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Fora de pauta

A culpa é nossa, sim

Foi em um livro do antropólogo Alberto Carlos Almeida que li, certa vez, esta definição: quando um brasileiro, andando na rua, tropeça em uma pedra e cai, imediatamente olha ao redor para decidir quem vai processar.

Nunca esqueci dessa forma exagerada de chamar a atenção para a nossa inegável tendência à terceirização de responsabilidades. De fato, se tem uma coisa na qual somos craques, é em encontrar culpados para os nossos problemas. É só sair a notícia ruim – seja a alta na gasolina, a queda no emprego ou a enxurrada – e todos já têm na ponta da língua os nomes, os sobrenomes e CPFs dos autores do crime.

Essa sanha, naturalmente, ganhou impulso com a pandemia. Aparentemente, não há quem não tenha uma convicção firme sobre o real causador da maior crise da nossa geração: do governador ditador ao presidente genocida – passando, é claro, pelo morcego chinês.

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E, se pensarmos bem, existem, realmente, erros por todos os lados. O governo central pecou ao negar a gravidade da tragédia, ao não instituir uma política coordenada de combate e, sobretudo, no atraso na busca por vacinas, o que está nos custando caro agora. Da parte dos estados e municípios, faltaram, em muitos momentos, critérios mais claros para orientar as restrições às atividades econômicas, bem como uma fiscalização mais efetiva e justa.

Mas identificar essas lacunas é fácil. Difícil, e raro, é nos colocarmos dentro delas. Se convivemos com o vírus há um ano e, de uma hora para outra, a transmissão alcançou níveis alarmantes, é porque alguma coisa mudou. E o que mudou, por óbvio, uma vez que o vírus avança por meio do contato físico, é a adesão da população ao distanciamento.

Logo, se a pandemia está fora de controle neste momento, é porque relaxamos demais. A culpa, veja só, é nossa também. Somos, sim, corresponsáveis pela tragédia que se agrava a cada dia – e que pode piorar se não compreendermos o nosso papel nessa história. Não dá para colocar tudo na conta das festas clandestinas e das junções nas praias: diversos indicadores apontam que a circulação nas ruas nos últimos meses vem sendo muito maior do que no ano passado. Precisamos, portanto, colocar a mão na consciência e avaliar o nosso comportamento.

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Por incrível que pareça, passado um ano e com um saldo alarmante de mortes, ainda há pessoas, e não são poucas, que resistem a cumprir os protocolos básicos, como usar máscara. Provavelmente, essas mesmas pessoas, se questionadas sobre a quem atribuem a calamidade, apontarão o dedo para algum gestor público ou, em alguns casos, se valerão de teorias conspiratórias. É o velho autoengano tupiniquim.

Atualmente, a grande discussão é se devemos partir ou não para um confinamento radical com vistas a derrubar de vez o nível de internações e óbitos. Seria um caminho lógico se o poder público suportasse uma retaguarda digna aos mais vulneráveis e aos empregadores, mas essa não é a realidade, o que torna tudo muito complexo. Mais do que isso, qualquer medida nesse sentido teria um efeito apenas proporcional à aderência dos cidadãos.

Não há decreto que funcione sem um mínimo de maturidade e boa vontade para aceitar a necessidade do recolhimento. Se dependermos de haver um guarda municipal em cada quadra para pegar adultos pelas orelhas e conduzi-los para dentro de suas casas, fica impossível esperar um cenário melhor para o curto ou médio prazo.

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Está claro que só a imunização em massa pode nos tirar em definitivo desse caos. O que nos cabe é não contribuir para que tudo piore antes de melhorar. E, até agora, estamos falhando.

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