Julho tem cara de férias. Para os mais afortunados, férias com viagem. Lucy e Angela, por exemplo, pegaram uma semana inteira de sol e água-de-coco no Nordeste. Ana foi mais longe: Áustria, Suíça e Alemanha. “Voltei energizada”, conta uma. “Voltei renovada”, garante outra. Enquanto minhas amigas aproveitavam o merecido descanso, fiquei por aqui vendo o sol cair sobre os morros nesse inverno que mais parece um verão. Ontem, após ler a enésima notícia sobre o aquecimento global e o fato de julho ter sido o mês mais quente da história, decretei:
– Maurício, nós também vamos viajar. Antes que o mundo acabe.
Sou do tipo preocupada. Ambientalmente preocupada. Há uns 40 anos, no mínimo. Mas, perdoem minha ingenuidade, sempre achei que o bom senso prevaleceria e evitaríamos o pior. Otimista, jurava que não seríamos tão insanos a ponto de levar a situação ao insustentável. E que realmente o planeta só desapareceria daqui a 5 bilhões de anos, quando o Sol engolir a Terra. Muito antes, eu afirmava, já estaremos habitando outro lugar tão lindo quanto este.
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Era o que eu pensava. Até esse julho de 2023 e suas previsões sombrias. Vai piorar, dizem os cientistas. E quem sou eu para duvidar deles? Agora, me pego calculando: quando será? Em 50, 100 anos? E se for menos? E se nem der tempo de eu partir do modo tradicional? Inquieto-me. Se há uma probabilidade de boa parte dos seres vivos se extinguir, incluindo homens, mulheres, gatos, cachorros, laranjeiras e ipês e lagartixas e moscas, eu não devo começar a fazer o que tenho para fazer mais ou menos logo?
Olho para o teclado e me pergunto: o que é fundamental, para essa pessoinha que sou eu, antes de o mundo acabar? A primeira coisa que me ocorre: ficar mais perto daqueles que amo. Nem será preciso falar muito ou explicar. Apenas ficar junto. Tomar mate, sentir o cheiro da chuva, lembrar a infância, comer bolo de milho.
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Logo a seguir me vem a ideia de que devo resgatar alguns laços perdidos. Amizades profundas que perdi, promessas que não cumpri. Um rol de palavras e rostos esquecidos afloram.
E então sou tomada pela urgência. Quero voltar a São Gabriel. Quero voltar a Pelotas. Quero encontrar Machado de Assis no Centro do Rio mais uma vez. E quero retornar a Roma. Porque dizem que Roma é eterna. E porque lá está O Êxtase de Santa Teresa – o humano e o divino eternizados na pedra pelas mãos de Bernini. Diante da escultura, tentarei puxar conversa com outros turistas. “Somos capazes de obras magníficas, o senhor não acha?” Sairei da igreja otimista. Quem sabe os deuses, comovidos com toda a beleza que nós, seres defeituosos, conseguimos criar, nos perdoem os erros e nos livrem do infortúnio.
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