O número de atendimentos do Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e outras Drogas (Caps AD III) de Santa Cruz do Sul aumenta a cada ano. Os registros no sistema eletrônico a partir de 2015 deixam evidente esse crescimento: foram 23.165 atendimentos em 2015, 24.850 em 2016 e 25.157 em 2017 (até 19 de dezembro). O serviço de atenção especializada da Secretaria de Saúde entrou em funcionamento em 2014, com acolhimento 24 horas, e vem demonstrando sua necessidade de acordo com os dados.
Diferentes atividades são desenvolvidas para tratamento de quem busca auxílio. E cada vez mais pessoas estão buscando tratamento, segundo a coordenadora, Tais Giordani Pereira, principalmente pelo uso de bebida associado a drogas como crack, cocaína e maconha. O Caps AD III é destinado a pessoas maiores de 18 anos, que estão em sofrimento em decorrência do uso problemático de álcool e outras drogas.
Conforme a coordenadora técnica de Saúde Mental do município, Anelise Aprato, a implantação desse centro foi solicitada pela administração municipal devido ao considerável aumento do número de usuários de álcool e drogas e ao número de pacientes na lista de espera por internação hospitalar. Anelise observa que o Caps surgiu para atenção integral ao usuário de saúde mental. “Hoje a espera por internação não passa de uma semana”, afirma Tais.
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No acolhimento diurno, os pacientes são encaminhados a oficinas, grupos terapêuticos, atendimento médico e fazem refeições. Os que necessitam podem ficar no acolhimento noturno por até 14 dias. À noite, o Caps AD III conta com sete vagas para pessoas do sexo masculino e três para o sexo feminino. A estrutura tem capacidade para atender 15 pessoas por dia, uma parte no tratamento diurno e outra no noturno.
Acolhimento
Localizado na Rua Marechal Floriano, 1592, o Caps tem acesso livre, ou seja, a pessoa que precisa dos seus serviços pode ir direto em sua sede ou primeiro passar pela rede básica de saúde. Atualmente, 690 pacientes frequentam regularmente o centro, pelo qual já passaram 1.975 pessoas com atendimento frequente, segundo a coordenadora administrativa de saúde mental, Juliana Schenkel. Ao chegar, a pessoa é atendida por um profissional que faz o acolhimento. A partir dessa entrevista, define-se um plano de cuidado para ela. O plano é específico para cada paciente e é elaborado com a participação dele.
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Grupos ajudam usuários a enfrentar vício
O Caps AD III oferece atendimento médico (com clínico e psiquiatra) e psicológico individual e em grupo. O tratamento também inclui oficinas de atividades físicas, de artesanato e geração de renda, nas quais os frequentadores aprendem algo novo ao mesmo tempo em que são acompanhados por profissionais. Outra ferramenta utilizada no centro são os Grupos Terapêuticos, formados por pacientes com problemas comuns.
Os Grupos Terapêuticos são coordenados por um profissional facilitador que trabalha o redirecionamento da vida dos que frequentam o Caps. Neles, os pacientes conversam sobre a vida e seus problemas e avaliam alternativas de melhor enfrentamento da situação que vivem. O atendimento pode ser não intensivo, quando a pessoa vai duas ou três vezes por mês ao centro; semi-intensivo, quando ela frequenta o espaço até três dias por semana; ou intensivo, situação em que o paciente procura os serviços mais de três dias por semana.
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Na chegada ao centro, os casos graves são encaminhados primeiro para desintoxicação, enquanto os leves e moderados vão para o acolhimento. O acesso ao serviço é livre, mas o ideal, de acordo com Tais Pereira, é que o paciente usuário do SUS tenha a base do atendimento no seu território, onde estão concentradas as informações a seu respeito. O horário de atendimento do Caps AD III ao público é das 7 às 19 horas, de segunda a sexta-feira. A equipe também presta orientações e informações pelo telefone (51) 3713 3103.
Estrutura
Para prestar esse atendimento aos pacientes, a estrutura física do Caps AD III conta com uma sala de grupo, recepção, sala de enfermagem, sala de acolhimento, dois consultórios médicos, um quarto feminino com três camas, um quarto masculino com sete leitos, uma sala de oficinas, sala de equipe, sala de coordenação, cozinha e refeitório, mais uma quadra de esportes.
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A equipe técnica é formada por sete técnicas de enfermagem, seis enfermeiros, uma terapeuta ocupacional, um vigilante, quatro médicos, dois estagiários na recepção, um educador físico, um assistente social, um motorista, uma nutricionista, três psicólogas e uma servente.
Na luta para vencer o álcool
O uso de bebida alcoólica foi o que levou Renivaldo* a buscar ajuda no Caps AD III, há cerca de três anos. Foi nesse órgão que ele conseguiu se fortalecer e encontrar a segurança necessária para deixar a bebida alcoólica e começar a melhorar sua vida. Agora, está sem beber há dois anos e dois meses. Porém, até buscar ajuda, perdeu seu patrimônio, a esposa, filhos, casa, carro e até a credibilidade. “Cheguei numa situação que nem eu me aguentava. Um dia tirei um amigo da cama para conversar porque estava me sentindo perdido. Não sabia mais o que fazer para me livrar do álcool”, relata.
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Renivaldo observa que o alcoolismo “é uma doença progressiva, que termina com a pessoa”. Ele começou a beber aos 15 anos, quando o pai ofereceu-lhe uma cerveja, que passou a ser sua “droga preferida”. No início, consumia só nos fins de semana, pelos quais esperava ansioso – não para se divertir, mas para beber. Depois casou e “com a rotina do casamento, a sede foi aumentando”. Quando a esposa percebeu a situação, passou a pedir que ele deixasse o vício. Mas ele continuava bebendo escondido. A dependência se tornou maior após ele passar dos 35 anos de idade.
Ele tinha uma empresa em Santa Cruz e chegou a abrir uma filial em outra cidade, para poder usar bebida livremente. Também montou uma firma de realização de serviços em festas para estar num meio favorável para seu vício. “Passava dia e noite bebendo. Já acordava pensando em beber. A esposa quis me levar no AA (Alcoólicos Anônimos). Ela foi e eu não fui”, conta. “A gente mente, engana. Diz que está num lugar quando está em outro. As pessoas nos dão chances e não aproveitamos”, acrescenta.
Renivaldo hoje mora num quarto alugado e tem uma só empresa. Está trabalhando e frequentando as reuniões de grupo do Caps AD III. Deseja voltar a ter uma casa própria, conquistar novos clientes para sua empresa e “tocar a vida”, sem esquecer que “é um dependente e tem que evitar o primeiro gole”. Conforme ele, o álcool o estava destruindo e sozinho não teria conseguido parar. A troca de experiência nos grupos do Caps e o acompanhamento dos profissionais que nele atuam, mais a fé, são fundamentais, segundo Renivaldo.
* Nome fictício.