Por Romeu Neumann
Jornalista
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Entre as muitas lições de vida que o genial Steve Jobs – inventor, empresário e magnata americano no setor de informática – nos deixou, está uma reflexão sobre o sentido da existência. Compreender por que certas coisas acontecem de uma forma e não de outra é um desafio constante à lógica que procuramos imprimir aos nossos atos. Ao falar de sua rica experiência de vida, deixou uma lição: “Não se consegue conectar os pontos que marcam nossa existência olhando para frente; somente se consegue juntá-los olhando para trás”.
Pois estava eu recolhido para um período sabático, após 40 anos de atuação na Gazeta, como repórter, editor, diretor de redação e de conteúdo, quando o Romar Beling, atual gestor de conteúdo multimídia das diversas plataformas da empresa, passou a me desafiar. Sem trégua. “Você tem histórias para contar, experiências para relatar, impressões para dividir com os leitores. Não deixe que isto se perca no tempo, que fique sem registro”, apelou. E ainda mais incisivo: “Você precisa conectar esta vivência ao momento que estamos vivendo hoje”.
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Nem parecia o Romar acanhado que vi chegar ainda menino na antiga redação. Foi numa manhã de 1988. O jornal estava em processo de preparação para alterar a periodicidade de sua circulação, pois passaria de trissemanário para diário nesse mesmo ano. Indicado por uma professora do curso de Letras da Unisc, apresentou-se um jovem magro, escondido atrás de sua indisfarçável timidez juvenil, vindo do interior de Agudo. Lembro que nem sequer consegui convencê-lo a se sentar. Ficou encostado junto à parede, de pé, visivelmente constrangido naquele ambiente que lhe era estranho, para não dizer assustador.
Pouco conversamos naquele dia. Mas foi o suficiente para perceber que ali estava uma boa alma. Um ser transparente, verdadeiro, com imenso potencial que, naturalmente, precisava ser lapidado. E foi, com a ajuda de vários colegas de redação da época. Ele continua magro como o conheci. Tímido, nem tanto. Quem o vê hoje dificilmente compreenderá a dimensão do conhecimento que acumulou e do nível profissional que alcançou. Mérito seu e dos incontáveis autores e livros que incorporou à sua existência.
Falo do Romar porque é dele a “culpa” por estar ocupando este espaço. Como poderia falar de tantos outros personagens (quem sabe venha a fazê-lo, futuramente!) igualmente indissociáveis na trajetória que construímos ao longo de quatro décadas.
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Sempre tive clara a percepção de que numa redação, assim como em qualquer repartição ou empreendimento, o que importa mesmo é aquilo que nos conecta, que nos faz dar o melhor de nós por uma causa comum. “Se o maestro não souber ouvir a orquestra, não será capaz de evocar seus melhores talentos artísticos, nem se quiser”, ensinou o regente e executivo Roger Nirenberg em Maestro, a experiência de liderar ouvindo.
Pode soar pretensioso, mas me autorizo a reconhecer um mérito: o de me cercar de pessoas competentes, talentosas, comprometidas com a excelência do seu trabalho. Em um ambiente desses, todos crescem porque um inspira e desafia o outro a buscar o seu mais alto nível de energia. Claro, não basta ter intuição, entrega, a melhor das intenções. Há que ter meios, suporte, estrutura, que, felizmente, a empresa proporcionou.
E aqui voltamos ao início deste modesto ensaio. Tudo se torna mais compreensível quando dirigimos o olhar para o passado e juntamos as peças do xadrez da vida. Quantas histórias se conectaram para, ao final, chegarmos ao ponto em que nos encontramos. Foi assim com os amigos que deixei na Gazeta e, certamente, assim terá sido nas vidas de tantos leitores e parceiros desta jornada. Gratidão a todos! Que venham os novos tempos! Obrigado, Romar, pelo desafio.
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