A chegada do inverno e a queda brusca nas temperaturas levaram a Administração Municipal de Santa Cruz do Sul a alterar o horário de atendimento no Albergue Municipal neste mês de julho. O local, uma casa no Bairro Bom Jesus, serve de abrigo temporário a pessoas em situação de rua. No turno da noite a média de frequentadores varia entre 25 e 30 pessoas, enquanto durante o dia esse número cai bastante, com cerca de uma dezena de usuários.
A mudança no horário de permanência dentro do albergue é uma medida temporária que vai permanecer em vigor durante todo este mês, podendo ser prorrogada até o fim de agosto, a depender do rigor do inverno. Embora nesse período seja possível ficar 24 horas no local, quem sair para trabalhar, fazer bicos ou qualquer outra atividade terá que respeitar o horário de ingresso, que permanece o mesmo, sempre às 18 horas, quando ocorre a triagem. “Claro que existem exceções, em um dia de muito frio e chuva, a gente não deixa as pessoas na rua esperando, é uma questão de bom senso”, observou a diretora de Desenvolvimento Social da Secretaria Municipal de Habitação, Desenvolvimento Social e Esporte (Sehase), Priscila Froemming.
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Segundo Priscila, não faltam vagas para atender a demanda de pessoas em situação de rua hoje em Santa Cruz do Sul. O local nunca lota, mas existem regras que precisam ser observadas e seguidas à risca, a fim de que se mantenham a ordem e as condições dignas de convivência. “A pessoa não pode entrar se estiver alcoolizada ou sob efeito de alguma substância psicoativa”, ressaltou. A maioria dos que procuram o serviço são homens e a busca é motivada, na maior parte dos casos, pela ruptura de vínculos familiares – são raras as situações de falta de moradia.
Como explica a educadora social Aniusca Calage todas as noites, após a triagem, um educador social e um guarda municipal percorrem a região central da cidade realizando a chamada abordagem social. Nas quintas-feiras eles são acompanhados também pelo Consultório de Rua, com oferta de atendimento básico na área da saúde. Pessoas encontradas na rua, seja embaixo de viadutos, pontes, marquises ou em praças públicas, são convidadas para passar a noite protegidas no albergue, onde podem se alimentar, tomar um banho e dormir em uma cama quentinha. “Elas não precisam passar fome nem frio, o serviço existe e está à disposição dos que necessitam. O município não fecha as portas para ninguém”, disse.
No entanto, Aniusca deixa claro que não é possível obrigar ninguém a ir para o local. “Muitos optam por ficar na rua em virtude dos vícios e o dinheiro que ganham dos passantes acaba ajudando a alimentar essa situação”, frisou. A educadora acredita que falte um pouco de compreensão por parte da comunidade com relação ao trabalho executado pela abordagem social. “A comunidade às vezes não entende isso, quer que retiremos a pessoa da rua, mas não é assim, não podemos levar à força, todos têm o direito de ir e vir”.
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Quem permanece no albergue durante o dia ganha quatro refeições: café da manhã, almoço, café da tarde e janta. Quem chega à noite, toma banho como os demais e recebe janta e café da manhã. Os usuários lavam as próprias roupas e aqueles que querem podem auxiliar nos serviços domésticos. Em 2020, início da pandemia, algumas atividades, como yoga e pintura, foram oferecidas, mas não contaram com a adesão dos usuários. Para quem se interessa, o pátio também possui uma horta onde é possível ocupar o tempo no cultivo de hortaliças.
Cada pessoa que passa pelo albergue precisa preencher um formulário, com informações que vão subsidiar a rede de atenção social na busca por soluções para auxiliar no caso. “Algumas pessoas estão em busca de emprego, tem quem precise de suporte para conseguir uma documentação, outras enfrentam problemas relacionados ao vício e precisam de atendimento na área da saúde, tem os que perderam os vínculos familiares, enfim, são situações das mais diversas”, conta Aniusca.
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Mas, segundo ela, há também aqueles que estão só de passagem pelo município. “Tivemos um mexicano que estava percorrendo vários lugares de bicicleta e não tinha onde passar a noite e também na semana passada um baiano, que logo chegou e em poucos dias conseguiu emprego”.
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Dentro do albergue não há conflitos. Segundo a equipe de servidores, a convivência é harmônica e é possível dizer até que o grupo se comporta como uma família. É o caso do seu Paulo Roberto Garcia, 63 anos, que após uma longa passagem pelo local está se despedindo.
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Desde 2019, quando saiu de casa em razão da bebida, passou a frequentar o espaço. Agora, quase dois anos após ter abandonado de vez o vício, ele vai voltar para casa e viver junto da esposa, com quem já morou por 15 anos. “Só tenho a agradecer por toda a ajuda que recebi. Aqui é minha segunda casa e os colegas aqui são minha segunda família, vou sentir muita falta, já me acostumei, mas como vou morar pertinho venho visitar sempre”, disse.
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Em busca de melhor sorte está Denise Machado de Lima, 46 anos. Após sofrer uma isquemia, a mãe foi levada para a Asan e a tia com quem moravam foi embora para São Leopoldo, morar com outra familiar. Desempregada e sem recursos para se manter, Denise hoje conta com o amparo da equipe do albergue. “Eu não tenho ninguém, agora estou por mim e Deus”.
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No momento ela deixa currículos e espera conseguir vaga novamente na indústria fumageira, onde já trabalhou como safrista. Sobre o acolhimento no albergue, mesmo em meio a uma realidade tão dura, ela é só agradecimento. “Me sinto bem aqui, a comida é boa, o café é bom, os monitores são legais, os vigilantes também. Não tenho queixa, todos me acolheram bem”.
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