Alline Angeli Gonçalves tinha apenas 6 anos quando ouviu pela primeira vez que deveria ser atriz. Na época, a menina nem sabia o que a palavra queria dizer, só que era alguém que trabalhava na televisão, e gostou da sugestão. A cena dentro de um ônibus com a família a caminho de uma quermesse ficou gravada na memória, e acabou se tornando a primeira semente de uma vontade que ficou latente durante três décadas. Hoje, aos 37 anos, ela é atriz formada pela Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), no Rio de Janeiro, cidade onde reside há 7 anos.
Entretanto, a jornada até realizar o sonho de ser atriz não foi fácil. Nascida em Sobradinho, ela viveu até os 5 anos no interior de Ibarama, onde agora existe a barragem da Usina Hidrelétrica Dona Francisca. A vida era simples, sem saneamento básico e sem energia elétrica, mas com um coração cheio de sonhos. “A criança do interior tem que ter uma criatividade muito grande, porque não tem televisão pra entreter, muito menos celular e internet. As nossas brincadeiras nós mesmos que tínhamos que inventar. Tem que ser criativa quando tem pouco, ainda mais eu, no interior e que ainda era muito pobre”, conta.
A única televisão a que a menina tinha acesso na infância ficava na casa de uma tia-avó e, para assistir, ela precisava caminhar sozinha e no escuro, atravessando uma lavoura de tabaco com apenas um liquinho para iluminar o caminho. “Eu adorava ver a chamada do Jornal Nacional, aquilo pra mim era incrível. Era muito longe e eu ia só para ver um pouquinho de televisão. Deixava até de brincar com as outras crianças para assistir.” Alline conta que nesta época entendeu que era aquilo que queria fazer, estar na televisão, e essa vontade ficou no inconsciente.
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Após se mudar para Santa Cruz do Sul, Alline Angeli teve sua primeira experiência profissional aos 8 anos de idade. A mãe trabalhava numa loja e fazia pães, que a filha saía para vender de porta em porta. À primeira experiência com as vendas ela atribui sua desenvoltura desde cedo, já que não costumava aceitar o não, convencendo os clientes a provar as iguarias feitas pela mãe. “Eu e a minha mãe sempre fomos muito sozinhas na parte financeira, conseguimos construir a nossa casa própria com isso.” Aos 12 anos, ela enfrentou a dor de perder o irmão caçula, de 4 anos, em um acidente. Como costumava cuidar dele, a adolescente procurou um emprego que lhe permitisse trabalhar fora para não ficar sozinha em casa com as lembranças do irmão.
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Aos 13 anos, Alline passou a trabalhar no salão de beleza da madrinha, atuando como recepcionista e limpando o ambiente. Ela até pensou em fingir que era muda, pela vergonha de conversar, mas confessa que a farsa não durou dois segundos e, diante da chegada da primeira cliente, já estava tagarelando. “Quando saí do interior, me desenvolvi muito rápido aqui. Eu era um bicho do mato, tinha medo de tudo e o trabalho me ajudou muito”, recorda. Ela trabalhou no local até os 17 anos, quando foi morar sozinha em Porto Alegre com o objetivo de estudar Artes Cênicas. A vontade de ser atriz ainda existia, mas por já trabalhar na área ela optou por um curso de Esteticista.
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De volta a Santa Cruz do Sul, ela manteve uma loja com a mãe e começou a cursar Jornalismo na Unisc. O contato com as câmeras durante as aulas reacendeu mais uma vez a vontade de trabalhar com a televisão. Desmotivada, ela desistiu do curso, mas descobriu uma escola de teatro na cidade e teve as primeiras experiências como atriz. Foi numa das montagens feitas pelo grupo que Allline conheceu a atriz e diretora Duda Seffrin, com quem manteve contato e recebeu inúmeros convites para ir ao Rio de Janeiro. Insatisfeita com o trabalho aqui, ela pediu ajuda a uma prima para comprar a passagem de avião e foi para a capital carioca com a intenção de passar apenas 10 dias de férias, em 2014.
No Rio, surgiram oportunidades para participar do elenco de apoio da novela Império, da Globo, e da série As Canalhas, da GNT. Preocupada com os compromissos profissionais que estava assumindo, Alline ligou para a prima Cristiane para saber para quando era sua passagem de volta. Ela havia comprado apenas a passagem de ida, por acreditar na carreira que a prima estava começando. Assim, foi aos 30 anos que Alline Angeli viveu uma virada em sua vida e começou a realizar aquele sonho da infância de estar na televisão. “Ali, nunca mais voltei. Fui pra passar 10 dias de férias e estou há quase 8 anos.”
A sobradinhense deixou a vida para trás no Vale do Rio Pardo, vendeu o carro e decidiu investir todo o seu capital para estudar um semestre na prestigiada CAL. A faculdade tem uma mensalidade alta, e além do aluguel a estudante precisava pegar dois ônibus todos os dias para assistir às aulas. O tempo de deslocamento não permitia que Alline aceitasse trabalhos. Foi quando surgiu a oportunidade de ser a acompanhante de uma jovem com deficiência auditiva, que também é atriz, e ela pôde deixar de pagar aluguel, fazer as refeições e morar mais parto da escola. Após o primeiro semestre, o desempenho acima da média e um prêmio de melhor atriz garantiram a Alline uma bolsa de estudos para a conclusão do curso, com 4 anos e meio de duração.
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Para Alline Angeli, as palavras que definem sua trajetória são superar, acreditar e persistir, ou como ela gosta de dizer, teimosia mesmo. “Eu sou uma menina lá do interior que tinha os dentes cariados e só sabia falar alemão, sofri bullying quando vim para a cidade por falar errado. Tudo é possível, todas as pessoas, indiferente da classe social, podem ir aonde querem”, relata. Para ela, a busca pelo conhecimento e pela carreira desejada trouxe uma felicidade mais completa, mas ela adverte que se deve evitar glamourizar a profissão de atriz, pois exige muito trabalho duro, dedicação e estudo.
Segundo Alline, os maiores obstáculos nessa jornada estavam em sua cabeça, como o medo de ter começado tarde demais e ser prejudicada pela idade. No entanto, ela seguiu em frente aceitando muitos desafios, atuando no teatro, na televisão e no cinema. Um dos desejos da artista é explorar também a direção, já que teve boas experiências auxiliando colegas na direção de cenas na CAL. Alline não descarta ainda mudar de carreira novamente e planeja cursar Direito.
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Novos projetos
Além de manter trabalhos como atriz e com publicidade, Alline Angeli trabalha atualmente em novos projetos. Um deles é a série O Anjo de Hamburgo, produção da Sony Pictures com direção de Jayme Monjardim. Na produção inspirada numa história real da Segunda Guerra Mundial, a atriz faz uma participação no papel de Eva Braun, esposa de Adolf Hitler. As gravações ocorreram em abril e a obra ainda não tem data de estreia marcada.
Outra novidade de Alline é um projeto muito ligado às suas origens no Vale do Rio Pardo, o curta-metragem Sacro Lavouro, que será estrelado por ela ao lado do ator Marcelo Gonçalves, sob direção de Diego Muller. O filme está em fase de captação de recursos, com gravações previstas para acontecer no interior de Santa Cruz do Sul em dezembro. Acompanhe as novidades na carreira da artista pelo Facebook ou no perfil @allineangeli no Instagram.
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Profissão como herança familiar
Numa das ocasiões em que a carreira no Rio de Janeiro estava difícil, Alline voltou para casa para visitar a família. Foi nesta visita que ela descobriu, por acaso, que o avô havia sido ator de teatro e, inclusive, se apresentado no Festival de Teatro de Curitiba. “Sempre peço sinais ao universo. Eu estava mal mesmo, daí vim para o Sul ouvir que meu avô tinha feito teatro, essa vontade passou dele pra mim. Chorei muito, nunca vi meu avô atuando, mas ele era o amor da minha vida, sempre alto-astral, isso foi uma herança”, conta. O grupo de teatro, formado apenas por homens, ensaiava nos galpões de tabaco após a entrega do produto e se apresentava para as famílias da localidade. A partir de então, quando enfrentava dificuldades no Rio, a atriz lembrava do avô e encontrava forças para continuar perseguindo seus sonhos.
Alguns trabalhos da atriz
Teatro
Televisão
Cinema
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