Fiquei assustado com a falta de clareza na prova de domingo do Exame Nacional do Ensino Médio, principalmente depois que o ministro da Educação justificou que o Ministério não tem responsabilidade pela elaboração das questões, pois foram feitas por “professores independentes”. Ele já está lavando as mãos ante a péssima repercussão do que está contido nas provas. Eu lecionei Português no ensino médio por quatro anos e Linguagem em faculdade de Jornalismo por outros quatro anos. Por isso estou assustado. Pelas amostras que vi, eu teria sérias dificuldades em responder à múltipla escolha, por não conseguir entender o que fora proposto e o que realmente estava sendo perguntado. Nem Caetano Veloso, o autor das duas músicas sobre as quais pediam pontos comuns, foi capaz de responder; ficou indeciso entre as opções de respostas.
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A bancada do Agro no Congresso protestou contra o cunho político-ideológico com que a agricultura foi tratada, mas nem preciso entrar nessa questão polêmica. A militância política exposta na prova é Paulo Freire posto em prática. Não preciso entrar no conteúdo dos enunciados nem das respostas sugeridas para me assustar com o futuro. Porque se professores redigiram essa prova, é porque eles estão se expressando, nas salas de aula, da mesma forma enrolada. Espero que sejam apenas burocratas que trabalham fora da sala de aula. Mas se não, fico imaginando como comunicam suas ideias aos alunos, com tanta falta de clareza, de simplicidade, frases gigantescas, enroladas, obscuras. Neurônios caóticos.
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O tema da redação é um modelo disso: Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil. Cruzes! O que seria isso? Lendo o trabalho exaustivo de muitos intérpretes, concluí que o tema seria “escreva sobre a profissional que também é dona de casa”. Pobre do aluno do curso médio que precisou descobrir o que esses “professores independentes” queriam. Os melhores exegetas e filólogos ainda não conseguiram traduzir “pragatização de seres humanos e não humanos” que está no texto usado para propor uma das questões. Não consigo entender o significado do palavrório usado. Parece coisa de inculto querendo exibir erudição.
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Winston Churchill, quando tenente de cavalaria na Índia em 1898, formulou a receita para escrever bem e se comunicar: “Das palavras, as mais simples; das mais simples, as menores”. Em 1940, ele foi o primeiro a resistir ao exército nazista. Suponho que discípulos de Paulo Freire nunca leram Churchill, embora ele tenha se aliado a Stalin para derrotar Hitler. Mais tarde, no Brasil, Chacrinha sentenciava nos auditórios: “Quem não se comunica, se trumbica!”. É o pessoal do visualizar, do disponibilizar, do colocar, do protocolizar – palavras quilométricas substituindo curtinhas, para terem tempo de encontrar a palavra seguinte da frase, na falta de vocabulário. Enfim, este Enem serve para se conhecer a que as novas gerações estão submetidas. Querem induzir nos jovens ideias prontas, em lugar de estimular a curiosidade, a dúvida, o estudo, a pesquisa. Nem são ensinados a pensar nem a se comunicar.
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