Há sempre uma comoção inevitável quando morre um artista famoso por décadas. E o Brasil teve perdas significativas em pouco mais de meio ano, sobretudo na música: Rita Lee há alguns dias, Gal Costa, Erasmo Carlos, todos veteranos. Ídolos para gerações diferentes. No período de homenagens que se sucedeu ao falecimento, em cada situação, quem não os conhecia pode ter se sentido instigado a descobrir seu trabalho, saber o que os tornava especiais. E quem conhecia talvez tenha remexido a memória afetiva e redescoberto canções que, em determinados momentos, foram relevantes para suas vidas.
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Ao mesmo tempo, a partida de figuras que um dia pareceram inabaláveis, imortais, nos lembra de nossa própria finitude. Mesmo que de forma pouco consciente, às vezes reagimos a isso. Os tributos e homenagens, as declarações do tipo “Você nunca vai morrer”, o compartilhamento de músicas, imagens, lembranças, servem também para afirmar: eles ainda estão por aqui. Não desapareceram. É como se encarássemos a morte e a desafiássemos: você não venceu o jogo.
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Cada um tem suas crenças religiosas ou convicções filosóficas sobre o fim, seu modo particular de lidar com o assunto. Há quem confie em uma existência melhor num lugar diferente. Há quem espere um renascimento neste mundo mesmo, em uma nova encarnação. Um retorno. “Em pouco tempo, um momento de descanso ao vento, e uma outra mulher me dará à luz”, diz o poeta libanês Khalil Gibran no livro O profeta (1923). E há os que não acreditam em nada e preferem nem esquentar a cabeça.
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Mas chega um momento em que todos percebem o fluxo dos grãos de areia que escapam de forma incessante, “os átomos de tempo que se evadem da vida” – assim como o príncipe Fabrizio, protagonista de O Leopardo, romance de Tomasi di Lampedusa. Fabrizio chega ao término da jornada juntamente com a sociedade que ele conheceu.
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Aqueles grãos de areia, contudo, não se perdiam; fugiam, sim, mas para se acumular em outro lugar, ainda desconhecido. E talvez nem fossem grãos, mas partículas de vapor d’água que subissem ao céu “para formar grandes nuvens livres”. É no que Fabrizio pensa em seus últimos instantes, experimentando ideias, procurando a palavra certa para também dizer: o jogo não acaba aqui.
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