Já são 17 anos de saudade. Seu Nelson partiu e nem tivemos tempo de nos despedir. Era uma fria manhã e eu estava na cozinha tomando café. Conversava com minha mãe e me preparava para o trabalho. Ouvimos o barulho de um carro estacionando no nosso portão. Logo, pensamos: é o mano. Meu coração disparou na mesma hora. Minha mãe foi ao encontro dele e quando entraram pela porta, eu já sabia. A mãe séria e o mano tentava segurar as lágrimas. Só lembro de começar a chorar e questionar por que meu pai tinha nos deixado. Como meu pai, meu amor, meu parceiro tinha partido? Nós tínhamos muitos planos e sonhos para realizarmos juntos! Que injusto!
Quando alguém morre, as lembranças vêm, os momentos compartilhados, as aventuras vividas e, claro, tudo aquilo que ainda pretendíamos viver. Vivi meu luto. Por algum tempo acreditava que ele ia ligar ou aparecer. Como ele morreu em outro Estado, não participamos dos atos de despedida. Ficou essa lacuna. Mas aos poucos a dor se transforma, cede espaço para o que vivemos juntos e traz um calor ao coração – é o Amor. Sempre fui parceira do meu pai, adorava estar e sair com ele. Sábado era nosso dia, acordava cedo e lá íamos nós nos aventurar em bares, amigos e parques. Na volta, sempre trazia um “presente” para minha mãe, uma espécie de recompensa, por ter ficado longe dela. Um pastel de origem duvidosa, um brigadeiro amassado ou qualquer outra coisa só para dizer que tinha me lembrado dela durante o passeio.
Seu Nelson era mais permissivo do que Dona Valéria. Bastava um olhar mais “pidão” e ele cedia. Dificilmente dizia um não. Era emotivo, guardava qualquer bilhetinho que fizesse e nunca perdia a oportunidade de estufar o peito e dizer que era meu pai! Quando penso nele, sempre lembro do cabelo preto, macio, e do seu característico bigode. O bigode do pai é muito emblemático. Quem conheceu ele, sabe do que falo. Sinto saudade do “beijo de bigode” que espinhava o rosto e mesmo assim era o melhor beijo mundo. E ele é o protagonista de uma história que volta e meia vinha à tona nas rodas de conversa lá em casa.
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Meu pai sempre foi muito devoto à Nossa Senhora Aparecida, sempre tivemos imagens dela em casa e, quando queria agradecer ou orar, acendia uma vela para a Santinha. Certa vez, fez uma promessa e, se fosse atendido, rasparia o bigode. Ele foi e cumpriu. O que ele não esperava era minha reação. Eu tinha entre 2 e 3 anos e quando ele apareceu, recuei. – Vem, Aline, vem com o pai. – Eu não, tu não é meu pai, meu pai tem bigode. Estava instaurado o caos, eu não o reconhecia e me negava ir com aquele estranho. Começaram as argumentações e as tentativas de tentar me convencer de que aquele homem sem bigode era o meu pai.
Volta e meia a história era recontada lá em casa. Passados os anos, arrancava risos, mas segundo minha mãe, na época, foram as lágrimas que tomaram o rosto do meu pai. Em resumo, ele nunca mais “tirou” o bigode, preferiu outras promessas… Esse é apenas um dos tantos momentos de que me recordo junto ao seu Nelson, ou Gaúcho, como o conheciam. Com a proximidade do Dia dos Pais, a saudade aperta devido à avalanche de propagandas e recordações. A única promessa, no entanto, que eu gostaria de ouvir é de que ele estaria sempre aqui para me dar muitos beijos de bigode, claro!
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