Gazeta – O senhor representa um partido pequeno, que tem apenas uma candidata a vereadora. Como governar sem apoio na Câmara?
Afonso – Com a participação popular. Nós defendemos os conselhos populares. Os vereadores foram eleitos pela população e, se as demandas forem definidas pela população, eu duvido que não votem a favor. Todas as denúncias de corrupção que existem hoje no Brasil passam pelas negociatas que acontecem para os governos conseguirem maioria no Legislativo. Eu estou acostumado a enfrentar adversidades e ter minorias.
Gazeta – Hoje nós temos diversos conselhos municipais. O modelo que o senhor defende é diferente?
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Afonso – É um novo formato, de conselhos que não serão “prefeiturizados”. Serão conselhos livres, nos quais entrarão sindicatos, movimento estudantil, associações de moradores. Eles terão todo o orçamento municipal à disposição para votar e definir as prioridades, e o prefeito será um fiel cumpridor. Hoje, as demandas encaminhadas pelos conselhos são engavetadas. A política representativa está falida. Por isso, defendemos a política participativa.
Gazeta – No seu plano de governo, o senhor promete não indicar CCs. É possível conduzir uma administração sem pessoas de confiança nos comandos?
Afonso – Se eu não acreditasse nisso, já teria largado o movimento. Eu confio nos trabalhadores. O que acontece na Prefeitura é que são colocados apadrinhados políticos lá dentro, ganhando três ou quatro vezes mais do que os outros, sem saber nada e mandando nos demais. Isso não é valorizar o funcionalismo. Aliás, a primeira coisa que vou fazer é anular o que o Sérgio Moraes fez em 1999, quando retirou todos os direitos dos servidores.
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Gazeta – O senhor diz que o principal problema do município é a guerra fiscal. Mas conceder incentivos não é uma forma de atrair empresas e assim gerar empregos?
Afonso – Não sou afeito a pensar só no nosso umbigo. Que adianta eu trazer uma empresa de Vera Cruz para cá, se eu vou estar gerando desemprego lá? Isso não é solução. A solução é apostar nas pequenas empresas, naquelas pessoas que gostariam de montar um negócio e não conseguem. É isso que traz retorno para o município.
Gazeta – E onde a Prefeitura entra nisso?
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Afonso – Facilitando os trâmites para a criação de empresas e oferecendo assessoramento técnico, por exemplo. Isso é muito mais importante do que dar incentivo para uma grande empresa se instalar aqui, e aí, quando terminar o prazo do incentivo, ela ir embora.
Gazeta – O senhor sempre defendeu a gestão pública do saneamento. Entretanto, o desempenho da Corsan vem sendo criticado. Como garantir o cumprimento do contrato que foi assinado em 2014?
Afonso – Nós temos que responsabilizar quem passou quatro anos tentando privatizar a água, e só não fez porque nós não deixamos. Quem participava daquela licitação eram as grandes empreiteiras que hoje estão envolvidas em corrupção. É claro que não vamos deixar de cobrar a empresa pública, mas eu vou dialogar permanentemente e, por meio dos conselhos populares, vai ser muito mais fácil fazer os investimentos necessários. Acho até que algumas reclamações são injustas. Por que ninguém reclama da AES Sul? Dá muito mais problema.
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Gazeta – O senhor propõe a municipalização do transporte coletivo urbano, mas até o fim do ano deve ser assinado um contrato de dez anos com um consórcio privado. O senhor vai revogar esse contrato?
Afonso – Vou revogar, sim. Esse contrato não está de acordo com a legislação. Entraram apenas as mesmas empresas que já exploram o serviço. O transporte vai ser subsidiado, e a população vai fazer questão disso, porque o serviço vai ter melhor qualidade e a tarifa será mais barata. E antes que digam que vamos gerar desemprego, tenho certeza que os atuais cobradores e motoristas têm todas as condições de passar em um concurso, e vão ganhar mais do que ganham hoje.
Gazeta – No seu plano, ainda está previsto passe livre para estudantes, aposentados e desempregados. A própria receita do serviço cobriria tudo isso?
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Afonso – Se não cobrir, o subsídio será importante. Porque com o transporte melhor e mais barato, o trabalhador vai economizar em outras coisas e vai concordar com o subsídio.
Gazeta – Temos hoje um deficit de pelo menos 700 vagas nas creches. Como reverter isso?
Afonso – As cooperativas são importantes, mas a responsabilidade é da Prefeitura. E também dos empresários, mas infelizmente isso não tem sido cobrado. Como não vamos ter indicados nas creches, esse valor que vai sobrar será distribuído entre as monitoras. Quanto à construção de creches, é o mais fácil hoje. O difícil é manter, mas vamos encontrar mecanismos para isso.
Gazeta – 2016 é o ano mais violento da história de Santa Cruz. Como a Prefeitura pode contribuir para reduzir os índices de criminalidade?
Afonso – Segurança não é polícia. Segurança é o bem estar das pessoas. É educação, saúde, cultura, lazer, creches, escolas em tempo integral. Precisamos atacar a origem da violência. Não adianta colocar polícia. Agora, quanto ao financiamento de tudo isso, tem algo mais importante que ninguém fala: o dinheiro que é repassado aos banqueiros. No ano passado, foram R$ 1,2 trilhão.
Gazeta – Mas como um prefeito pode interferir nisso?
Afonso – Se acha que não consegue fazer nada, não tem que concorrer. Acho que nós temos que começar daqui um movimento de resistência. Vamos fazer pressão para suspender esses repasses.
Gazeta – Vamos falar de saúde. Com a inauguração da UPA do Bairro Esmeralda, o que passa a ser prioridade nesse setor?
Afonso – Primeiro é acabar com as privatizações. Saúde tem que ser pública. O município tem condições de assumir todos os serviços e acabar com todas essas terceirizações que estão fazendo hoje.
Gazeta – O senhor fala, no seu plano, em tornar a Oktoberfest uma festa “de fato popular”. Isso significa mudar o modelo de gestão do evento?
Afonso – Nós vamos envolver entidades sem fins lucrativos, que têm condições de organizar essa festa sem custo nenhum, e não as organizações de empresários, que visam lucro. Hoje a festa não é popular. Um trabalhador desempregado tem como ir? Não tem.
Gazeta – O senhor é o único que defende o fim do livre horário do comércio. Isso passa na Câmara?
Afonso – Vamos botar os trabalhadores lá e não vamos permitir que votem na calada da noite. Se for preciso, o prefeito vai passar nos estabelecimentos para mobilizar os trabalhadores. Quero ver votarem contra a vontade dos comerciários. Hoje 97% dos comerciários são contra o livre horário do comércio. Essa lei não gera emprego, gera desemprego. E gera violência também: eu pergunto, onde ficam as crianças depois das 18 horas de domingo, quando as mães têm que ir trabalhar? Domingo é dia de família e de lazer. Não há necessidade de ter comércio funcionando aos domingos, de segunda a sábado é suficiente.
Gazeta – Como conciliar a expansão imobiliária com a preservação do Cinturão Verde?
Afonso – Fico feliz com essa pergunta, porque fui um dos primeiros que começou a criticar essas agressões ao Cinturão Verde. Fui muito perseguido por causa disso e hoje percebo que eu estava antecipando um problema grave. Com certeza, temos que mudar a legislação novamente. A lei hoje não atende à necessidade de preservar a natureza. Aliás, não sei se tu vais me perguntar sobre isso, mas não vamos mais ter asfalto na cidade. Vamos usar bloquetes. Senão a temperatura vai aumentar no Centro.
Gazeta – Atualmente a vice-prefeita está incumbida de uma área específica da administração municipal e, inclusive, comanda uma secretaria. Qual vai ser o papel do vice, Alexandre Haas, no seu governo?
Afonso – Em princípio, o papel dele será organizar os conselhos populares. Depois disso, ele não vai mais ter papel diariamente, só na ausência do prefeito. Aliás, é importante que se diga: nem eu nem ele vamos receber o salário que o prefeito e a vice recebem hoje. Vamos receber salário de operário. Não somos diferentes dos demais trabalhadores. Se nós ganharmos mais, vamos nos diferenciar dos demais, e não há motivo para isso.