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EXPLOSÃO EM BEIRUTE

‘Achei que era terremoto’, diz santa-cruzense que mora no Líbano

Foto: Arquivo Pessoal

Viviane, o marido e os filhos: cotidiano já difícil no país tende a se agravar com explosão

Desde terça-feira, 4, imagens impressionantes da explosão de um depósito na região portuária de Beirute ganharam os noticiários ao redor do mundo. A suspeita é de que ela tenha partido de um armazém onde havia 2,7 mil toneladas de nitrato de amônia. Moradora de Beirute há quatro anos, Viviane Maria Schmidt Fayad estava em casa no momento em que um tremor invadiu sua residência. “Achei que era terremoto”, lembra a santa-cruzense. Ela, os filhos Ali, de 8 anos, Hana, de 4, e Maria, de 2, além do marido, o libanês Mohamed, passam bem. O primogênito dela, Vinícius Schimidt da Silva, de 21 anos, mora em Santa Cruz do Sul.

A aproximação de Viviane com os países do Oriente Médio começou quando o relacionamento com Mohamed iniciava pelas redes sociais. Foram dois anos assim, até que, em 2011, uma oportunidade de trabalho em um hotel no Kuwait foi o impulso necessário para deixar o Brasil e encontrar o companheiro. Foi lá que se casaram e onde nasceram os dois primeiros filhos.

O casal optou então por mudar para Beirute, terra natal de Mohamed e onde moram seus familiares. Lá nasceu a terceira filha, Maria. Na cidade, a brasileira se deparou com um povo hospitaleiro, alegre e com fortes tradições religiosas, e clima semelhante ao brasileiro. No mesmo país, porém, também observa muitas dificuldades socioeconômicas, conflitos e, agora, a destruição, após uma explosão que já deixa pelo menos 135 mortos e 4 mil feridos. Viviane conversou com a Gazeta nessa quarta-feira, 5, e contou sobre o momento em que ouviu e sentiu os efeitos da megaexplosão.

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Entrevista:

Gazeta – Você chegou a ouvir algum barulho da explosão, estava em casa quando aconteceu?
Viviane – Alguns segundos antes da explosão eu senti o sofá onde estava sentada chacoalhando, ele andou alguns milímetros para frente. Passaram alguns segundos e deu uma explosão, seguida de outra enorme. Como nunca senti um terremoto e nunca vi uma explosão, quando deu aquele tremor no sofá achei que era terremoto. Quando ouvi o barulho pensei que algum prédio havia caído. Corri para a janela e vi pessoas na rua correndo, tirando fotos, gritando. Havia prédios na minha frente e eu não conseguia ver nada.

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A gente tem um grupo de brasileiras aqui no Líbano no WhatsApp e começamos a mandar mensagens para saber o que tinha acontecido. Uma dizia que era bomba, outra que era terremoto, eram muitas informações desencontradas. O meu prédio fica a uns 15 ou 20 minutos de carro do porto, mas a explosão, pelo que estão comentando, teve um alcance de até 40 quilômetros.

Logo depois que você ficou sabendo da explosão, quais informações chegaram para você?
Por enquanto, a informação oficial que o governo está mantendo é que começou um pequeno incêndio no porto. Os bombeiros não conseguiram controlar e esse fogo atingiu um contêiner de fogos de artifício, que explodiram em direção ao hangar 12 do porto.

Para esse hangar, em 2014, veio um navio carregado de nitrato de amônia. O navio estava com muitos problemas e começou a afundar, então tiraram toda a carga que havia e estocaram no hangar 12. Há seis meses fizeram uma vistoria no local e afirmaram que deveria ser retirado o material porque estava ficando corrosivo e muito perigoso. A Defesa Civil pediu a retirada ao porto, mas não ocorreu. Então os fogos explodiram em direção a esse hangar, atingiram o nitrato de amônia e deu essa explosão. Acabou com o porto, explodiu tudo.

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Como você descreve a cidade e o país desde essa explosão?
O clima aqui está muito pesado. O Líbano está passando por uma situação socioeconômica muito grave. Desde novembro existem muitos protestos, alguns pacíficos, outros não. Muitas pessoas já morreram durante esses protestos por condições melhores de trabalho, por salários mais compatíveis com o nível de vida aqui. Muita gente perdeu o emprego e o dólar disparou. Ficou muito pesado sustentar uma família.

O Líbano não produz muito, tudo vem de fora e é baseado no dólar. Também tem a questão do coronavírus. Estamos em quarentena contínua desde março, com as escolas fechadas, as crianças em casa e famílias sem salário e comida. Aí, somando esta explosão é muito complicado, muito pesado.

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Como você descreve a cultura no Líbano? Há muitas diferenças ou semelhanças com os brasileiros?
Há muitas coisas em que o povo libanês é parecido com o brasileiro. O libanês é alegre, hospitaleiro, festeiro como o brasileiro. Claro que há as tradições fortes aqui. O país é dividido, são cinco ou seis religiões diferentes e aqui isso é muito importante. Eles colocam na carteira de identidade e no passaporte da pessoa a religião. A área em que eu vivo é muçulmana xiita. Aqui as mulheres usam o hijab, aquele lenço cobrindo o rosto. Usam abaya, o vestido preto que cobre bem os braços e as pernas. Mas eles são abertos, aceitam outras religiões.

Eu sou católica, sou casada com muçulmano, mas não uso hijab ou abaya, uso “roupa normal”. Claro que não é saia curta ou miniblusa, o máximo que pode colocar aqui é uma calça que vai até o joelho ou camiseta que vai até a metade do braço. No restante do país tem muito cristão, são cristãos ortodoxos. Mas também tem boate, bar e bebedeira aqui. Até o clima do Líbano é o mesmo do Brasil. Beirute é quente como no Rio de Janeiro, mas daí se você sobe para as montanhas é frio como em Gramado. O clima não tem diferença e a maneira do povo se comportar é muito parecida com a do brasileiro.

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Como você acha que serão os próximos dias por aí após esse acontecimento?
Os dias que virão serão muito difíceis, vão ser de muita luta. Como o Líbano não produz muitas coisas, vai ser complicado. Havia muitos produtos no porto que eram para suprir o povo e foi tudo queimado. Os hospitais estão cheios, já estavam lotados por causa do coronavírus, que tem muitos casos aqui. Agora com a explosão, os hospitais estão lotados, não há medicamentos suficientes, estão implorando por doações de sangue.

Estão sugerindo que as pessoas que moram próximo ao porto saiam de casa por causa da quantidade de amônia que tem no ar e que é altamente tóxica. A gente não sabe como vai ser. Desde que começou a crise econômica, estamos vivendo um dia após o outro. Graças a Deus eu acordei de manhã, estou podendo dormir, meus filhos estão saudáveis, tem alimento na mesa, não falta nada para nós. Mas tem muita gente que não tem. É muito difícil.

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