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Ágatha quer chamar a polícia

Nossa caçula, Ágatha, gosta de bancar a durona. Não raras vezes, retruca quando lhe chamamos a atenção e, via de regra, quer ter a última palavra. Não diria que é birrenta ou mal-educada, mas intransigente na defesa de suas ações ou opiniões quando julga estar com a razão – ou seja, sempre.

Talvez os leitores lembrem de certo episódio que narrei em uma coluna tempos atrás, sobre a vez em que a traquinas quase saltou do carro em movimento. Eu havia parado para deixar as gurias na escola e decidi avançar alguns metros, para ocupar uma vaga que surgira à frente. Brequei a tempo, ao perceber que, neste intervalo de um ou dois segundos, Ágatha já havia tirado o cinto de segurança, aberto a porta e colocado um pé para fora.

Claro que ralhei com ela, argumentando que jamais deveria abrir a porta do carro em tais circunstâncias, e aconteceu que seguimos discutindo até a sala de aula. No entender da traquinas, a culpa pelo quase acidente era toda minha – afinal, a culpa é sempre do motorista. Por fim, concluí que, neste caso, talvez ela tivesse mesmo razão. E, desde o fatídico episódio, mantenho o costume de travar as portas do carro quando levo as crianças de um lugar a outro. Deixo, aliás, esse conselho aos amigos leitores.

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Ágatha também não tolera que caçoem dela. Nunca esqueço de uma briga acirrada que teve com a Yasmin, irmã um ano mais velha, quando esta decidiu zombar da caçula aproveitando-se da dificuldade que Ágatha tinha, na época, de pronunciar palavras com “pr”.

– Hoje, depois do almoço, ajudei a mãe a lavar meu “pato” – gabou-se Ágatha, na ocasião.

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Malandra, Yasmin fez-se de desentendida.

– Pato? Nem sabia que tínhamos patos aqui em casa… – E arrematou: – Deixou ele com as penas limpinhas?

– Não… – Ágatha insistiu. – Não era esse tipo de pato, era um “pato” de comer!

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– Ahhhh… um pato assado?

Só então Ágatha deu-se conta da zombaria. E estourou a guerra.

Em outra ocasião, ambas discutiram porque Yasmin demorava-se a desocupar o banheiro.

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– Yasminnnnnn! Sai logo, eu também “peciso” usar a “pivada”.

E, sem ter os apelos atendidos pela irmã, Ágatha veio reclamar conosco.

– A Yasmin acha que é a “pincesa” da casa, “sempe” demorando no banheiro, essa “peguiçosa”… Na “póxima” vez, vou mandar ela usar o banheiro da “paça”…

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Por força da pandemia, e agora, também das férias, as gurias têm custado a dormir à noite, dado que não precisam acordar cedo pela manhã. Em uma noite destas, tivemos que ralhar com elas, porque o barulho estava demais. Acontece que nossa rua é muito silenciosa à noite, a ponto de dar a sensação de que qualquer ruído poderá acordar a vinhança.

Primeiro haviam sido as gargalhadas, por conta de alguma coisa que as gurias haviam assistido no TikTok. Depois, uma começou a comparar a outra aos personagens dos vídeos e, enfim, estourou uma discussão, em alto volume. Ao cabo da terceira tentativa de fazê-las se calarem, minha esposa, Patrícia, alertou:

– Os vizinhos querem dormir! Se vocês não fecharem o bico, eles vão chamar a polícia!

A ameaça funcionou e as marotas, enfim, calaram as matracas. Afinal, com a polícia não se brinca.

Mas, no dia seguinte, não passou despercebida a Ágatha uma acalorada discussão entre dois garotos – possivelmente irmãos, dado que estavam brigando – que caminhavam pela nossa rua. E a traquinas logo tratou de alcançar o telefone à Patrícia.

– Pronto, mãe. Pode ligar.

– Ligar? Para quem?

– Ora… para a polícia. Não está escutando a discussão ali na rua?

– Poxa, Ágatha – suspirou minha esposa. – Capaz que vou chamar a polícia por causa disso…

– Isso não é justo! – protestou a caçula. – Os outros podem chamar a polícia para nós, mas nós não podemos chamar a polícia para eles! 

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