O gênero atribuído ao nascimento nem sempre é compatível com a identidade de gênero autopercebida. Em razão disso, adolescentes (e mesmo crianças) transgêneros nem sempre conseguem ser vistas e reconhecidas como desejam.
Não foi o caso de João*, que teve em sua família o reconhecimento e o apoio necessários, bem como o auxílio jurídico da Defensoria Pública, por intermédio do Centro de Referência em Direitos Humanos, que ajuizou ação e conseguiu na Justiça a retificação de seu registro civil para alteração de prenome e gênero.
A Defensora Pública Coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH), Aline Palermo Guimarães, relatou que não se trata de decisão inédita, mas representou uma grande vitória para todos que atuaram no caso e que se emocionaram com a história da família.
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“O caso chama a atenção, pois, em geral, não há muita aceitação por parte dos familiares e a troca de nome ocorre com mais frequência após os 18 anos, quando a pessoa se torna capaz. Nesse caso, houve vários relatos da mãe, do padrasto, dos avós, de amigos, falando sobre a importância da troca de nome e do gênero, pois o adolescente sempre se identificou como sendo do sexo masculino. Solicitamos a documentação, ajuizamos a ação e obtivemos deferimento da retificação do registro civil em menos de um mês na Vara dos Registros Públicos de Porto Alegre”, destacou Aline.
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Lúcia*, mãe de João, conta que, aos três anos, ele já tentava fazer xixi em pé, gostava de roupas masculinas e pedia para usar cuecas desde os seis anos. Na escola, sempre esteve no grupo dos meninos, jogava futsal e basquete com eles e reproduzia personagens masculinos. Chegou a parar de praticar esportes, mesmo sendo um ótimo jogador, porque era obrigado a passar para o time feminino.
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Para não ter de se referir a si no feminino, agradecia sempre dizendo “valeu”. A partir dos 10 anos, decidiu se chamar João e, aos 13, se apresentava nesse gênero.
A decisão judicial, que reconheceu o direito à retificação do registro, garantiu felicidade a João e a sua família. “Ficamos surpresos positivamente, emocionados. É apenas um documento, uma formalidade, mas é uma libertação, um empoderamento”, contou a mãe.
Em uma das declarações para o processo, Lúcia narrou que, “como mãe, são 16 anos de descobertas, receios, constrangimentos, expectativas, muito amor, muita compreensão e um desejo imenso de ver o João, filho muito amado, circulando com os coleguinhas em cinemas, festinhas de aniversário, atividades escolares, sem constrangimento visível que lhe acompanhava e que não contribuía em nada para o desenvolvimento de um menino saudável, estudioso, esforçado, amigo e querido por todos que tem o privilégio de conviver com ele”.
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O padrasto de João também declarou que foi possível notar o conforto psicológico que o adolescente passou a demonstrar a partir da aceitação e incentivo de todos os familiares, apoiando sua inclusão masculina no contexto social.
“A família de João foi um exemplo de amor, respeito e apoio. Esperamos que divulgar a sua história sirva de inspiração para que outras famílias que convivam com crianças e adolescentes trans busquem a Defensoria Pública para garantir, o quanto antes, o exercício de direitos relacionados à identidade de gênero”, completou a Defensora.
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Em junho de 2020, o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (NUDDH) publicou cartilha tratando sobre alguns direitos da pessoa trans e trazendo informações básicas sobre como alterar prenome e gênero na documentação civil. Clique aqui para acessar a publicação.
Para orientações jurídicas, o Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH), unidade da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul (DPE/RS), atua na construção de estratégias para enfrentamento e superação da discriminação e afirmação dos direitos humanos. O Disque Acolhimento é gratuito: 0800.644.5556 ou crdh@defensoria.rs.def.br.
*Os nomes foram alterados para preservar a identidade dos envolvidos.
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