportunidades cheguem até mim.
Fundada em Dezembro de 2018 por Ingrid Silva, EmpowHer New York é uma plataforma colaborativa criada para dar voz às mulheres reais e suas questões. “No perfil, mostramos a rotina de diferentes personagens inspiradoras num formato ‘#EmpowHerNYTakeOver’, sempre com o intuito de conectar e ajudar mulheres. “
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“Sempre fui muito conectada em conversar com mulheres, saber suas histórias, e tive o intuito de criar essa plataforma original no Instagram, que hoje em dia já conecta mais de 10 mil mulheres.” O Instagram acaba sendo um local de voz ativa para a bailarina, já que seu perfil pessoal na rede conta com mais de 90 mil seguidores.
Primeira-bailarina do Dance Theater of Harlem, Ingrid Silva conta que só percebeu claramente a desigualdade racial nas salas de balé no Brasil ao chegar aos EUA e visitar uma companhia de dança multiétnica em Nova York. Além da sub-representação, os dançarinos negros ainda precisam lidar com o peso dos estereótipos. Em um mundo de cabelos alisados, manter suas mechas crespas foi um ato de ousadia para Ingrid. Deixar de alisar os fios e passar pela transição capilar a transformou em referência, já que uma bailarina clássica com um black power surpreende e encanta.
O mercado de produtos para balé começa a mudar e abraçar a diversidade dos artistas: em 2018, pela primeira vez marcas de sapatilhas lançaram peças com outros tons de pele. “Faz 11 anos que pinto a sapatilha. Bailarinos negros existem há muito tempo. A marca que acabou de lançar a sapatilha não foi a primeira a criar uma com a cor da pele – a Gaynor Minden foi uma das primeiras, quando lançou três tonalidades. Mas não temos apenas três cores e nem todo mundo usa o mesmo modelo. Essa duas marcas, Gaynor e Freed, criaram as tonalidades da sapatilha e eu não uso nenhuma das duas.”
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Sobre sua vinda à cidade natal de Luis Fernando, a bailarina lembra que achou Santa Cruz do Sul muito calma. “Minha última visita foi em maio de 2016, fui passar férias com a família Brixner, família do meu marido. Ir para uma cidade como esta é sempre bom, e eu adoro a culinária gaúcha.” Aliás, entre os locais favoritos de Ingrid na cidade estão aqueles cheios de delícias, como os cafés coloniais, o Sorella Café e o restaurante Amélia. Ela ainda conta que adorou o Parque da Gruta. “Tenho um carinho muito grande por essa cidade.” Quando esteve por aqui, ela deu aulas para uma turma de ginástica rítmica do Colégio Mauá e no Balance Studio de Danças.
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