Cultura e Lazer

A vida como ela é: entre a sorte e os infortúnios

Atarde deste sábado reserva o lançamento de uma nova obra literária em Santa Cruz do Sul. A partir das 15 horas, o escritor Leonardo José Andriolo, natural de Ana Rech, hoje bairro da cidade de Caxias do Sul, e radicado desde 1997 em Santa Cruz, apresenta seu romance Brilho e sombra. A atividade, com sessão de autógrafos, acontece na Livraria e Cafeteria Iluminura. A obra, de 200 páginas, chega sob o selo da editora Coralina, de Cachoeira do Sul, e exemplares estarão à venda no local ao preço de R$ 45,00.

A obra marca a estreia de Andriolo na narrativa ficcional longa. Antes, em 2011, havia apresentado um romance voltado a um gênero memorialístico, ao recuperar, em Com passos lentos, mas firmes, circunstâncias de seus próprios antepassados. A família, de ascendência italiana, se estabelecera em Ana Rech, a cerca de 12 quilômetros da área central de Caxias do Sul, em um tempo no qual a região ainda assumia ares bastante interioranos.

Em momento seguinte, em 2019, lançou o volume de contos Dois meninos, em que novamente lidava com reminiscências de família, ainda que proporcionando a elas um tratamento apoiado em recursos da literatura de ficção.

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E foi em meio à elaboração de novos contos, em época mais recente, que um desses textos revelou-se propício a um voo de narrativa mais longa. Foi o mote para que, em torno de um personagem central, Ulisses, Andriolo se visse desafiado a elaborar um romance de tonalidade clássica. O resultado é Brilho e sombra. Já no nome do personagem principal fica estabelecido um intertexto, ainda que sutil, com o herói de Homero, bem como, igualmente, com a obra-prima de James Joyce.

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Mas o personagem criado por Andriolo em nada fica a dever aos antecessores, fixados na história da literatura em todos os tempos, bastando-se a si mesmo no enredo e na trama do romance. Ao lado dele, os outros três filhos do professor de literatura Ambrósio também remetem a personagens conhecidos, com os nomes de Helena, Heitor e Irene.

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A trajetória de Ulisses pelo mundo da política, área para a qual é incentivado por um grande amigo de seu pai, o ex-prefeito dr. Cristiano, configura uma jornada em busca de projeção e de exposição (para “brilhar”, como sugere o título), mas sempre acossado por tudo aquilo que fica nos bastidores, seja em família, seja no ambiente do cargo público. Não chega a haver em Ulisses algo que se assemelhe a ganância, ou ambição desmedida, mas sim uma certa expectativa por desfrutar de benesses ou das oportunidades de contribuir para o social. Ao menos num primeiro momento, defende causas sociais e ambientais.

Assim, estimulado por seu mentor, candidata-se a vereador. Na reta final de campanha, perde o pai, o que, no entanto, impulsiona sua votação. Alguns acertos em ações e projetos bastam para que seja lançado como candidato a deputado. Novamente é bem-sucedido. Mas o que o torna popular em todo o Estado também acaba por afastá-lo da família, pois a esposa, Isabela, e o casal de filhos, Iago e Vitória, permanecem em sua cidade de origem, no interior.

Então surgirão os contratempos e as adversidades que, decorrentes de conchavos, nas sombras, vão ameaçar seriamente todo o seu projeto. Diante dos infortúnios e das ameaças, vê-se impelido a refletir sobre até que ponto o que parecia uma vida bem-sucedida no final das contas não foi outra coisa do que uma sequência de tropeços ou equívocos. Alguns, certamente, irremediáveis. As questões que Ulisses levanta (ou permite inferir) são as que cada ser humano poderá se formular.

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“Ulisses agradeceu, prometeu avaliar a proposta e o dr. Medeiros prontamente o conduziu até a porta. O deputado despediu-se das modelos dublês de secretária e em seguida entrou no elevador panorâmico, de onde apreciou mais uma vez a vista da cidade. Ao chegar ao térreo, já se dava conta de que o fato de ser deputado não o fizera mudar de classe. Não pertencia ao clube de Dorneles e seus parceiros de negócios dissimulados; nem ao de Rosati, que tratava de empreendimentos milionários como quem conversa sobre futebol. Tampouco era da turma do pastor Isaías, com suas lucrativas atividades assistenciais e os abençoados dízimos dos fiéis. O título de deputado não mudava o que ele essencialmente era: apenas o filho de um professor.”

ENTREVISTA COM O AUTOR

Magazine – A obra literária do senhor iniciou-se com um esforço de recuperação de fatos e personagens de sua própria família. Nesse sentido, o que “Brilho e sombra” vem agregar a sua atividade produtiva?
 “Brilho e sombra” é um romance ficcional, embora, a rigor, nenhum romance seja totalmente ficcional, pois sempre terá como inspiração a vida real. Mas a temática desse livro não se conecta com minhas obras anteriores.  

Em Santa Cruz do Sul, Leonardo Andriolo trabalha junto ao Tribunal de Contas e também é professor de Administração na Unisc

O exercício da escrita tem sido uma via também para o senhor revisitar o seu ambiente imaginário de infância e adolescência, em que foi criado?
Na vida real, estamos sujeitos à sorte e aos infortúnios, sem que tenhamos controle sobre eles, enquanto numa obra de ficção o escritor é senhor dos destinos, é ele que determina as venturas e as desgraças. Então escrever é, sim, uma possibilidade de retomar as fantasias da infância e da adolescência, dando a elas o desfecho que se desejar. Em certo sentido, escrever é quase uma terapia.

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Ulisses, figura central do romance, carrega a carga simbólica de personagem épica. Como foi construir esse personagem no contexto de “Brilho e sombra”?
O personagem principal do romance se chama Ulisses numa referência à Odisseia, de Homero, porque também empreende uma jornada, afastando-se de casa, enfrentando desafios e vivendo aventuras, retornando ao final amadurecido. Mas, no livro, o nome tem também um motivo mais prosaico: o pai era um professor de literatura apaixonado pelos clássicos, que deu aos seus filhos nomes de personagens épicos: Ulisses, Helena, Heitor. Aliás, eu faço várias referências a autores conhecidos, algumas claras, outras veladas, porque eu acredito que todas as histórias já foram contadas. O que se faz ao publicar um livro é contar uma velha história de uma forma diferente.

O senhor tem formação em Administração e Ciências Econômicas, atuando como professor. O que a literatura significa para a sua rotina?
Sempre gostei muito de ler e tenho certeza de que isso contribuiu para me tornar um profissional melhor, seja como administrador, economista ou professor. Escrever entrou na minha rotina como um hobby, uma forma de descansar a mente dos problemas e dos desafios profissionais para me ocupar com a ficção, com o imaginário, com a fantasia.

O senhor é também reconhecido pelo estímulo da literatura junto a seus filhos, o Henrique e o Guilherme. Em que medida a literatura e a leitura são importantes no processo de educação, de ensino, em seu entender?
Eu acredito que a educação se faz pelo exemplo. Não há forma melhor de educar os filhos do que dando bons exemplos. Contar histórias, estimular a imaginação, dar valor aos livros, ler, são atividades que influenciam o meio em que se vive. Eu e minha esposa sempre fizemos isso de forma natural; então, não é de estranhar que o Henrique e o Guilherme gostem de ler e tenham desenvolvido a habilidade de escrever. 

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O senhor vem de comunidade de colonização italiana, e radicou-se em comunidade de colonização alemã. O que esse convívio entre diferentes culturas e tradições trouxe para sua caminhada pessoal e profissional?
A cultura das regiões de colonização italiana e alemã tem muita coisa em comum, até porque o processo da imigração foi semelhante. Vários leitores de origem alemã me relataram que as histórias narradas no meu primeiro livro, “Com passos lentos, mas firmes”, que refere a saga das famílias dos imigrantes italianos, eram muito parecidas com as que tinham ouvido de seus avós. Mas, para além do seu meio, eu creio que um escritor deve estar aberto para o mundo, acolher a diversidade, estar atento às contribuições de outras etnias, de outras culturas.

Quais são as principais influências literárias do senhor?
É bem difícil identificar os escritores que me influenciaram, porque todo livro lido deixa sua marca, exerce uma influência perceptível ou, muitas vezes, nem percebida. Então, o escritor que sou, considerando aqui todas as minhas limitações, é resultado dos livros que eu li e da leitura que eu faço do mundo. Mas, sem dúvida, alguns autores merecem ser citados: Graciliano Ramos, porque a palavra serve para dizer e não para enfeitar; Machado de Assis, porque não há assunto sério que não possa ser tratado com algum humor; José Mauro de Vasconcelos, porque uma história precisa provocar sentimentos. E ainda Assis Brasil, Erico Verissimo, Vargas Llosa, Victor Hugo, Carlos Ruiz Zafón, porque são (foram) exímios contadores de histórias.

SERVIÇO

O quê: lançamento do romance Brilho e sombra, de Leonardo José Andriolo
Quando: neste sábado, a partir das 15 horas, com sessão de autógrafos
Onde: na Livraria e Cafeteria Iluminura, no centro de Santa Cruz do Sul
Para adquirir: exemplares estarão à venda no local, a R$ 45,00

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