A Associação dos Amigos do Cinema de Santa Cruz do Sul promove em suas duas próximas sessões – nesta terça, 19, e na outra terça-feira, dia 26 – um pequeno ciclo com dois filmes (comentados!) do diretor russo Andrei Tarkovsky. As exibições acontecem sempre a partir das 20 horas, na sede do Sindicato dos Bancários (Sindibancários, na Rua Sete de Setembro, 489), com entrada franca.
O primeiro filme é Nostalgia, de 1983, e quem vai comentá-lo é a professora Eunice Piazza Gai, da Unisc. Narra a jornada mística do poeta russo Andrei Gorchakov à Itália em busca de um novo modo de vida. É, também, o primeiro filme de Tar-kovsky feito fora da Rússia. Recebeu três premiações no Festival de Cannes, em 1983: melhor diretor, prêmio do júri ecumênico e prêmio Fipresci. Foi indicado para a Palma de Ouro.
Pois bem, depois de três meses, viajando em companhia de Eugenia, uma atriz italiana, Gorchacov chega a um pequeno vilarejo ao norte da Itália. Frustrado e deprimido por ainda não ter encontrado seu caminho, ele mergulha em seu passado, isolando-se em impenetrável silêncio. Mas ao encontrar Domenico (interpretado por Erland Josephson, de Gritos e Sussurros), um velho lunático, assim chamado por seu estranho e solitário modo de viver, ele consegue compreender sua angústia e o segredo de sua própria Nostalgia.
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Leitor de Proust, Tarkovsky fez do tempo o motivo principal de sua obra. Uma obra compacta, como se sabe, de apenas sete longas-metragens, que pode ser vista como sólida meditação sobre o tempo, e a memória. Mas quando dizemos “motivo” não queremos dizer que o tempo seja tema de Tarkovsky. Pelo contrário, ele é como uma argamassa, não nomeada, que dá liga e estrutura aos diversos elementos temáticos de que essa obra se compõe.
Da guerra (A Infância de Ivan) à biografia de um pintor de ícones (Andrei Rublev) e à quase autobiografia (O Espelho), passando pelos dois títulos de ficção científica (Solaris e Stalker – o filme da outra terça-feira, com comentários de Ernesto Söhnle Júnior), até seus dois testamentos poéticos, feitos no exílio (este Nostalgia e O Sacrifício), vários são os temas e referências. O tempo os unifica e confere à obra sua assinatura autoral.
Nostalgia foi feito na Itália. O tempo é o elemento central. Fala dessa jornada mística de um poeta russo à Itália. Pouco importa e não interessa se as referências proliferem. É sempre o tempo que estrutura e dissolve. O tempo que devora as coisas (tempus edax rerum, de Ovídio); o tempo que conhecemos bem, exceto quando tentamos defini-lo, como diz Santo Agostinho; o tempo, “terrível e exigente problema, o mais vital da metafísica”, de que falava Borges na História da eternidade. E, por falar nele, Andrei Tarkovsky era de um tempo em que o cinema podia, às vezes, ombrear-se com o pensamento de ponta da filosofia.
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