Ao longo dos anos, inúmeros trabalhos ajudaram a contar, cada qual ao seu modo, aspectos relacionados à imigração e suas contribuições para as sociedades em suas épocas. O importante, alerta o pesquisador Jorge Luiz da Cunha, é compreender como se deu esse processo e quais os reflexos na compreensão dos fatos.
Para além dos objetos presentes nas famílias ou da história compartilhada de forma oral entre gerações – ainda que muitos descendentes de imigrantes guardem documentos que ajudam a corroborar os relatos –, é preciso entender o contexto político e econômico vinculado à comemoração e interpretação dos 200 anos da imigração estrangeira. Este processo, observa, começa com imigrantes de línguas germânicas, a produção e a publicação de relatos memoriais, diários de viagens, muitos deles de caráter intelectual ou científico (especialmente geográfico, econômico e político), e, principalmente, diários e cartas de imigrantes que foram estrategicamente utilizados como forma de propagar interesses e estimular os deslocamentos migratórios.
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Quanto aos relatos memoriais e diários de viagens, Jorge Cunha destaca o fato de se compreender que muitas obras e suas publicações foram financiadas pelo governo brasileiro, especialmente na segunda metade do século 19, ou até mesmo pelo governo alemão, depois da unificação do Reich em 1871 e da aplicação de sua primeira legislação sobre emigração, datada de 9 de junho de 1897.
Dentre os exemplos nesse sentido, ele cita o médico Avé-Lallemant (1859), que descreve uma viagem pelo Rio Grande do Sul realizada em 1858, expressando seu encantamento por meio da descrição idílica de diferentes paisagens, relacionadas com sua passagem pela colônia de Santa Cruz. No texto, o viajante conta como era a vida na nova terra e as perspectivas e oportunidades que poderiam existir em um local ainda em formação. “Aqui, as descrições das colônias de imigrantes alemães, ou das existências concretas dos colonos imigrantes, buscam estimular o desejo do novo, do não vivido, da construção possível de uma nova vida em um novo mundo. Eu entendo e me inspiro por essas memórias na importante significação de nosso tempo presente”, afirma.
Sob o viés histórico, ele salienta que a História é a ciência do presente, pois contribui para preservar o presente e executar o futuro no reconhecimento da importância da diversidade humana associando a sobrevivência, a permanência e a expansão da cultura dos imigrantes que haviam fundado e povoado colônias agrícolas no sul do Brasil, com a possibilidade de organizar uma força política com bases culturais nacionalistas em proveito dos interesses econômicos e políticos, mas principalmente dos sociais e culturais.
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Jorge Luiz da Cunha é professor titular da Universidade Federal de Santa Maria, atuando no Departamento de Fundamentos da Educação e nos Programas de Pós-Graduação em História, do Mestrado Profissional em Ensino de História e de Pós-Graduação em Educação. É doutor em História Medieval e Moderna Contemporânea pela Universität Hamburg (Alemanha), mestre em História pela Universidade Federal do Paraná e graduado em Estudos Sociais (História e Geografia e Educação Moral) pelas Faculdades Integradas de Santa Cruz do Sul (atual Unisc). Desenvolveu pesquisa de pós-doutorado junto à Unisinos no ano de 2019. É também membro do Comitê História, Região e Fronteira da Associação das Universidades do Grupo Montevidéu-AUGM. Desde dezembro de 2016, é presidente da Associação Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica (Biograph).
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Os primeiros imigrantes, ao desembarcarem nas terras brasileiras, mais precisamente no Rio Grande do Sul, encontraram uma realidade que jamais poderiam imaginar. Para seguirem em frente, receberam incentivo e ferramentas a fim de desenvolverem suas atividades profissionais, mas também para produzir o alimento necessário à manutenção de suas famílias.
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Conta-se que esses auxílios foram fundamentais. Da mesma forma, muitos dos imigrantes traziam conhecimentos adquiridos em sua terra natal, o que fomentou, desde cedo, a vocação empreendedora. Ferreiros, sapateiros, marceneiros e outros tantos começaram a trabalhar sob condições limitadíssimas para ganhar a vida. Houve ainda os que foram para a agricultura, tanto que até hoje existem milhares de famílias dedicadas ao cultivo de alimentos e, no caso do Vale do Rio Pardo, ao tabaco, que é fonte de renda para muitos descendentes de imigrantes.
E neste contexto, a imigração alemã, mas também a de outros povos, contribuiu, nas palavras do professor Jorge Luiz da Cunha, para moldar as atuais características do Rio Grande do Sul. “O que se esperava com as práticas políticas e administrativas, do governo imperial e do governo provincial, era que os colonos, uma vez estabelecidos, se voltassem para a produção de excedentes, que pudessem ser comercializados, possibilitando a formação de pecúlio, necessário para o pagamento da dívida colonial, ao mesmo tempo que abastecessem as cidades e povoações brasileiras no século 19 completamente dependentes de produtos estrangeiros importados”, explica.
E o desenvolvimento desta política de colonização do Rio Grande do Sul confirmou, mais tarde, segundo ele, o papel complementar da economia gaúcha no quadro nacional, organizado por São Paulo e Rio de Janeiro na forma de um modelo econômico primário-exportador. “Como se percebe, as colonizações estrangeiras e suas caracterizações históricas nos ajudam a entender a realidade do tempo presente em nosso Rio Grande do Sul”, salienta.
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Expediente
Edição: Dejair Machado (dejair@gazetadosul.com.br)
Textos: Dejair Machado, Marcio Souza, Marisa Lorenzoni e Romar Beling
Diagramação: Rodrigo Sperb
Confira o caderno na íntegra » Dia do Colono e Motorista: data para celebrar tradição, história e trabalho
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