Sou do tempo em que se levava lanche de casa. Naquele tempo, a gente chamava de “merenda”, ao menos lá nas bandas do bairro Bela Vista, no interior de Arroio do Meio, onde nasci e de onde íamos a pé até a Escola Luterana São Paulo. O alimento para a hora do recreio era preparado logo cedo pela dona Gerti, minha mãe, embalado geralmente num saco plástico.
Quase não havia variações das opções, afinal, todos os lanches eram caseiros: bolos de todo tipo (com e sem cobertura de chocolate), pão feito em casa e doces variados, entre outras produções próprias. Na Páscoa, cascas de ovos de galinha ornamentadas com tinta nanquim e papel celofane, recheados com amendoim com açúcar. As cascas dos ovos eram quebradas na cabeça dos colegas quase sempre na saída das aulas.
O contato com colegas que moravam na cidade permitiam as primeiras noções de escambo. Fazíamos trocas de nossas gostosuras. Assim, aprendi a gostar de pão comprado, biscoitos de confeitaria, bolacha Maria, pastel de padaria e outras novidades. E cá entre nós: os quitutes da dona Gerti faziam o maior sucesso.
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Lembrei dessa época há poucos dias, ao constatar a quantidade cada vez maior de colegas de trabalho que trazem marmitas de casa para consumir no almoço. O preço da refeição fora de casa é proibitivo e multiplicar por cinco a cada semana onera substancialmente o bolso do trabalhador. Além disso, muitas pessoas não têm tempo suficiente no intervalo para almoçar fora, o que leva à alternativa pelas “quentinha”. Por isso, os fornos de micro-ondas são onipresentes, seja no serviço público ou empresas privadas.
São novos tempos em que a inflação dos alimentos dispara, distante da realidade salarial dos trabalhadores que têm os vencimentos congelados, ameaça presente ao lado do desemprego. Como se vê, alguns hábitos voltam à rotina, muitas vezes resultado de oscilações no custo de vida.
Ao lado do micro-ondas, a venda fracionada de alimentos e lanches é outro fenômeno moderno, nem tão novo, mas que se ampliou. De um lado estão trabalhadores em busca de comida. De outro, desempregados que apelam para a venda de porta em porta para sobreviver, tentando driblar a recessão que surrupiou 13,5 milhões de empregos no Brasil.
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