Um grande ator brasileiro esteve em Santa Cruz do Sul há poucos dias. Com uma trajetória de décadas no cinema e na televisão, Sirmar Antunes veio prestigiar a exposição Pretos na Tela, encerrada nessa quinta-feira na Casa das Artes Regina Simonis. A mostra da fotógrafa e jornalista Dulce Helfer trouxe imagens de atores e atrizes negros, captadas em gravações de filmes do diretor Tabajara Ruas: Netto e o Domador de Cavalos, Os Senhores da Guerra e A Cabeça de Gumercindo Saraiva.
Um dos fotografados é o próprio Antunes, gaúcho de Medianeira, 65 anos. Talvez você não lembre, mas ele também atuou em produções da Globo, como a minissérie A Casa das Sete Mulheres. O ator concedeu entrevista ao jornalista Marcio Souza, da Gazeta do Sul, publicada na edição dessa quarta-feira. E não deixou de falar sobre representatividade, um assunto que nunca é “batido” quando se trata do Brasil.
“Somos 57% da população e não vemos 20% na mídia. Só vai ter a cara do Brasil quando tivermos mais negros, os povos representados, os indígenas, os alemães, os italianos, todos os povos que compõem esse País, que é continental e multiétnico, representados no cinema, na televisão. Ainda não somos protagonistas das nossas histórias”, afirma Antunes.
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A invisibilidade ou subalternidade do negro não é só um discurso. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes a 2018, mostram que trabalhadores brancos receberam, em média, 75% a mais do que negros e pardos. Quanto mais se avança na hierarquia de cargos e salários, mais se percebe que mérito e sucesso têm cor. Exceções há, mas o racismo é um fato e pode ser obstáculo na busca de melhores oportunidades profissionais e de ascensão social. Alguns dirão que tudo é exagero, nada disso existe. Mas não faltam estudos, números e argumentos para demonstrar o contrário.
Em abril deste ano, o instituto PoderData realizou pesquisa sobre racismo, com 2.500 entrevistas feitas em 482 municípios do Brasil, por telefone. Uma das questões era: “Você tem preconceito contra negros?”. Nada menos do que 38% – sim, 38% – dos entrevistados responderam “sim”. É um número maior do que o apontado no levantamento anterior, de novembro de 2020, quando 34% se reconheceram como racistas. Ao mesmo tempo, os que alegaram não ter preconceito contra negros, em abril, foram 51%. Aqui, o que houve foi uma queda: essas pessoas eram 57% na pesquisa do ano passado.
Então, nem a velha máxima de que o racismo brasileiro é “velado” ou disfarçado, meio constrangido, envergonhado, está se sustentando. Com certa frequência, ele é explícito e até orgulhoso de si. Se você não confiar na credibilidade do PoderData, há outras fontes. Exemplo: a pesquisa do Instituto Locomotiva, feita a pedido da rede de supermercados Carrefour, também neste ano. Ela traz várias informações. Não há espaço para entrar em detalhes aqui. Mas vale lembrar que em novembro de 2020, em uma unidade do Carrefour em Porto Alegre, dois seguranças mataram um cliente negro.
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É por isso, então, que Sirmar Antunes deve falar mesmo sobre representatividade, ele e nós todos. O Brasil é multiétnico, não há “pureza”, somente misturas que o conformam. Como dizia o antropólogo Claude Lévi-Strauss: “Uma nota musical não tem significado em si mesma, é apenas uma nota. É só pela combinação delas que se pode criar música”.
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