Na manhã de 15 de maio de 2002, o País dava adeus ao ambientalista José Lutzenberger. Considerado um dos mais importantes protetores do meio ambiente, ele faleceu no dia anterior, aos 75 anos, vítima de um ataque cardíaco.
O velório, com a participação de líderes políticos e ecológicos, ocorreu no interior de Pantano Grande, na Fundação Gaia, criada por ele em 1987. Entre os que foram prestar suas homenagens estavam o ex-prefeito de Santa Cruz do Sul Edmar Hermany – acompanhado de sua esposa, a atual prefeita Helena – e o geólogo José Alberto Wenzel.
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Lutzenberger estava coberto apenas por um tecido de algodão e assim foi levado até uma floresta de eucaliptos, para ser enterrado em uma cova rasa. A cena impactou Wenzel. Na sua visão, trata-se de uma das últimas lições deixadas pelo ambientalista, que pediu um enterro modesto, sem cerimônia religiosa. “O seu sepultamento simboliza a volta para a terra, que o acolheu”, avaliou.
O ato foi encerrado por uma ventania, seguida de uma tempestade. Para o santa-cruzense, foi uma cena emblemática, um prenúncio de mudança na luta pelo meio ambiente. “Foi algo impressionante”, afirmou Wenzel.
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Passados 22 anos de sua morte, os santa-cruzenses relembram as visitas de Lutzenberger ao município. Entre 1995 e 1997, o ambientalista desenvolveu ações que repercutem até hoje na cidade, importantes na proteção ecológica.
A morte de Lutzenberger foi um momento de virada para José Wenzel, coordenador do Movimento pelo Cinturão Verde. Considera seus ensinamentos essenciais na luta pela preservação ecológica em Santa Cruz. “Fiquei muito impactado e senti, lá, algo que nunca mais me abandonou. Foi um chamado para dar continuidade ao legado dele”, diz Wenzel.
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Presente na ECO-92, ficou fascinado pelo modo carismático, polêmico, contundente e reflexivo do ambientalista. E 22 anos após sua morte, acredita que não há, na luta pelo meio ambiente, uma figura representativa como ele. “Seria muito importante termos um Lutzenberger hoje em dia. Temos excelentes profissionais na área, mais cultos do que ele, mas sem o seu carisma”, avalia.
Seu trabalho em Santa Cruz marca até hoje o secretário municipal de Obras e ex-prefeito Edmar Hermany. Recorda das conversas sobre o Cinturão Verde e os avisos que deixou caso não fosse dada a devida atenção ao espaço. “Há quase 30 anos, ele falava que se nós perdêssemos o pulmão de Santa Cruz, iriam acontecer grandes catástrofes. Eu acredito que, onde ele estiver, deve estar dizendo que tinha razão.”
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Menos de uma década antes de sua morte, Lutzenberger atuou em Santa Cruz, em 1995, nos últimos anos do governo de Edmar Hermany. “Foi um visionário”, enfatizou o atual secretário municipal de Obras. Hermany recorda que, na época, o Ministério Público fez ações relacionadas ao meio ambiente. “Não tínhamos estrutura para atender aos pedidos”, afirmou.
Decidiu então buscar auxílio de um ambientalista e lembrou que Lutzenberger estava próximo, na Fundação Gaia. Na época, ficou marcado por ter assumido, em 1990, a secretaria de Meio Ambiente do governo Fernando Collor. Foi demitido em abril de 1992, dois meses antes da ECO-92, sediada no Rio de Janeiro.
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Para Hermany, não havia dúvida de que era a pessoa certa para auxiliá-lo. Exerceu um cargo comissionado e passou a trabalhar na Prefeitura. O primeiro passo foi orientar as equipes da Secretaria de Meio Ambiente no manejo e na poda das árvores. A ação foi fundamental na preservação das tipuanas e plátanos espalhados pelo município. No entanto, segundo o político, o trabalho foi descontinuado ao final da sua gestão. “Uma pena, porque evitou a derrubada de muitas árvores.”
Assim que assumiu a função, manifestou preocupação quanto ao fornecimento de água no município. “Ele disse que, até 2025, Santa Cruz iria ter um problema sério”, recordou Hermany. Iniciou então um estudo sobre a bacia hidrográfica da Linha Sete de Setembro. Esse trabalho foi precursor do maior reservatório do município, o Lago Dourado, hoje Lago Prefeito Telmo Kirst. A obra foi idealizada em 1997 pelo empresário e ex-vice-prefeito Normélio Egídio Boettcher e realizada pelo então secretário estadual de Obras, Telmo Kirst, durante o governo Antônio Brito.
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Lutzenberger também contribuiu na recuperação da antiga pedreira, onde foi inaugurado, em novembro de 1996, o Parque da Cruz. Na época, sugeriu ao prefeito onde poderia colocar a imagem de Cristo e do padroeiro de Santa Cruz, João Batista. Outra contribuição foi na usina de lixo. Além de incentivar a separação dos resíduos, passou a reservar galhos, folhas e restos de cascas para a produção de húmus. O material foi utilizado pelos verdureiros nas plantações.
A atuação gerou bons frutos. “Consegui colocar em dia todos os problemas que eram possíveis de sanar na época”, reiterou o ex-prefeito.
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Para os santa-cruzenses, o município precisa olhar com atenção o trabalho de Lutzenberger, buscando um desenvolvimento urbano harmonioso com a natureza. “Temos que aprender a escutá-la para começar a compreendê-la. Porque a natureza fala, e está falando agora. Caso contrário, nós vamos continuar a repetir os mesmos erros”, concluiu Wenzel.
Natural de Porto Alegre, José Antônio Lutzenberger nasceu em 17 de dezembro de 1926. Formado em Agronomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), atuou por muito tempo em produtoras de adubos químicos, no Brasil e no exterior. Em 1971, abandonou o ofício e passou a se dedicar à luta pelo meio ambiente, envolvendo-se na fundação da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan). Por sua dedicação, foi agraciado com pelo menos 40 prêmios e homenagens, incluindo o prêmio Nobel Alternativo, em 1988.
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