Muita gente, como eu, nutre curiosidade por saber o que acontece depois da morte. Dúvida que atravessa gerações gera muitos conflitos, inspira religiões e as mais diversas teses. Dia destes refleti sobre o que escreveriam a meu respeito em um obituário. Publicados em jornais, servem de homenagem, por isso só destacam as qualidades de quem se foi.
Recentemente, deparei com um texto de Leandro Karnal (“Eu farei falta?”) que me fez pensar. Dizer que “sim” soa pretensioso. Afirmar que “não”, porém, seria sinal inequívoco de baixa autoestima. Independentemente da autoanálise, é um tema instigante, que serve de exercício mental e de autocrítica.
À exceção do pagamento dos boletos – que lembram todos os meses que alguém pensa em nós! –, não exerço nenhuma função de exclusiva competência. Ajudo no sustento da casa, na proteção da minha família e exerço a solidariedade humana. São atributos obrigatórios, mas que milhões de pessoas realizam em seu dia a dia. Em caso de falta, certamente haverá uma solução ao alcance da família enlutada.
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Diante desta inexorável realidade, viver dignamente para ajudar é uma das minhas inspirações no cotidiano. Para isso, não são dispensáveis gestos grandiloquentes de solidariedade para postar nas redes sociais. O dia a dia é palco para isso, sem holofotes. Perdi meu pai quando ele tinha 52 anos e minha mãe aos 83 anos. Foi uma catástrofe que achei que não iria superar. Mas segui adiante; havia compromissos, filhos, trabalho e resiliência a desafiar. O passamento dos meus pais forjou de forma ainda mais marcante os valores que tentaram legar a mim e a meus irmãos. São princípios que busco, de forma obsessiva, transmitir aos meus filhos.
Além dos preceitos de decência, ética, respeito e importância do trabalho, deixo um bom seguro de vida. Afinal, saudade não paga contas. Pode parecer desumano e pretensioso falar disso, mas quem não presenciou dramas de pós-morte de provedores que dizimaram famílias inteiras, impondo dor e miséria sem dó?
Aos 61 anos, balanços de vida são inevitáveis, inconscientes. O conceito de finitude está presente a cada despertar ao acordar saudável para enfrentar mais um dia de trabalho. Saúde, aliás, conceito cada vez mais valorizado diante de tantas tragédias próximas. À noite, refestelado em uma cama quentinha, agradeço o privilégio de chegar até aqui. Dou graças pela família, pelos amigos, pelo emprego, segurança, saúde e conforto. São conquistas que milhões almejam, mas pouquíssimos atingem, por diversos fatores.
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Depois de refletir sobre o tema que inspirou esta crônica (“Eu farei falta”), resolvi mudar. E pensar na falta que a vida fará. E isso tem sido combustível para seguir adiante. Com dignidade, respeito e gratidão.
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