Diante de tantas histórias tristes e trágicas causadas pela Covid-19, é sempre válido contar as que se destacam pelo oposto: a superação. É o caso do vera-cruzense Kelver da Silva, de 27 anos, que contraiu a doença ainda em abril e passou 101 dias internado na UTI do Hospital Santa Cruz (HSC), tornando-se o paciente que permaneceu por mais tempo na terapia intensiva da instituição. Agora, ele está em um leito clínico e já iniciou o tratamento com uma equipe multidisciplinar para se recuperar das sequelas.
Conforme a esposa de Kelver, Taís Pereira da Silva, ele foi diagnosticado com a doença e permaneceu em isolamento
domiciliar por cerca de dez dias, quando começou a apresentar rouquidão. Durante uma consulta médica foi verificado que sua saturação (quantidade de oxigênio no sangue) estava em 85%, número já considerado preocupante. Ele foi então internado no Hospital Vera Cruz e, no dia seguinte, diante de uma saturação de 65%, foi transferido para a UTI do HSC, onde permaneceria longos meses.
Ainda com dificuldades para falar e respirar, Kelver conta que nos primeiros 16 dias ficou por todo o tempo com dependência de alto fluxo de oxigênio. Ainda assim, a saturação não dava sinais de melhora e a equipe médica já trabalhava com a possibilidade de intubação, o que acabou se concretizando. “Eu me lembro da madrugada antes de ser intubado. Eu acordei para tomar a medicação e a saturação estava muito baixa, nem o oxigênio adiantava mais.”
Publicidade
Após a intubação, que durou 20 dias, Taís conta que o estado de saúde do marido piorou muito, com perda acentuada de peso e diversas outras complicações. “Ele teve infecção pelo acesso, contraiu uma bactéria, teve um sangramento grave na boca em função do tubo e que se agravou com o anticoagulante que havia sido administrado para prevenir a trombose”, relata. Em decorrência da hemorragia, Kelver chegou a precisar de uma transfusão de sangue.
Apesar de todas as dificuldades, Kelver não perdeu as funções neurológicas e nem desenvolveu complicações em outros órgãos, como coração e rins, comuns em pacientes críticos. Após a retirada do tubo, iniciaram os testes de respiração espontânea, com o objetivo de verificar a capacidade dos pulmões, para a retirada do suprimento de oxigênio. Kelver teve ótimos resultados. “O primeiro teste deveria durar de dois a cinco minutos, e ele conseguiu permanecer por 40 minutos”, comentou a esposa. A partir daí, a melhora foi significativa, até a saída da UTI.
Ao comentar sobre como foi passar por tudo isso, Taís destaca principalmente as dúvidas. “Era incerto se o Kelver ia se lembrar da vida dele, se ia recuperar todos os movimentos. A equipe médica sempre teve muitas dúvidas, e tudo isso sempre foi passado para mim”, revela. “Além de conviver com o medo de perder alguém que a gente ama, ainda tem o medo de saber como a pessoa vai voltar.” Após esse período de angústia, Taís e Kelver se consideram vitoriosos e mantêm a fé na plena recuperação.
Publicidade
Agradecimento
Como mensagem para pessoas e famílias que passam pela mesma situação, Kelver diz que é preciso acreditar e dar valor à vida e às pequenas coisas do dia a dia. “Tem que ter muita fé acima de tudo, tem que acreditar. A gente colhe aquilo que planta, e aqui no hospital, com certeza, estou colhendo um carinho enorme do pessoal. Nesses 101 dias eu aprendi muito com a equipe médica. A gente aprende a dar valor às menores coisas. Eu tinha vontade de beber água e não podia. Quando pude tomar o meu primeiro copo de água, foi a melhor sensação do mundo. Você tem noção do que é ver a água e não poder beber? Dias e dias com o aparelho, foi muito difícil”, afirma.
Médica comemora a melhora e destaca empenho da equipe
A médica intensivista Adriana Girardi, uma das profissionais que atua na UTI do HSC e acompanhou diariamente o tratamento de Kelver, destaca a colaboração do paciente. “Ele sempre foi muito colaborativo, fazia tudo o que a equipe pedia, mas mesmo assim começou a deteriorar muito do ponto de vista ventilatório”, conta. Segundo ela, por vários momentos os médicos chegaram a pensar que o tratamento não daria certo, em razão do comprometimento pulmonar avançado.
Adriana explica que a recuperação é realmente muito lenta e não há alternativa. “Não adianta a gente querer acelerar, é um processo lento e nós nunca sabemos se vai haver melhora, mas se houver, acelerando nós só perdemos”, salienta. A médica também comemora a saída da UTI. “Para nós é muito gratificante, foi uma luta diária e foram dias bem difíceis.”
Publicidade
As sequelas restantes, segundo Adriana, nada tem a ver com a Covid-19 e devem demorar para passar. “Isso são sequelas de doença crítica. Qualquer paciente que fique acamado por muito tempo, em ventilação e sedado por muito tempo, vai desenvolver esses danos de doença crítica crônica”, destaca. A partir de agora, Kelver segue sob os cuidados no leito clínico e também em tratamento com a equipe multidisciplinar do HSC, com destaque para a fisioterapia e fonoaudiologia. “Para perder é muito rápido, mas para ganhar demora. Provavelmente para ele voltar a ser como era antes não serão dias nem semanas, mas meses”, diz a médica intensivista.
LEIA MAIS: ACOMPANHE A COBERTURA COMPLETA SOBRE O CORONAVÍRUS
Publicidade